A chegada do Toyota Supra A90, quinta geração do ícone nipônico, dividiu opiniões. Já era sabido havia muito tempo que o novo Supra seria feito em parceria com a BMW e que teria um seis-em-linha alemão. Mas, ainda assim, alguns fãs ficaram revoltados, e até surpresos, com o fato de a Toyota não colocar o icônico seis-em-linha 2JZ no cofre do A90. Sem falar em todas as outras críticas ao projeto por seu visual.
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No fim do mês passado, uma companhia norte-americana chamada CXRacing anunciou que está trabalhando em um kit de conversão para instalar o 2JZ no novo Supra, usando um modelo 3D de alta resolução como base. Mas já existem projetos muito mais concretos neste aspecto: os carros de Daigo Saito e Masato Kawabata, ambos pilotos do D1 Grand Prix, principal competição de dorifuto japonesa. Os dois conseguiram colocar as mãos em exemplares do novo Supra muito antes de o cupê chegar às lojas. E os dois já instalaram motores 2JZ nos cofres de seus respectivos carros. O Supra de Daigo Saito até já está andando!
“Como assim?”, talvez você esteja se perguntando. Realmente: sabíamos que era questão de tempo até que alguém surgisse com um swap de 2JZ para o Supra A90, mas não esperávamos vê-lo tão cedo. Ainda mais em dose dupla.
O primeiro a anunciar o feito foi Daigo Saito, através de seu perfil no Instagram. Não dá para ficar mais claro: uma das fotos mostra Saito ao lado de seu Supra com o 2JZ já instalado, e outras publicações trazem imagens do carro em detalhes.
Daigo Saito, que já foi campeão do D1GP em 2008, e da Fórmula Drift americana em 2012, não é nenhum estranho a projetos ousados. Em outubro de 2015, por exemplo, ele transformou um Lamborghini Murciélago em um carro de drift, com motor V12 e câmbio manual, carroceria alargada, gaiola de proteção e sistema de direção modificado para maior ângulo de esterçamento. Então, não é exatamente surpreendente que ele tenha conseguido acesso a um Supra A90 muitos meses antes do início das entregas, previsto para meados de 2020.
Saito está trabalhando em parceria com a HKS, gigante do aftermarket japonês. Em um comunicado à imprensa, a HKS revelou algumas especificações do 2JZ: o seis-em-linha teve o deslocamento ampliado de três para 3,3 litros (3.352 cm³, na verdade) e deve entregar por volta de 800 cv quando estiver totalmente afinado. Pelas fotos, percebe-se que o seis-em-linha adotou um único turbocompressor (da HKS, naturalmente) e um enorme intercooler na dianteira, além de um plenum de admissão feito de fibra de carbono.
Projeções divulgadas pela HKS mostram que o carro também ganhará um novo kit widebody, com para-lamas alargados, um novo splitter frontal e uma asa traseira bem maior. O objetivo de Saito terminar o projeto ainda este mês, a tempo do All-Star Shootout, evento de exibição que abre a temporada de 2019 do D1GP, marcado para o dia 23 de março.
Esta também deve ser a ideia de seu colega, Masato Kawabata – que também foi campeão do D1GP, em 2007. A notícia de que Kawabata também está colocando um 2JZ em um Supra A90 veio poucas horas depois do anúncio de Saito, por meio de um vídeo publicado no Youtube. Nele, Kawabata faz um test drive no Supra completamente original antes de levá-lo para a oficina.
A partir dos 6:35 no vídeo, é mostrado o processo de desmontagem do carro e, em seguida, a instalação do 2JZ – que, pelo que se pode ver, recebeu novos componentes internos, também da HKS, e um novo câmbio de cinco marchas.
Agora, se você acompanha o FlatOut, deve saber que nós já abordamos a questão do motor 2JZ no Supra A90. Trata-se de um motor antigo, lançado há quase 30 anos e que já não é fabricado há 12 anos. É por isso que sua robustez vem, em boa parte, de sua massa metálica, o que o torna muito pesado – com bloco de ferro fundido, um 2JZ-GTE all stock pesa 231 kg. O motor BMW B58, seis-em-linha biturbo usado pelo novo Supra e compartilhado com diversos bávaros além do BMW Z4, pesa por volta de 140 kg. Não faria sentido algum, então, colocar o 2JZ em um esportivo nascido em 2019. Não para a Toyota. Especialmente em um esportivo com distribuição ideal de massa (50:50).
No entanto, ao transformar o Supra em um projeto de drift, Saito e Kawabata mudaram um pouco as regras do jogo. Colocando as coisas na balança (pun intended), o peso extra do 2JZ é compensado por outros fatores. O mais importante deles é provavelmente o suporte aftermarket para o seis-cilindros da Toyota, que possui um imenso catálogo de componentes de preparação e, com modificações relativamente simples, chega tranquilamente aos 600 cv com miolo original. O Juliano comentou no FlaTalk 02 (assista aqui!) que já existem projetos feitos com base no BMW B58 capazes de atingir números semelhantes. No caso do 2JZ estamos falando de um motor consagrado no meio drifter, com receitas de eficácia comprovada.
Além disso, no caso de um carro de drift, o aumento de massa sobre o eixo dianteiro não é uma questão extremamente relevante. É claro que, com o B58, a distribuição de massas entre a dianteira e a traseira do novo Supra é perfeita, mas isto não é um prolema tão grande quanto em um carro configurado para grip. No drift, os carros entram e saem das curvas com a traseira – ou seja, a inércia no eixo dianteiro provocada pelo peso extra é um fator muito menos importante, e muito mais contornável.
Fora tudo isto, também há a questão do câmbio. Não é possível usar a transmissão automática do Supra no drift e, embora a Toyota já tenha desenvolvido uma versão manual, ainda não é certa sua chegada ao mercado. Além disso, a BMW até teria o câmbio manual do M4, ele não é usado nem mesmo no M4 GTS de 500 cv, e exigiria reforços, o que é um fator de complicação, quando há uma infinidade de transmissões manuais e sequenciais compatíveis com o motor 2JZ — incluindo câmbios de competição.
E tem mais: ao menos no projeto de Daigo Saito, podemos perceber que houve alguma preocupação com a distribuição de peso. Repare, por exemplo, nos radiadores realocados para trás do vidro traseiro – e é bem provável que a bateria também seja transferida para a traseira, se é que isto já não foi feito. Não estamos tratando de amadores, afinal.
É claro que, se tratando de uma receita inédita, não é possível dizer com certeza que o Supra A90 com motor 2JZ será um bom carro de drift. Colocar o lendário seis-em-linha no cofre é apenas o primeiro passo É preciso ter certeza de que o sistema de arrefecimento está corretamente dimensionado e de que o peso extra na dianteira realmente não comprometerá o equilíbrio dinâmico, na prática. Até onde sabemos, as respostas para estas questões ainda precisam ser descobertas — o que deverá acontecer daqui a alguns dias, quando o carro de Daigo Saito for levado ao limite em sua estreia no D1GP.