Por mais que a Fórmula 1 não tenha a mesma aura de antigamente, tendo se tornado uma categoria um tanto engessada, com “politicagem demais e emoção de menos” (repetindo um discurso que sempre se ouve quando o assunto é F1) e com carros feios movidos por motores que não têm a mesma personalidade dos V10 e V12 de outrora, a maior categoria do automobilismo ainda captura a imaginação de muita gente. E, no fundo, todo mundo já teve o sonho impossível de comprar um carro de Fórmula 1 e convertê-lo para rodar nas ruas.
Quer dizer, tecnicamente não é impossível – temos a impressão de que, com uma conta bancária gorda o bastante, em um país com leis de trânsito mais flexíveis, alguém conseguiria comprar um carro de Fórmula 1 aposentado e legalizá-lo como protótipo.
Existe, porém, uma alternativa. Ou vai existir, se tudo der certo para Zac Mihajlovic, um entusiasta australiano que está construindo uma “réplica” de Fórmula 1 com motor V12 Ferrari feita especificamente para ser um supercarro de rua exclusivo, caríssimo e muito, muito rápido.
Se você é fã deste tipo de projeto, talvez até já tenha visto outro carro feito por Zac Mihajlovic circulando pela Internet. Há alguns anos ele construiu uma réplica funcional e legalizada para as ruas do Batmóvel do filme Batman, de 1989, dirigido por Tim Burton. Com chassi feito sob medida, carroceria de alumínio e um motor V8 na dianteira, o Batmóvel de Michael foi feito com a ajuda de seu avô, um engenheiro automotivo aposentado. De acordo com ele é a única réplica fiel do carro do filme que pode rodar nas ruas.
Michael usa seu Batmóvel nas ruas da Austrália com certa frequência, e também costuma participar de ações beneficentes caracterizado como o Homem-Morcego. Com isto ele conseguiu certa notoriedade e começou a receber encomendas de pessoas interessadas em comprar um Batmóvel igual ao dele. No entanto, por questões de propriedade intelectual, ele não pode vender uma réplica do carro do Batman – a não ser que queira encarar um processo por parte da DC Comics.
Isto não o impediu, contudo, de idealizar outro projeto para colocar sua engenhosidade em prática: o tal carro de Fórmula 1 para as ruas, no qual Michael começou a trabalhar há cerca de dois anos e meio em parceria com Scotty Cox, que constrói motos chopper artesanais há 15 anos. Juntos, os dois estão construindo o que esperam ser apenas o primeiro exemplar do Zacaria (pronunciado “zacária”), o primeiro “Fórmula 1 para as ruas” do planeta.
A motivação é simples, segundo Michael contou ao site australiano Which Car:
Se você vai investir muito tempo e dinheiro em alguma coisa, essa coisa tem de ser verdadeiramente extrema… então eu construí o Batmóvel e recebi muitas encomendas de pessoas que queriam um. Não posso fazê-lo por causa do copyright, e eu não queria mesmo.
Então eu pensei: “qual é a outra coisa mais extrema que eu poderia construir para rodar nas ruas? Ninguém ainda fez um carro de Fórmula 1. Já fizeram coisas como o BAC Mono e o Ariel Atom, mas eles têm quatro-cilindros e parecem carros-conceito. Se você quisesse dirigir um carro de Fórmula 1 de verdade, precisaria de uma equipe de mecânicos particular só para mantê-lo em ordem. Então eu tive a ideia de usar um V8 ou V12 de uma Ferrari moderna, pois provavelmente há um mercado para pessoas que querem algo que ninguém mais tem.
A parte mais complicada, que seria encontrar um V12 Ferrari, foi resolvida quando uma Ferrari F12berlinetta acidentada apareceu à venda no Reino Unido. Com o motor importado da Europa para a Austrália, Michael e Scotty começaram a trabalhar na construção do carro.
Não se trata de uma réplica de um carro específico de Fórmula 1, e sim de um projeto original monoposto com estrutura tubular e carroceria de alumínio. O motor não é usado como componente estrutural, pelo que dá para ver nas fotos publicadas pela dupla no Instagram – em vez disso, um berço abriga o conjunto mecânico e a suspensão traseira por braços triangulares sobrepostos, enquanto na dianteira há um subchassi de metal para apoiar os componentes da suspensão dianteira.
Para definir o formato e as dimensões do Zacaria, Michael e Scotty usaram mockups de madeira compensada que serviram como guia para posicionar rodas, pneus, suspensão de demais componentes. Depois, usando as medidas como referência, foi projetada e construída a estrutura, que recebeu então os painéis de alumínio feitos sob medida.
De acordo com Michael, o carro pronto pesará cerca de 700 kg sem o motorista, mas já com todos os equipamentos necessários para ser street legal. Considerando que o motor V12 naturalmente aspirado de 6,3 litros da F12berlinetta entrega 740 cv, Michael acredita que a relação peso-potência ficará bem próxima de 1 kg/cv.
Ele acredita que ainda é cedo para falar em estimativas de desempenho, mas adianta que o carro usará uma caixa sequencial da Aisin de seis marchas (a mesma usada pelos Supercars australianos) com trocas por aletas atrás do volante ou uma alavanca sequencial. Vale a observação: o peso seco da Ferrari F12berlinetta é de 1.525 kg – mais que o dobro do peso previsto para o Zacaria – e o supercarro grand tourer é capaz de ir de zero a 100 km/h em 3,1 segundos, de ir de zero a 200 km/h em 8,5 segundos e de seguir acelerando até mais de 340 km/h.
Michael, sem falsa modéstia, diz que ele e Scotty “são muito bons no trabalho com alumínio”, mas não descarta a possibilidade de construir um Zacaria de fibra de carbono, como um verdadeiro F1, caso alguém deseje e esteja disposto a pagar o preço – o que resultaria em um carro ainda mais leve.
Falando em preço: Michael diz que muito provavelmente um Zacaria custará mais de 1 milhão de dólares australianos – o que dá quase R$ 3 milhões em conversão direta. O valor leva em consideração a exclusividade e o fato de Michael e Scotty serem os únicos que poderão realizar reparos e serviços de manutenção no carro. E por fim, segundo ele, o Zacaria está em um estágio mais avançado do que as fotos sugerem.
Estamos torcendo para que o projeto do primeiro “Fórmula 1 para as ruas” se concretize, e vamos acompanhar seu desenvolvimento.