Esta é uma das quatro Ferrari 335 S Spider Scaglietti produzidas entre 1957 e 1958. Só isso seria suficiente para que ela valesse uma pequena fortuna, mas ela foi usada por Mike Hawthorn, Peter Collins, Wolfgang Von Trips e depois por Sir Stirling Moss. É por isso que ela foi arrematada em um leilão realizado na última sexta-feira (5) em Paris por nada menos que 32 milhões de euros — ou US$ 35,7 milhões e R$ 140 milhões.
Sim, parece muita grana — e de fato é —, mas ainda está longe de ser a Ferrari (e o carro) mais cara do mundo.
Você talvez tenha visto por aí que esta é a nova Ferrari mais cara da história, mas na verdade ela está a US$ 16,31 milhões dessa marca. A Ferrari mais cara do mundo (e também o carro mais caro do mundo) é uma 250 GTO 1963 usada por Stirling Moss, e foi vendida em 2013 por um colecionador espanhol a um comprador não identificado — e em transação particular — por nada menos que US$52 milhões. Há quem esteja dizendo também que esta Scaglietti é o carro mais caro já vendido em leilão, mas em 2014 alguém comprou uma Ferrari 250 1962 por US$ 38,1 milhões no Concours D’Elegance Pebble Beach. E ela nem foi usada por nenhum grande piloto, nem em uma competição famosa.
O único recorde que esta Ferrari 335 S Scaglietti bateu foi o de carro mais caro leiloado em euros. O valor exato pago por ela foi 32.075.200 euros, equivalente a US$ 36,2 milhões, ou R$ 148,23 milhões. Quem pagou? Segundo o canal CNBC, que ouviu fontes ligadas ao leilão, o comprador supostamente foi um investidor americano chamado Brian Ross, que atua no ramo imobiliário com sua Ross Developments. Na Europa, contudo, corre o boato de que o novo comprador da Ferrari seria ninguém menos que Lionel Messi.
Apesar do valor milionário, se você analisar friamente os fatos, essa Scaglietti tem potencial para valer ainda mais. Veja só: embora a 250 GTO seja bem mais famosa, foram feitos 39 exemplares do modelo e apenas quatro da 335 S Scaglietti. Sim, ela não tem a mesma aura das 250 GTO, mas também é uma Ferrari da era de ouro da Scuderia — e uma das mais raras delas — e equipada com um belo V12 de quatro litros e 395 cv a 7.400 rpm. Aliás, este motor foi o primeiro que o lendário projetista Vittorio Jano desenvolveu na Ferrari — ele ainda desenvolveria os primeiros V8 e o famoso V6 “Dino”, que inaugurou a era dos modelos de motor central-traseiro na Ferrari.
Depois, a 250 GTO de US$ 38,1 milhões não tem histórico nas pistas e nem foi usada ou pertenceu a um piloto famoso. Ela é uma das 250 GTO mais plebeias das 39. Esta 335 Scaglietti, por sua vez, estreou nas 12 Horas de Sebring de 1957 com Peter Collins, depois foi para a Mille Miglia com Wolfgang Von Trips, e encerrou seu ano nas 24 Horas de Le Mans daquele mesmo ano com Mike Hawthorn. Com esta Ferrari 335 S Scaglietti o britânico completou a primeira volta abaixo dos quatro minutos na história de La Sarthe. Segundo a Ferrari, o carro era capaz de chegar aos 300 km/h na Hunaudières (aquele retão que antecede a curva Mulsanne e é quase sempre confundido com ela). Depois, em 1958, o carro foi levado para o GP de Cuba (sim, isso existiu e vamos contar a história nos próximos dias), onde Stirling Moss a conduziu à vitória na segunda edição do evento.
Mille Miglia 1957
GP de Cuba de 1958
Na época, depois que os carros encerravam suas temporadas e eram substituídos por modelos mais novos, eles eram considerados obsoletos e normalmente eram vendidos a quem quisesse um carro obsoleto ou simplesmente desmanchados — e isso torna a sobrevivência desse exemplar ainda mais incrível.
Em 1960 o carro foi cedido a um arquiteto chamado Robert N. Dusek, que vivia nos EUA. Ele ficou com o carro até 1970, quando o vendeu a um colecionador francês chamado Pierre Bardinon, que formou uma coleção com 50 Ferraris de corrida. Bardinon enviou o carro a Modena, para uma restauração na carrozerie Fantuzzi, e desde então manteve o sua posse. Isso também ajuda a explicar o alto preço atingido: o carro ficou praticamente inacessível por mais de quatro décadas. Quem quisesse uma dessas precisaria esperar o carro aparecer à venda. Quando ele finalmente apareceu, o resultado foi esse: 32 milhões de euros.
Agora, do jeito que o mercado de clássicos está valorizando essas Ferrari das décadas de 1950 e 1960, não ficaríamos surpresos se em alguns anos esta mesma 335 S Spider Scaglietti se tornar o carro mais caro do mundo de verdade.