Não há dúvida de que um dos segmentos automotivos mais legais, no mundo todo, é o dos hot hatches – esportivos para as massas, potentes o bastante para divertir os mais experientes; controláveis o bastante para quem ainda é iniciante; chamativos o bastante para quem quer, bem, chamar a atenção; e práticos o bastante para quem precisa de um carro de família. Basicamente, todo entusiasta quer um hot hatch, e é por isso que existem tantos.
O mais novo deles vem direto da Coréia do Sul, mas fez escala na Alemanha: o Hyundai i30 N teve boa parte do seu acerto dinâmico realizado em Nürburgring Nordschleife, onde a divisão N da Hyundai deu quase 500 voltas com o carro. Eles dizem que isto equivale a 90.000 km em vias públicas, com uma diferença importante: o carro foi levado ao limite durante mais de 90% do tempo.
Isto diz muito sobre o que a Hyundai pretende com o i30 N: abocanhar fãs dos hot hatches mais tradicionais, especialmente na Europa, onde costumam de fato levar o carro para a pista, mesmo antes de fazer qualquer upgrade. O pacote tem de ser bom logo de cara, e isto é ainda mais verdadeiro quando se trata de um nicho tão disputado e cheio de rivais já estabelecidos: VW Golf GTI e Golf R, Ford Focus RS, RenaultSport Mégane RS e Honda Civic Type R. São carros que seguem todos mais ou menos a mesma receita, com motor turbinado e tração dianteira ou integral, com potência que varia entre 230 cv e mais de 350 cv.
Para o combate, a Hyundai armou o i30 N com um pacote bastante convencional, alinhado com a concorrência: um motor 2.0 turbo que pode ter 250 cv ou 275 cv – o Performance Package adiciona 25 cv ao motor, que sempre entrega sua potência máxima às 6.000 rpm. Com ou sem o Performance Pack, o torque é de 35,9 mkgf entre 1.450 rpm e 4.500 rpm. Como comentamos no post de lançamento, o motor é o mesmo 2.0 já encontrado em outros modelos da Hyundai, porém com preparação específica para o hatch. O câmbio é, invariavelmente, manual de seis marchas, e que Deus abençoe.
Com o motor mais potente, a Hyundai diz que o i30 N leva 6,1 segundos para chegar aos 100 km/h, enquanto a versão menos potente leva 6,4 segundos. Nas duas, a velocidade máxima é limitada eletronicamente em 250 km/h. A fabricante acredita que a esmagadora maioria dos clientes optará pelo Performance Pack – no Reino Unido, por exemplo, espera-se algo em torno de 90%. Outros recursos úteis são os amortecedores ativos com três níveis e o diferencial dianteiro eletrônico, responsável por boa parte da personalidade do i30 N.
Logo de cara, talvez você fique meio ressabiado com a potência do Hyundai – 275 cv podem parecer pouco para um carro com um leque tão grande de adversários. Nesse caso, porém, potência bruta perde um pouco a importância. A máxima: “um bom conjunto é o que importa” nunca foi tão verdadeira aqui. Quer dizer, isto é uma máxima mesmo?
Enfim, no que depender do que a imprensa gringa anda falando do Hyundai i30 N, os coreanos conseguiram: eles fizeram um carro todo certinho, perfeito para causar uma boa impressão em quem está descrente e surpreender quem já esperava um bom hot hatch. Este é o tom geral de todas as avaliações que lemos, embora algumas tenham sido mais otimistas do que outras.
O que não surpreendeu a ninguém: a qualidade de construção, o espaço interno, a boa ergonomia e o posicionamento dos comandos – os coreanos estão mandando bem de forma geral, criando carros com design no mínimo interessante e atributos para encarar nomes melhor estabelecidos de igual para igual. Surpreendente foi eles terem aprendido a lição na hora de colocar pimenta na receita.
Elogios ao comportamento dinâmico do carro não faltam. O pessoal da Evo, por exemplo, diz que o carro é simplesmente “bom em tudo o que faz”, com uma agilidade que praticamente não demanda esforço para ser aproveitada e um equilíbrio exemplar na hora de contornar curvas com velocidade. O que eles dizem é o seguinte:
No modo N, que endurece os amortecedores até o limite e altera o ronco do escape, o mapeamento do ESP, o mapeamento do acelerador e até o mapeamento do diferencial eletrônico, o i30 é tão equilibrado e ao mesmo tempo tão afiado, que é capaz de percorrer qualquer trecho de estrada para onde você o levar e tirá-lo de letra. De verdade, ele é assim bem acertado, bem resolvido e preciso em suas respostas, e em tudo o que faz.
Especialmente no modo como ele esterça e reduz a velocidade para atacar as curvas, e depois se deita sobre elas por um segundo ou mais antes de pegar impulso novamente na saída. Também gostamos do fato de você ter que aprender como aproveitar ao máximo o diferencial eletrônico para conseguir extrair o máximo do carro em si. E para fazer isto, é preciso ter a confiança de montar no acelerador o mais cedo possível nas curvas – porque é quando você faz isto que o diferencial eletrônico realmente mostra serviço e, a não ser que você erre feio a velocidade na hora de entrar na curva, os pneus dianteiros agarram e você consegue carregar velocidades cada vez mais altas na saída.
O modo N é o mais agressivo, e existem outros três – Eco, Normal e Sport. O primeiro visa economia de combustível; o segundo, conforto para o dia-a-dia e o terceiro é, bem, não tão agressivo quanto o modo N. E ainda existe o N Custom, que permite que você escolha manualmente entre características de aceleração, suspensão e direção de todos os outros modos e monte seu modo personalizado.
O responsável pelo comportamento dinâmico da divisão N da Hyundai, Albert Biermann (que, antes de assumir o comando da divisão N da Hyundai, era chefe da divisão M da BMW), diz que o melhor a fazer é utilizar o modo N em Nürburgring (quase como se fosse coincidência), pois o comprometimento do conjunto com o desempenho neste modo é bastante extremo. Na verdade, os caras do Top Gear disseram que, no i30N, a primeira coisa que se percebe é um carro muito, muito duro, e disse que mesmo no modo Normal a rodagem pode ficar desconfortável em um piso mais acidentado. No entanto, tal característica não compromente a experiência, dada a proposta do carro.
Os amortecedores são impressionantes, mas precisam operar em uma janela muito pequena porque quase não há rolagem e movimentos por parte da carroceria. Nas curvas, o carro até levanta a roda traseira do lado de fora, por exemplo. Não dá para fazer isso com um Civic.
Se você se preocupou com possibilidade de isto afetar negativamente sua capacidade de cruzar estradas, fique sossegado. O isolamento da cabine é bom, e o i30 N consegue percorrer quilômetros e quilômetros de rodovia numa boa. No geral, achamos que o conforto da suspensão é melhor que o do Focus RS porque ele não sofre tanto com solavancos verticais – é tão duro quanto o Ford, mas também administra melhor esta dureza.
Por outro lado, este não é um carro feito para virar tempo na pista, e sim para oferecer uma boa experiência ao volante em qualquer situação. Para a Hyundai, mais importante que um recorde de Nürburgring (em um primeiro momento, a marca já declarou que sequer vai divulgar um tempo lá) é mostrar que sabe o que está fazendo e que pode ser levada a sério.
As palavras da Autocar colocando o Hyundai i30 N lado a lado com seu maior rival deixam isto bem claro.
Talvez o mais impressionante seja que o i30 N acertou no básico. Os bancos são baixos o bastante e têm apoio suiciente. Isto é um ponto muito positivo neste segmento. Os pedais são meio deslocados para o lado mas ainda bem espaçados para o punta-tacco (isto se você preferir não usar o excelente o sistema de sincronização de rotações nas reduções de marcha).
Junte a isto o funcionamento ágil e preciso da alvanca de câmbio e o curso curto da embreagem e você acaba jurando que a Hyundai faz este tipo de carro há gerações. O i30 N também passa a impressão de ser muito robusto, ainda que a qualidade dos materiais esteja um nível abaixo do que se encontra em um Golf GTI.
Ou seja, o carro não é perfeito, como nenhum é. Mas parece ter convencido quem já pôde dar umas esticadas nele. O que acaba nos deixando mais curiosos, embora a chance de o i30 N desembarcar no Brasil seja baixa. De antemão porém, já sabemos que os coreanos fizeram a lição de casa. Vamos ficar de olho e torcer para que as piadas fiquem no passado.