No ano passado a Lotus anunciou um projeto extremamente ambicioso: seu primeiro carro elétrico. E não qualquer carro elétrico, mas um hipercarro de 2.000 cv com aerodinâmica extremamente complexa e a missão de trazer a Lotus – uma empresa famosa por respeitar a tradição, com todos os bônus e ônus que isso traz – para o século 21 de uma vez por todas.
Não será surpresa para ninguém se dissermos que achamos a ideia um tanto… ousada demais para a Lotus. É claro que hoje em dia a empresa tem o respaldo financeiro da gigante chinesa Geely, o que permite saltos de fé como esse sem tanta preocupação com um possível flop. Mas não conseguimos deixar de pensar que a jogada vai de encontro a tudo o que a Lotus construiu ao longo dos anos. Tudo o que a marca representa para os entusiatas: simplificar, adicionar leveza, esse tipo de coisa.
Ainda não é assinante do FlatOut? Considere fazê-lo: além de nos ajudar a manter o site e o nosso canal funcionando, você terá acesso a uma série de matérias exclusivas para assinantes – como conteúdos técnicos, histórias de carros e pilotos, avaliações e muito mais!
Para piorar, a Lotus anunciou meses depois que, além de colocar no mercado um hipercarro elétrico de 2.000 cv, também encerraria a produção de seus três pilares mais importantes – o clássico Elise, o Exige e o Evora. Teria sido o último prego no caixão, filosoficamente falando?
Contudo, para alívio – e surpresa – dos puristas, há apenas dois meses a Lotus anunciou que, antes de virar uma fabricante de carros elétricos, lançaria ainda em 2021 um novo modelo a combustão para substituir de uma vez só seu trio de esportivos peso-pena. Seu nome: Emira, inspirado na palavra arábica emira, que é um título equivalente a “princesa” no idioma português. Ou seja: a temática de dar aos Lotus nomes femininos e iniciados em E continua, ao menos em parte.
A Lotus foi surpreendentemente aberta quanto aos detalhes no anúncio – disse que o Emira seria seu último modelo novo a combustão interna, que duas opções de motor estariam disponíveis, e que todos nós, fãs de esportivos, ficaríamos muito satisfeitos com aquela que será “a última saudação” aos carros que queimam gasolina.
E a Lotus, ao que tudo indica, não mentiu. O Lotus Emira foi revelado hoje, há poucas horas, e tem imenso potencial para ser um carro excepcional.
Olhando para o Lotus Emira, vemos que a fabricante realmente se inspirou no Evija – a dianteira é praticamente idêntica, com faróis verticais delgados, bico limpo e três entradas de ar no para-choque. O perfil, contudo, é muito mais próximo dos antecessores, e não tenta reinventar a roda: é um esportivo de motor central-traseiro moderno típico, com lateral acinturada, vincos não muito marcados, a parte superior pintada de preto, área envidraçada razoavelmente grande e traseira alta, o que garante uma postura invocada mesmo nas fotos.
A traseira também é atraente – e, apesar de não ter as lanternas redondas, claramente foi pensada para evocar o Elise/Exige: repare no para-choque volumoso e na cavidade onde fica o letreiro “LOTUS”. As lanternas e si são peças interessantes, finas e com um desenho em “espiral”.
O estilo do interior conversa bem com o lado de fora – ou seja, da mesma forma que a carroceria, o habitáculo do Evora traz uma evolução visível em construção e acabamento (design, por sua vez, é algo subjetivo). Há duas telas coloridas, uma de 10,25 polegadas para o quadro de instrumentos e outra maior, de 12,3 polegadas, para o sistema de infotainment – que, como era de se esperar, traz integração com Apple CarPlay e Android Auto. Há um console central bem elevado, botões no volante, dois porta-copos e amenidades como sensor de chuva, cruise control, sensores de estacionamento, airbags de cortina, partida sem chave, rastreador por GPS e, opcionalmente, controle de largada. Muitos desses recursos são inéditos em um esportivo da Lotus.
De forma geral, o design do Emira é agradável, por dentro e por fora – não traz nada que se destaque de forma absurda, mas também é difícil encontrar defeitos. Dá para dizer que está aprovado?
Deixe para responder nos comentários – vamos falar mais do carro. A Lotus diz que o Emira é construído sobre uma nova plataforma, chamada Elemental. Embora esse tipo de coisa não costume ficar explícita, o consenso geral é que se trata de uma versão bastante modificada da plataforma utilizada pelo Evora, que por sua vez é baseado no Elise – ou seja, a construção em alumínio extrudado e colado permanece.
As dimensões do carro sustentam a ideia de que se trata de uma plataforma modificada do Evora – ele tem 4,41 metros de comprimento e 1,89 m de largura, sendo por volta de 2 cm mais longo e 1 cm mais largo que o modelo descontinuado recentemente. E o peso, para quem estava preocupado, não se afasta muito: com 1.405 kg, ele tem apenas 40 kg a mais que o Evora. Compreensível – e até parece pouco se levarmos em conta o nível de equipamentos.
A suspensão, sem surpresa, emprega braços triangulares sobrepostos nos quatro cantos, e terá dois setups para escolher – Touring e Sport. Os nomes entregam tudo: o primeiro será ligeiramente mais macio e complacente, voltado a quem vai usar o carro no mundo real. O segundo, mais firme e alguns centímetros mais próximo do chão, fará parte de um pacote para quem pretende ir para a pista.
O motor também é conhecido – em um primeiro momento, o Lotus Emira será vendido com o mesmo V6 Toyota de 3,5 litros (3.496 cm³) já visto no Evora, incluindo o supercharger. A surpresa vem com o segundo powertrain.
A Lotus já adianta que o V6 dificilmente poderá ser vendido por muito mais tempo, por conta dos novos limites de emissões que entrarão em vigor na Europa (o Euro 7, previsto para 2025). Então, os ingleses apelaram para o downsizing – e conseguiram uma parceria com a Mercedes-AMG, dona do quatro-cilindros turbo mais potente produzido no momento.
A pegadinha é a seguinte: a Lotus diz que o Emira terá dois níveis de potência – 360 cv na versão mais barata, e 400 cv na versão mais cara. Mas não disse qual motor terá qual potência. E é complicado tentar um palpite porque ambos os motores são plenamente capazes de passar dos 400 cv – então, as apostas variam dependendo de a quem você pergunta. Chris Harris aposta que o motor V6 terá 360 cv, e o quatro-cilindros AMG, por sua vez, ficará com 400 cv. A Evo, por outro lado, aposta na situação reversa.
O que é fato: sem tecnologia híbrida – algo que a Lotus garante que não vai oferecer no Emira – a versão com motor V6 já nasceu com os dias contados. Nos próximos anos, apenas o motor quatro-cilindros turbo deve permanecer, o que nos leva a crer que ele será o mais potente e, mais adiante, terá diferentes níveis de potência.
Mas não é só isso: a Lotus também faz mistério com o câmbio e diz que o Emira terá três transmissões disponíveis – manual de seis marchas, automático de seis marchas (tradicional, com conversor de torque) e DCT de oito marchas. Mas essa charada é mais fácil de resolver: considerando que o Evora já oferecia câmbio manual e automático de seis marchas, o mais provável é que o V6 continue com as duas opções – a caixa de dupla embreagem e oito marchas, por sua vez, deve repetir o que já faz nos modelos da AMG e ser a única opção do Evora quatro-cilindros.
O que fica claro, porém, é onde a Lotus mira com o Emira (desculpem por essa): no Porsche 718 e no Alpine A110 (já que o Alfa Romeo 4C subiu no telhado há meses). O preço deve ficar entre €70.000 e €80.000, bem no domínio de ambos.
A rapidez entre o anúncio do Emira e sua revelação na data de hoje é suficiente para perdoarmos as ambiguidades – que certamente serão esclarecidas nos próximos meses. Mas o que importa é que, caras, estamos em 2021 e um novo esportivo a combustão puro acabou de ser lançado – e, pelo cronograma da Lotus, o Emira terá dez anos para provar que merece o título de último carro à moda antiga feito pela fabricante.