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Pensatas Trânsito & Infraestrutura

O que o trânsito brasileiro pode aprender com a Suécia?

No ano passado, a Suécia chegou a um número recorde de mortes no trânsito. Mas diferentemente daqueles que estamos acostumados a ver ano a ano nas manchetes brasileiras, o recorde sueco é algo a ser comemorado: apenas 264 pessoas morreram em acidentes de trânsito naquele país em 2013 — o menor número registrado desde a década de 1970.

Enquanto isso, no Brasil, cerca de 45.000 pessoas perderam suas vidas em acidentes de trânsito. Claro, a comparação de números absolutos é descabida, uma vez que temos 200 milhões de habitantes, enquanto a Suécia tem apenas 9,5 milhões, mas comparando o número de mortes no trânsito a cada 100.000 habitantes, o país nórdico tem uma relação de apenas 3/100.000, enquanto o Brasil está esbarrando nos 25/100.000.

Para chegar a um índice igual ao dos suecos, precisaríamos reduzir as mortes no trânsito brasileiro para 6.000 em todo o país. Como comparação, só na cidade de São Paulo morreram 1.152 pessoas em 2013. Parece impossível, não? Especialmente quando se considera o aumento exponencial da frota ativa brasileira e se descobre que o número de acidentes com motos aumentou absurdos 610% nos últimos 10 anos.

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Acontece que mesmo com a frota ativa e a quilometragem média duplicada nos últimos 40 anos na Suécia, o número de mortes em acidentes de trânsito foi reduzido a um quinto nesse mesmo período. Como eles conseguiram isso?

Com um projeto chamado “Vision Zero“. Esse projeto foi criado pelo parlamento sueco em 1997 estabelecendo como objetivo “zerar” o número de mortes e lesões provocadas por acidentes de trânsito. Soa pretensioso e utópico, mas justamente por ter esse objetivo exigente e difícil de ser obtido ele se mostrou tão eficaz, e em menos de duas décadas conseguiu reduzir pela metade o número de mortes no trânsito sueco. Esta é a primeira lição a ser aprendida com os suecos: nossas campanhas nunca falam em um objetivo definido, e quase sempre limitam-se a “reduzir o número de acidentes”. Mas para quanto? Os suecos sabem: a zero. Nós não sabemos. Ainda.

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O primeiro passo foi colocar o planejamento urbano e viário em primeiro lugar. As rodovias suecas passaram a ser projetadas com a segurança em primeiro plano — e isso consequentemente leva a uma possibilidade de se adotar velocidades maiores, pois a estrutura é segura. Eles chegaram a desenvolver uma espécie de evolução da nossa “faixa adicional” em rodovias de pista simples e mão dupla.

São as chamadas 2+1 väg, ou literalmente, “estradas 2+1”. Elas consistem em uma rodovia comum com duas faixas em um sentido e uma no sentido contrário, alternando-se a cada “x” quilômetros, com os sentidos separados por uma barreira de cabos metálicos. Assim, todos têm a chance de ultrapassar com segurança, sem a necessidade de duplicação de uma rodovia de fluxo médio. Nos últimos dez anos foram construídos 1.500 km dessas rodovias, e elas salvaram 145 vidas nesse período — é como se o Brasil evitasse 1.400 mortes por ano apenas usando a engenharia viária.

Depois há os limites de velocidade. Os critérios de adoção são bem definidos, práticos e fáceis de entender até mesmo por leigos. Veja só:

— Em lugares onde há a possibilidade de conflitos entre carros e pedestres ou ciclistas, a velocidade máxima é 30 km/h.
— Onde há interseções em nível e pode haver colisões laterais (de um carro com outro no sentido transversal), a velocidade máxima é 50 km/h.
— Em lugares com a possibilidade de impactos frontais entre carros, a velocidade máxima é 70 km/h.
— Em lugares onde não há a possibilidade de impactos frontais ou laterais entre carros, a velocidade pode variar entre 100 km/h e 120 km/h.

No Brasil esses critérios são adotados em alguns casos, exatamente pela influência de programas como o Visão Zero. Mas em geral não há um método único adotado por aqui, como já explicamos anteriormente neste post.

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E como não poderia deixar de ser, o programa deu atenção especial aos pedestres e ciclistas. De 1997 até hoje, foram construídas mais de 12.000 travessias seguras como passarelas, faixas de pedestres com alerta luminoso e protegidas por lombadas, e ciclofaixas com limites físicos. Estima-se que só com essas travessias e faixas o número de atropelamentos foi reduzido pela metade nos últimos cinco anos.

Por último, mas não menos importante, houve um aumento na fiscalização humana. Patrulhamento das rodovias e um cerco aos motoristas embriagados fez com que menos de 0,25% dos motoristas abordados sejam flagrados acima do limite de álcool no sangue.

É pouco provável que os Suecos cheguem à marca zero ambicionada pelo projeto, afinal, o trânsito é feito de pessoas, e a mais marcante das características humanas é a possibilidade de falhas. Mas fica evidente que o estabelecimento da meta mais ideal possível fez com que tanto governo quanto motoristas e pedestres e ciclistas fizessem sua parte em nome de um bem comum — afinal, todo motorista torna-se um pedestre assim que desce de seu carro.

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Como se vê, a fórmula dos suecos não tem mágica alguma: ela apenas cumpre as noções básicas de um bom planejamento de trânsito e segurança viária. Carros andam devagar perto de pessoas, pedestres são protegidos por barreiras físicas, motoristas são fiscalizados para andar na linha.

O que temos a aprender com os suecos é que você não precisa demonizar uma categoria de veículos em benefício de outra (em todas as grandes cidades suecas há vias expressas exclusivas para carros e ônibus, sem calçadas nem ciclofaixas) e que a engenharia e o planejamento estão aí justamente para encontrar uma solução ideal e adequada a todos. Não parece difícil quando o trabalho é levado a sério.