Se você estava pensando mesmo em comprar aquele carro de rali histórico usado por um piloto lendário, 2018 pode ser o seu ano. Depois do Subaru Legacy 555 usado por Colin McRae (e também por Ari Vatanen e Richard Burns), agora é a vez do Ford Focus conduzido pelo célebre autor da frase “if in doubt, flat out“!
O ano da Ford no WRC foi 1979, quando o piloto sueco Björn Waldegård conduziu o Ford Escort RS1800. Ele foi o campeão entre os pilotos, e a Ford ficou com o título entre as fabricantes. Naquela época os carros de rali ainda tinham tração traseira e, no caso do Escort, o motor era um quatro-cilindros de dois litros com comando duplo no cabeçote e injeção mecânica Kugelfischer, capaz de entregar até 280 cv sem qualquer tipo de indução forçada – all motor, como dizem no Reino Unido.
No ano seguinte, com o anúncio do Grupo B de rali, a Ford decidiu concentrar seus esforços no desenvolvimento de seu protótipo – o Escort RS1700T, que deu origem ao RS200 – e deixou seu time nas mãos de equipes independentes, como a David Sutton Cars, até 1985. O RS200 estreou em 1986, o último ano do Grupo B, e foi substituído pelo Sierra RS Cosworth. Este competiu até 1992, quando deu lugar ao icônico Escort RS Cosworth. E o substituto do Escort nos ralis foi o Ford Focus, assim como aconteceu nas ruas.
Foi em 1999, mesmo ano em que o escocês Colin McRae, recém-saído da Subaru, fazia sua estreia pela equipe britânica. A Ford estava apostando forte em seu novo carro e no talento de McRae, que fora o campeão de 1995 ao volante do Subaru Impreza WRC, e pagou £ 6 milhões por um contrato de dois anos com o piloto – uma das transações mais caras da história do campeonato.
Colin McRae e Nicky Grist na apresentação do Ford Focus RS WRC em 1999
Além de 10% mais rígido que seu antecessor, o Ford Focus trazia uma nova suspensão traseira do tipo McPherson, como praticamente todos os carros, com braços inferiores e barra estabilizadora ajustável. O arranjo era superior aos braços semi-arrastados do Escort RS Cosworth.
O motor também era novo: o quatro-cilindros Zetec E, com bloco de ferro fundido e cabeçote de alumínio com duplo comando de válvulas. Na versão de rua, o motor de dois litros entregava cerca de 130 cv. Já o motor de rali, equipado com um turbocompressor Garrett (o Escort usava uma turbina da IHI), intercooler e radiador de óleo, dispunha de 300 cv a 6.500 rpm e 56,1 mkgf de torque a 4.000 rpm. Era acoplado a uma caixa manual de seis marchas da XTrac, equipada com sistema de trocas sequenciais, levando a força para as quatro rodas. O coordenador do projeto foi Günther Steiner (que, apesar do nome alemão, é italiano), que já havia trabalhado com a equipe de rali da Subaru e, antes disso, havia chefiado o desenvolvimento do Lancia Delta HF Integrale.
Com a famosa pintura branca, vermelha e azul da Martini Racing, o Focus RS WRC estreou no Rali Monte Carlo em janeiro de 1999. Seu primeiro pódio veio já na etapa seguinte, o Rali da Suécia, com Thomas Rådström – o segundo piloto da Ford – conquistando o terceiro lugar em casa. Na terceira prova da temporada, o Safari Rally, Colin McRae conseguiu a primeira vitória do Focus RS no WRC. E logo depois, no Rali de Portugal, McRae venceu de novo.
Duas vitórias e um pódio no primeiro ano eram um bom sinal. E, de fato, o Focus sempre conseguiu resultados expressivos no Campeonato Mundial de Rali. Na verdade, seus números são invejáveis: dos 173 eventos do WRC que disputou entre 1999 e 2010, o Focus venceu 44 e colecionou 142 pódios. Sua carreira culminou em 2006 e 2007, quando os pilotos finlandeses Marcus Grönholm e Mikko Hirvonen ajudaram a Ford a conquistar dois títulos consecutivos no campeonato de construtores com o Focus RS de segunda geração.
Mas, voltando ao exemplar que nos levou a contar toda esta história: trata-se do carro de chassi #68335, com o qual Colin McRae disputou o Rali da Catalunha, na Espanha, em 1999, ao lado do navegador Nicky Grist. A dupla precisou abandonar a prova por conta de um acidente, mas o Focus foi consertado a tempo de competir na etapa seguinte, o Tour de Corse, na França, e chegar em quarto lugar com McRae e Grist.
Os dois ainda correram com o Focus em outros dois eventos: o Rali da Acrópole, na Grécia; e o Rali da China, na… China. Então, quem assumiu o volante do Focus RS #68335 foi Petter Solberg, que correu em mais seis etapas do WRC antes que o carro fosse aposentado. Depois disso, o Focus foi vendido a uma equipe independente e utilizado em eventos de rali regionais pela Europa até 2007, quando foi comprado por seu atual dono.
Assim como o Legacy 555 que apareceu aqui, o Ford Focus RS ex-Colin McRae será leiloado pela Silverstone Auctions no próximo dia 23 de Fevereiro, na edição 2018 do evento Race Retro, no Reino Unido. A agência de leilões estima o valor de arremate entre £ 120.000 e £ 140.000 – ou seja, algo entre R$ 537.000 e R$ 626.000 em valores aproximados, sem contar impostos.