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Maconha pode não contribuir com aumento no risco de acidentes, diz estudo

Se no Brasil o debate sobre a regulamentação da maconha para uso medicinal e recreativo ainda é grande, nos EUA as coisas são bem diferentes: boa parte dos estados já permite o uso medicinal da planta, e alguns deles até já descriminalizaram ou regulamentaram o cultivo e o uso recreativo. Isto traz à tona uma questão já existia, mas nunca foi tão analisada quanto agora: afinal, dirigir depois de fumar maconha aumenta o risco de acidentes?

A resposta óbvia é “sim”, pois entre os efeitos da maconha estão a alteração da percepção de espaço e atraso nos reflexos. Acontece que, de acordo com um estudo realizado pela NHTSA — National Highway Traffic Safety Association, é possível que o risco seja insignificante. Como assim?

Um estudo encomendado pela organização e publicado no início do mês traz evidências de que o aumento no risco de um motorista que consumiu maconha se envolver em um acidente são “mínimos” em comparação a um motorista totalmente sóbrio. O estudo foi realizado ao longo de 20 meses e um total de 10.858 motoristas foram analisados. A metodologia foi a seguinte: os motoristas que se envolviam em acidentes tinham os níveis de álcool e tetrahidrocanabinol (THC, o princípio ativo da maconha) comparados com o de motoristas que não sofreram incidente/acidente algum no trânsito, no mesmo dia e na mesma hora.

Quando analisados apenas os dados brutos, os pesquisadores chegaram a identificar um risco até 25% maior de envolvimento em acidentes com motoristas que haviam consumido a droga. Só que ao analisar os diversos fatores, os pesquisadores concluíram que isso aconteceu porque a maioria dos motoristas analisados era de homens jovens, na faixa dos 18-30 anos — a faixa etária que mais se envolve em acidentes de trânsito em geral. Quando outros fatores demográficos entraram na análise — como idade, gênero e etnia —, os cálculos mostraram que o aumento real no risco de acidentes após o uso de maconha era de 5%. E mais: esse risco caía para quase zero quando se analisava a influência do álcool nos acidentes — o que significa que a maioria dos acidentes é causada pelo álcool, e não pelo uso de maconha.

Levados em consideração idade, gênero e etnia, a NHTSA disse que “não houve aumento significativo no risco de envolvimento em acidentes” entre os motoristas que consumiram maconha, ou seja: a proporção de motoristas de 18 a 30 anos que se envolvem em acidentes após usar maconha é praticamente a mesma dos motoristas dessa faixa etária que não consumiram a droga.

Para efeito de comparação, os pesquisadores também analisaram as estatísticas dos que consumiram apenas álcool — e o prospecto é bem mais preocupante: os motoristas que apresentavam teor alcoólico no sangue (TAS) de até 0,08 (oito partes de álcool para cada 1.000 partes de sangue) corriam quatro vezes mais riscos se envolver em acidentes do que alguém sóbrio. Com TAS de 0.05, como defendido pela maioria dos órgãos anti-álcool americanos e pelo Conselho Nacional de Segurança nos Transportes, o risco caía pela metade (ainda assim, o dobro de alguém sóbrio) e, quando o TAS era de 0.12, as pessoas corriam oito vezes mais riscos de se envolver em acidentes.

Na verdade, um estudo publicado em 2009, quando 16 estados dos EUA permitiam o uso medicinal da erva, levou em conta as estatísticas do consumo de cannabis e cruzou com os dados sobre o número de acidentes e consumo de álcool — o uso de maconha levava a uma redução no consumo de álcool entre os adultos, o que reduziu em cerca de 9% o número de acidentes.

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Agora, se você é a favor da regulamentação da maconha, preste atenção antes de sair comemorando: ainda que estes sejam dados bastante representativos e encorajadores, a própria NHTSA admite que há alguns pontos importantes a observar. Primeiro: a presença e o nível de THC no sangue não correspondem exatamente ao nível de intoxicação no momento — a substância pode ser identificada em um exame de sangue por dias depois do consumo e dos efeitos sobre o sistema nervoso central. Os níveis de tolerância também variam bastante de pessoa para pessoa, o que dificulta a obtenção de dados precisos.

Além disso, a própria natureza dos acidentes pode alterar os dados — ao longo dos vinte meses do estudo foram analisados 2.682 acidentes, dos quais 15% tiveram fatalidades. Estes acidentes foram classificados como “leves”, em uma amostragem feita para imitar acidentes de trânsito mais comuns no dia a dia. Com uma amostra de acidentes mais graves e mais vítimas fatais, é possível que a relação entre o consumo de álcool, o consumo de maconha e o risco de sofrer uma colisão poderia variar para mais ou para menos.

Dito isto, o risco existe, mesmo que não seja representado por estatísticas: é evidente que dirigir sob a influência de qualquer substância psicoativa (além de ser proibido) representa maiores chances de se tomar uma decisão equivocada ou ser surpreendido ao volante — seja pelo senso de julgamento comprometido, pelas alterações na percepção de espaço, perda na capacidade de concentração ou prejuízo da coordenação motora. Dirigir sem estar completamente sóbrio e ciente de si é sempre uma ideia ruim.

Você pode ler o estudo completo (em inglês) e tirar suas próprias conclusões aqui.