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Pensatas

O Nissan GT-R será um clássico no futuro?

Como nascem as estrelas? Não aqueles distantes sóis que aparecem sempre que o nosso Sol desaparece. As estrelas do cinema, da música, dos esportes, das artes em geral. Qual o momento em que elas deixam de ser mais um para se tornar algo especial? Os Beatles, por exemplo, nasceram de verdade no dia 9 de fevereiro de 1964, quando se apresentaram ao vivo no programa de TV de Ed Sullivan nos EUA.

A apresentação foi assistida por mais de 73 milhões de pessoas só nos EUA, uma das maiores audiências já registradas até então. Foi quando nasceu a Beatlemania, que influenciou toda uma geração e deu origem a dezenas de outras bandas e inspirou artistas que se tornariam famosos dali a 10, 15, 20 anos.

No caso do rei Pelé, foi a final da copa de 1958, aos 10 minutos do segundo tempo. Um menino de 17 anos, dominou a bola dentro da área como se fosse um profissional experiente, tirou a jogada do zagueiro sueco (que lhe dava uma solada no quadril), calmamente esperou a bola cair à altura certa e bateu para dentro do gol com precisão e tranquilidade. Meia hora depois, o garoto foi ao segundo andar cabecear a bola para dentro do gol e encerrar a partida. Nem ele entendeu o que estava fazendo; quando se deu conta começou a chorar por ter ganhado a copa que prometera ao seu pai.

Os Beatles e Pelé têm algo em comum também na forma com a qual saíram de cena. Estrelas morrem de duas formas: elas perdem energia e vão lentamente desvanecendo até se apagar, ou explodem em seu auge, causando uma enorme liberação de energia e desaparecem rapidamente.

Os Beatles terminaram em seu auge, quando todos esperavam mais discos e novas músicas. Pelé, se aposentou no auge, logo após ganhar uma copa e fazer seu milésimo gol. Ninguém viu a decadência dos Beatles ou de Pelé porque isso nunca aconteceu. Os Beatles não tiveram um fracasso de vendas ou crítica depois do auge. Pelé não teve uma “má-fase” enquanto foi profissional. Eles encantaram o mundo, estabeleceram um novo patamar e saíram de cena, entregando o palco para o próximo.

O que isso tem a ver com carros? Bem, você já leu o título, sabe que eu quero falar sobre o Nissan GT-R. Já percebeu a comparação, certo? Outro dia me perguntaram se o Nissan GT-R, o atual, R35, não-derivado do Skyline, será um futuro clássico. Meu impulso foi dizer que sim, ele será. Afinal, ele fez o que fez — e ainda faz o que faz. Mas em um segundo pensamento me perguntei se ele não ficou tempo demais por aí fazendo mais do mesmo.

Veja, usando a analogia dos Beatles e Pelé, o Nissan GT-R original, derivado do Skyline, nasceu timidamente nos anos 1960, cresceu e logo desapareceu. Ninguém ligava para ele na época. Era um carro japonês em um tempo no qual os japoneses ainda eram o povo que explodiu Pearl Harbor e se aliou à Alemanha nazista e à Itália fascista. Isso começou a mudar nos anos 1970, quando o Skyline GT-R já havia saído de cena.

Quando ele voltou, em 1989, chegou arrebentando tudo e todos. Logo de cara foi o carro mais rápido em Nürburgring Nordschleife com a pista úmida. Nascia uma estrela. Um cupê derivado de um sedã de passeio, em uma versão radical, de repente, era um “supercar killer”. O carro venceu Bathurst e se tornou um ícone dos entusiastas. Mesmo na realidade distante das distâncias pré-internet, os entusiastas sabiam que lá no Japão existia um carro chamado Skyline GT-R que era capaz de fazer essas coisas.

Como os Beatles fazendo Rubber Soul, Revolver e Sgt. Peppers, como Pelé vencendo a Copa de 58, 62 e 70, cada nova geração do Skyline GT-R apresentava ao mundo um novo patamar de desempenho. Qual foi o primeiro carro a quebrar a barreira dos 8 minutos em Nürburgring? O próprio GT-R R33, que foi superado pelo R34 em 1999. Se havia um esportivo japonês a ser batido nas ruas e nas pistas, aquele era o Skyline GT-R.

Até 2002, quando a Nissan encerrou sua produção sem deixar um sucessor. Em 2003, não havia mais Skyline GT-R, mas já havia um culto ao carro. Brian O’Conner tinha um Skyline em “+Velozes + Furiosos”, os games de corrida premiavam os jogadores com versões de alto desempenho imbatíveis do Skyline GT-R. O carro se foi, mas seu legado permaneceu — e continua até hoje.

Cinco anos depois a Nissan decidiu reviver a sigla. Uma manobra arriscada, pois você está mexendo com algo sagrado para os fãs. E se o carro for um fiasco? Se ele não mudar as regras do jogo como os outros fizeram? É como anunciar o messias e, na hora do milagre, apresentar um truque de cartas. Mas o GT-R veio em 2007 e mudou as regras do jogo de novo.

A revista Top Gear, ligada ao famoso programa, disse que o Nissan GT-R era “a maior barganha de desempenho deste século ou de qualquer outro, e um dos carros mais incríveis já feitos. Pelo preço de um BMW se tem um supercarro de 310 km/h com tração integral, tecnologia de ponta, capacidade tremenda em qualquer tipo de estrada e um visual impossivelmente descolado — e um porta-malas.”

Carlos Ghosn apresenta o novo GT-R em 2007

Os americanos do site Edmunds, disseram que “por menos grana que um 911 básico, você tem um legítimo supercarro”, que era “capaz de acelerar mais rapidamente que qualquer Ferrari ou Lamborghini”. Chris Harris, então na revista Autocar, disse que o GT-R era “o supercarro com o melhor custo/benefício do planeta” e Jeremy Clarkson, do Top Gear, disse que o “GT-R faz curvas mais rápido que a eletricidade” e que “nenhum carro é tão rápido nos primeiros 30 metros”, enquanto James May, também do Top Gear, disse que “nunca arrancou tão rápido em um carro”.

Não era exagero: o carro custava menos que um Porsche 911 mesmo — e era mais rápido que o mais caro dos 911, afinal, ele quebrou o recorde da Porsche em Nürburgring. E realmente nenhum outro carro acelerava tão rápido quanto ele — afinal, a própria Guinness World Records certificou isso. Não foi à toa que, em seus três primeiros anos de mercado, o GT-R ganhou todos os prêmios de “melhor esportivo” ou “carro do ano”. Ele realmente mudou a história do automóvel.

E ele não parou por ali. Com atualizações quase que anuais, em 2012 ele se tornou o terceiro carro mais rápido em Nürburgring, com 7:19, atrás apenas do Lexus LF-A (7:14,64) e do Dodge Viper ACR (7:12,13). Depois, em 2013 os hipercarros inauguraram uma novo patamar de desempenho em Nürburgring, quebrando a barreira dos 7 minutos e baixando cada vez mais o tempo de volta, a ponto de completarem o giro em 6:30,705. Mas isso é outra história. Nenhum deles custava tão pouco quanto o GT-R, contudo. Mesmo na versão Nismo, que chegou aos 7:08 no circuito.

Mas… o tempo passou. O mundo mudou. A tecnologia avançou. Um novo GT-R nunca chegou. Em vez disso, aquele GT-R de 2013 continuou evoluindo, e sendo refinado e mudando e encarecendo. De repente ele foi superado e hoje é quase obsoleto, se pensarmos que ele não tem aerodinâmica ativa nem um powertrain híbrido. Ele se tornou um supercarro convencional, como qualquer outro. Em tempos de Corvette de motor central, capaz de entregar desempenho de supercarro pelo preço de um BMW M3, o Nissan GT-R é apenas uma sombra do seu passado. Uma estrela lentamente desvanecendo até que, um dia, deixará de brilhar.

Hoje o desempenho é fácil. Temos hot hatches de 400 cv. Compactos populares de 85 cv com motor 1.0. Há uma banalização do alto desempenho e da potência que o próprio GT-R ajudou a criar. Carroll Shelby, em 2012, pouco antes de morrer, disse que fez um Mustang de 1.000 cv porque “500 cv não dá mais capa de revista”.

Mas é exatamente este contexto que precisamos considerar na hora de responder se o Nissan GT-R será um clássico ou não. O Nissan GT-R deixou de ser um grande carro, ou apenas nos acostumamos ao que ele é capaz de fazer? Vários artistas venderam mais discos que os Beatles. Vários jogadores fizeram mais gols que Pelé. Mas quem fez um disco como os Beatles e quem fez um gol como Pelé? Percebe a sutileza?

Cravar com alguma certeza o que será do GT-R no futuro, é uma aposta. O que define um clássico não é apenas o que ele faz no presente, mas como isso será visto no futuro. Um clássico precisa do teste do tempo. Se eu fosse apostar, diria que sim, o Nissan GT-R será um clássico. Ele veio, fez coisas que nenhum outro carro havia feito e, por um acaso, continuou por aí mais tempo do que deveria. Em vez de morrer como herói, viveu tempo suficiente para virar vilão, como diz o ditado popular. Mas mesmo as estrelas que se apagam lentamente, só podem se apagar porque um dia brilharam. E o GT-R brilhou como poucos.

A diferença do GT-R para seus antecessores, é que ele levará mais tempo para se tornar um clássico. Como há toda uma nova geração de entusiastas que não se impressiona com ele (pense em alguém que, hoje, tem 18 ou 19 anos) ele precisa ser esquecido pelas gerações que o viram se apagar, para um dia ser redescoberto por uma geração que só leu histórias sobre aquele carro do passado, que apareceu do nada e mudou as regras do jogo. Aí sim ele entrará para o panteão dos clássicos.


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