Para quem tem um supercarro à disposição, os sistemas eletrônicos são uma mão na roda. Desculpem, pilotos de Gran Turismo e Forza, mas é verdade: a não ser que você seja um piloto muito experiente e saiba exatamente o que está fazendo, desligar as assistências — especialmente o controle de estabilidade — em um carro de mais de 500 cv, entre-eixos curto e pneus de extrema performance (que dão menos aviso dos limites) pode ser uma besteira sem tamanho.
Ano após ano, a tecnologia empregada nos carros evolui para facilitar a vida ao volante. E os carros de alto desempenho não são exceção — graças aos assistentes eletrônicos, de 20 anos para cá, superesportivos deixaram de ser máquinas tão traiçoeiras. Por outro lado, a guerra pela performance e por tempos mais baixos em Nordschleife está deixando as coisas no fio da navalha. Pode-se dizer que hoje, mais do que nunca, há uma certa dependência eletrônica para que os superesportivos não se tornem assassinos.
O piloto deste Audi R8 acabou aprendendo isso da forma mais dura. O vídeo é de 2008, mas seis anos não mudam o fato de que as pessoas subestimam os carros — algo que não deve ser feito nunca, e ainda menos com um supercarro do nível do R8.
“Please don’t hit the wall, please don’t hit the waaaaall… GODDAMMIT!”
Pode ser a versão com motor V8 de 430 cv ou V10 de 525 cv: o Audi R8 é um carro tornado dócil pela eletrônica, mas naturalmente arisco — sua configuração de motor torcudo central-traseiro, entre-eixos relativamente curto e pneus enormes formam uma combinação perigosa em mãos erradas. Ou melhor: pés errados. Desligue todas as assistências e sua natureza emerge. Se você ceder à tentação de soltar o acelerador em uma situação inesperada, a transferência de peso — ocasionada pela redução brusca do torque, pela atuação do freio-motor e pela inércia — desestabiliza a trajetória do carro, e há boas chances de acontecer algo assim:
Sim, ele rodou um GT40 — algo ainda mais fácil de acontecer com um carro tão orgânico e sem assistência nenhuma.
Nosso amigo do R8 cometeu dois erros: primeiro, a trajetória na curva já estava errada. Segundo: ele entrou rápido demais. Ao perceber isso ele certamente aliviou o pé instintivamente, e aí aconteceu o que descrevemos acima — causando o mini-acesso de fúria atrás do volante do supercarro batido. Para piorar, a curva em questão, no Autódromo Internacional da Virgínia, nos EUA, apresentava uma depressão no ponto de tangência — a traseira já fica naturalmente mais leve.
Dá para evitar este tipo de contratempo — para começar, não desligue o ESP.
Não estamos falando de uma máquina de operar milagres. O princípio do ESP — Electronic Stability Program (ou ESC, Electronic Stability Control) é bem simples, e talvez você até conheça: um acelerômetro (geralmente posicionado próximo ao centro de gravidade do carro) e vários sensores espalhados pelo carro que monitoram a posição do volante, esterçamento das rodas, direção do carro e a velocidade de cada uma das rodas. Quando os dados coletados por essa turma mostram à ECU que há uma possível perda de controle do carro, o sistema atua nos freios de forma assimétrica, aplicando força de frenagem necessária em cada roda a fim de gerar torque onde necessário e evitar que o carro deslize ou rode. O sistema é tão rápido que consegue agir antes mesmo que o motorista/piloto perceba que há um risco.
No vídeo abaixo, Steve Sutcliffe, da Autocar, explica e demonstra de forma bem simples como o ESP funciona e faz diferença — até mesmo em uma reta, onde o piso irregular causa pequenas variações na direção do carro e o ESP corrige a trajetória, dando a impressão de que o volante está virando sozinho. Nada disso — são “só” os freios.
“Mas isto não acaba interferindo no desempenho?”. Não mais. O ESP oferece vários níveis de atuação (em superesportivos, geralmente há os modos Sport e Sport+) e neles, a interferência só aparece em situações extremas – geralmente quando está se perdendo tempo na pista. Se você tiver a oportunidade, experimente pilotar assim – você vai ver que estava correndo risco desnecessário ao desligar tudo. Mas claro, no modo default, o ESP tende a ser conservador, sempre induzindo ao sub-esterço e limitando bastante a saída de torque para as rodas – afinal, nem todo dono de esportivo é um Tiff Needell. Aliás, raramente o são.
“Mas então eu não posso desligar o controle de estabilidade nunca?” Não é bem assim. Como já dissemos, pilotos experientes conseguem dominar um carro sem assistência — como você acha que eles faziam antigamente? Mas, hoje em dia, é mais para fins de entretenimento visual, como fazem os caras do Top Gear ou o Chris Harris, naqueles powerslides de que a gente tanto gosta.
Fora isso, o ESP é seu amigo — na melhor das hipóteses ele pode te livrar de situações, no mínimo, constrangedoras. Na pior, de um belo prejuízo – ou de conhecer os seus ídolos do rock mais cedo.