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Lançamentos História

MGA + Miata = Frontline MGA

Sim, um Mazda Miata zero km é tudo que se pode esperar de um roadster, de um carro esporte de dois lugares conversível. Por décadas sonhamos com algo como o Mazda: além de leve, pequeno e baixo com tração traseira e comportamento esportivo, o Miata era muito mais. Um modelo 2025 é completamente confiável e vai durar para sempre, mesmo se você for relaxado em manutenção. E além de esportivo em espírito, anda pacas: a Car and Driver americana conseguiu 5,5 segundos no 0-96 km/h, tempo melhor do que um Lamborghini Miura V12, lá atrás quando os roadsters ingleses que inspiraram o Miata eram populares.

Mazda Miata: milagre moderno

Sim, no Miata temos tudo que sonhávamos até os anos 1980, em um só carro. Funciona perfeitamente como qualquer carro moderno, seguro, quase a prova de morte em acidentes, econômico, sempre liso de motor mesmo frio, com ar-condicionado e som que espelha celular. Uma maravilha do mundo moderno.

MG MGA!

Ainda assim, por mais estranho que possa parecer, depois de receber tudo que pedimos, descobrimos que não era bem isso que queríamos. Não entenda mal: todos gostamos do carrinho, e agradecemos a existência dele. Mas o amor de verdade, aquele que nos faz acordado de noite e se dormimos nos acorda com a vontade ainda presente de sentir os cheiros e experiências táteis da direção, ainda parece menor do que era num Roadster inglês da fase áurea. Que, tecnicamente, é muito inferior.

É incrível, mas inegável. Veja um MGA por exemplo: um arcaico fugitivo de um shed inglês, é hoje lerdo como uma lesma reumática, tem chassi separado e molas “de carroça” localizando seu eixo rígido traseiro. O sistema elétrico é obra de sua maleficência suprema, Lucas, the Prince of Darkness, o inventor e maior entusiasta do curto-circuito. Esqueça de apertar parafusos todo dia, e a chance de ficar no meio do caminho, parado, aumenta exponencialmente. É largamente mantido inteiro pelo esforço diário de seu dono.

Mas ainda assim… Há uma beleza profunda em toda experiência de ter e dirigir um MGA que é inigualável e única, e que se não tem em toda a excelência de um Miata. Talvez seja o desenho do painel e dos bancos, como a direção fina e grande e a alavanca de câmbio reagem á nossa vontade nos mostrando exatamente o que estamos comandando, sem filtros. Talvez seja o fato de que vestimos o carro como uma calça jeans velha, não um escafandro pesado. E por estarmos metade do corpo fora do carro, sentirmos tudo que acontece lá fora, ao mesmo tempo que passamos por esse mundo lá fora rápido demais. Pelo menos, parece rápido demais; se medirmos a velocidade certamente não será.

Pudim. Roubando algo que não devia, claro.

É engraçado notar que são essas imperfeições que fazem o carro menos máquina, e mais algo vivo na nossa percepção. Me lembra o Pudim, um dos vira-latas de casa: feio, atrapalhado, ladrão de comida e lixo, sempre se machucando sabe-se lá fazendo o quê. Dá um trabalho danado, o Pudim, mas a gente o adora. Será que é por ser este ser intenso, que gostamos tanto dele? Dedicação e cuidado é de onde nasce o amor de verdade?

Lembrando Cecil Kimber, à bordo de um MGB GT

Eu tenho uma teoria sobre o que difere o Miata de um MGA. Sobre o que é o tal je ne se quai que a gente que gosta de automóvel sente num, e parece ausente no outro. Eu acredito que é a alma humana; impressa no corpo de metal do MGA por Cecil Kimber e Syd Enever e tantos outros, e ausentes na clínica perfeição asséptica do Miata, por mais que tenha ele criadores humanos também. Os MG eram criações tão pessoais que não conseguem evitar de refletir o âmago de seus criadores. É expressão de suas almas. É arte, ao invés de indústria.

Não, o que perdemos com os carros antigos era genial, e por não percebermos isso na época, perdemos isso para sempre. Não tem volta, e nos resta apenas agradecer que ainda temos o Miata, e seguir adiante. Não é assim que dá para somar tudo de bom do MGA, e tudo de bom do Miata, né?

Pera aí. Hold my beer.

 

O MG MGA

No ano de nosso senhor de 1952, a famosa empresa MG, em Abdington, duas horas de carro a oeste de Londres, e perto de Oxford, era estabelecidíssima como o maior provedor de carros esporte abertos de dois lugares baratos, os famosos roadster ingleses. Baseando seus carros esporte em carros da Morris, conseguiam fazer eles baratos; eram roadsters tradicionais com desenho pré-guerra, faróis e paralamas separados da carroceria. A empresa teve incrível sucesso de exportação com o seu TC de 1945, e em 1950 aparecia mais uma nova geração, o TD.

MGA coupé

A empresa já não contava mais com seu fundador, Cecil Kimber, já falecido tragicamente, e era parte do conglomerado Nuffield, assim chamado por causa de seu dono, William Morris, 1º Visconde Nuffield. Dono das marcas Morris, Austin, Wolseley, Riley e MG, a marca de carros esporte do grupo era indubitavelmente a Morris Garages.

Mas naquele ano de 1952, Leonard Lord vê o Healey 100 no London Motor Show e fica imediatamente apaixonado pelo carrinho, com uma carroceria moderna sem paralamas separados. O resultado é o Austin-Healey 100, um rival direto para os MG. O resultado é que de um dia para o outro, o MG era um carro ultrapassado. Um modelo modernizado, mas ainda tradicional de paralama separado, aparece em 1953: o MG TF. É também um fracasso.

Como resultado, Syd Enever é autorizado a criar um carro “aerodinâmico” para produção; desde 1950 ele estudava isso e tentava empurrar o conceito para produção, mas sem sucesso. O novo carro tinha ainda chassi separado, mas afastando as longarinas para as laterais, seria mais baixo e muito mais aerodinâmico que seus antecessores.

Por ser tão diferente dos modelos MG mais antigos, foi chamado de MGA, o “primeiro de uma nova linha”, para citar a propaganda da época. Em vez da unidade XPAG originalmente pretendida, o carro foi equipado com o novo motor de quatro cilindros em linha “BMC série B”, de origem Austin, do sedã MG Magnette, acoplado a uma caixa de câmbio de quatro marchas.

A suspensão era independente com molas helicoidais e braços triangulares na dianteira e um eixo rígido com molas semi-elípticas na traseira. A direção era por pinhão e cremalheira. O carro estava disponível com rodas raiadas ou com discos de aço, e versões cupê e roadster existiriam.

O primeiro MGA de 1955 tinha motor OHV de 1489 cm³, equipado com dois carburadores SU tipo H4, inicialmente com 68 cv, mas logo melhorado para 72 cv. Os freios eram a tambor hidráulicos Lockheed. Pesava 900 kg, e fazia o 0-96 km/h em 16 segundos cravados, mas como era mais aerodinâmico, era muito mais veloz que os T: chegava a 160 km/h.

Em 1958, aparece o mais exótico de todos os MG clássicos: o Twin-Cam. Como dizia o nome, recebia uma versão DOHC do motor B-series, com o cabeçote visualmente parecido com os Alfa Romeo contemporâneos.

MGA Twin-Cam

Com taxa alta de 9,9:1, o motor dava 109 cv e era bem mais veloz: 9 segundos no 0-100 km/h, e máxima acima dos 180 km/h. Outra grande vantagem eram os freios: novos discos Dunlop nas quatro rodas, juntamente com rodas de aço Dunlop.

O motor sofreu por ser colocado a venda sem validação suficiente.  Vários problemas de garantia ocorreram durante o curso da produção, e as vendas caíram rapidamente. O motor sofria com detonação e consumo excessivo de óleo. A maioria dos problemas foram corrigidos na uma versão de baixa compressão de 101 cv de 1959 mas, a essa altura, era tarde.[6] O Twin-Cam foi descontinuado em 1960.

Em maio de 1959, os MGA normais com motor OHV também receberam um motor atualizado, agora com 1.588 cm³, produzindo 81 cv. Freios a disco foram instalados na dianteira, mas os freios a tambor permaneceram na traseira.

O MGA foi um grande sucesso apesar do fiasco do Twin-Cam; abriu caminho para sobrevivência da MG, e o aparecimento do popular MGB monobloco, em 1962. É um clássico ainda hoje amado pelos fãs da marca.

 

MGA + Miata = Frontline!

Lembram o que falei sobre criações pessoais? Bem, os carros da Fronline Developments inglesa, que conhecemos aqui no FlatOut já por causa de seus incríveis restomods de MGB GT, são exatamente isso: criações de um entusiasta, de uma pessoa.

Frontline LE60: o MGB GT V8 de 2024

Muito tempo atrás, o fundador da empresa, Tim Fenna, então apenas um piloto amador de fim-de-semana, quebrou cinco caixas de câmbio MG Midget durante um ano e meio de competições de subida de montanha. Ele começou a se perguntar se não havia um problema mais fundamental em jogo do que sua falta de habilidade nas trocas. Como experiência, ele colocou uma caixa de câmbio da Toyota em seu carro. O resultado foi uma temporada inteira sem quebra. E a gênese de um negócio que hoje prospera.

Hoje, a Frontline faz de tudo, desde a manutenção de MGs originais até restauros e reconstruções completas. Eles encontram uma nova carroceria, ajustam um motor novo, fazem à mão um teto que não vaza e garantem que seu carro antigo se dê bem com seu novo iPhone. A empresa também se aventurou a criar modelos independentes, com resultados esplêndidos. Este é mais um deles: uma cruza de MGA com Mazda Miata.

Apesar de tecnicamente um MGA ainda, dele praticamente só sobra o número de chassi. Quase tudo o que você está vendo é novinho em folha. A carroceria recém-fabricada pesa impressionantes 85 kg a menos que a original.

O carro mantém muito do original além do estilo e desenho de carroceia: também o chassi é no desenho original. Mas é reforçado e novo, e tem modificações cruciais. A suspensão traseira continua por eixo rígido, mas agora tem molas helicoidais, amortecedores modernos de primeira linha (ajustáveis de Nitron) e 5 links para controlar seu movimento completamente. Na dianteira, o desenho é o mesmo, mas molas, amortecedores, e ajuste, modernos. A direção tem assistência elétrica, e os freios a disco nas quatro rodas são também modernos: ventilados de 273 mm com pinças de 4 pistões na frente, sólidos com pinças de 2 pistões e 265 mm atrás. Atrás há diferencial autoblocante Quaife com eixos e rolamentos reforçados.

Mas você não notaria no cockpit, que apesar de usar materiais modernos e caros para ficar mais chique e legal, é como era em 1958. Até o freio de mão fly-off perto da soleira permanece. Até as rodas parecem as antigas Dunlop, mas são modernas de liga leve 15×6″ ou rodas de aço inoxidável de 72 raios.

Mecanicamente é que avançamos décadas aqui: este é também um Twin-Cam: uma unidade de 2 litros de um Miata, preparado para 225 cv a 7750 rpm. Com o motor, vem também a deliciosa unidade de câmbio manual de 5 marchas do Mazda. Como o carro pesa apenas 815 kg, estamos falando de coisa séria aqui em desempenho: 0-100 km/h em 4,8 segundos. Se você achou pouco, pode optar por um Duratec Ford preparado, com 2,4 litros e 290 cv.

Um carro com tudo que há de bom no antigo MGA, mas moderno e confiável como um Miata moderno. Quem disse que não se pode ter tudo? Pode sim, basta ter dinheiro. Um MGA desses sairá por pelo menos £ 140.000, ou algo em torno de um milhão de reais, na Inglaterra. Você tem que fornecer ainda um MGA-base, mas ele pode ser um escombro; de novo, o número de chassi no seu nome é o que importa.

Dinheiro pode não comprar felicidade; mas definitivamente, pode comprar arte.