FlatOut!
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Automobilismo

O terceiro Track-Day do Flatout

(foto de abertura @brucegyenge)

O rei Henry V de Shakespeare disse que quem “derrama seu sangue comigo será para sempre meu irmão”, mas eu não iria tão longe. Derramar sangue podia ser a experiência compartilhada masculina mais comum em 1525, mas evoluímos bastante desde então. Não o suficiente para que o Bardo perca importância, claro; continua relevante pois fala basicamente da nossa experiência como humanos neste planetinha. Só os detalhes cronológicos pertinentes à cada época mudam.

Não, derramar sangue é hoje indesejável e desagradável; prefiro dizer que aquele que compartilha a pista comigo, será então meu irmão. O que parece muito estranho hoje, nesta época tão dividida e de radicalizações, onde todo mundo parece travado em suas ideias e práticas sem nenhuma possibilidade de conversa ou mudança, e a consequente falta de convivência pacífica que vem diretamente disso.

O que torna os nossos Track-Days de fim de ano, organizados pela Crazy for Auto (@crazyforauto ) já há três anos seguidos, uma nova tradição bem interessante. Nosso track day de final de ano é muitas coisas em um evento só. Sim, é um track-day basicamente, que funciona como qualquer outro track-day. Mas também, é diferente.

A pista já é algo que dá o clima. O Autódromo da Fazenda Capuava é uma pista que não parece uma pista; parece mais um quintal de uma casa com um asfalto legal que dá para andar. É isolada, lá no meio de uma fazenda enorme, e tem um ambiente gramado e sem muros que lembra castelos ingleses, e aquele clima europeu de convescote. Só de chegar lá, de aboletar as cadeiras debaixo de uma árvore no gramado, um cara já fica calmo e feliz. É diferente, de cara.

É um encontro também. Gente que se vê nunca ou pouco durante o ano, tem como compromisso um pulo na Capuava no Track Day do Flatout para encontrar os amigos. É meio por causa de andar em pista, mas também pelo clima do lugar; a Capuava é sensacional para se colocar o papo em dia, fazer a conta do ano com os amigos.

Um exemplo claro disso é o Manoel Malafaia, um leitor que acabou por se tornar um amigo. Ele mora em Vitória, capital do estado do Espírito Santo, um lugar popularmente conhecido como “longe para um c*”. Nas três edições deste track day do FlatOut, ele veio com a família, os deixou num Hotel, e levou o carro da família (desta vez um Virtus MSI manual parecido com o meu) para andar na Capuava.

O objetivo dele, desconfio, é mais papear com os amigos e estar presente no evento que andar em si. Este ano, ele passou em casa na sexta-feira e eu o levei para conhecer a Estrada dos Romeiros, por exemplo. Mas isso não significa que não ande forte: este ano foi protagonista de uma seção de fotos sensacionais, captada pelo Bruce YoCars (@brucegyenge):

Este passeio fora-de-estrada causado por um câmbio quebrado de um carro que ia na frente que derramou óleo na pista, conseguiu destruir a correia poli-V do seu carro; o Malafaia então correu até uma loja de peças, conseguiu comprar outra, e um outro participante do track-day, um desconhecido, o ajudou a trocar. A outra consequência do passeio na brita foi o fato de que ao voltar para casa, distribuiu bolinhas de argila por três estados da união.

Chris Benevides à esquerda, Fabio Pinho à direita

Esse tipo de coisa sempre acontece; o Chris Benevides da Interlakes estava lá com seu Chevette (o “Chrisvette”), e também teve que correr até Indaiatuba para comprar peças; o Felipe Lima, o levou até lá. Faz parte; mas a ajuda de todos os outros participantes é que é francamente incomum; parece mesmo uma comunidade de amigos.

Outra diferença: é também um evento que junta toda a equipe do FlatOut num lugar só, eu Leo Contesini e o Juliano Barata. A gente mora em cidades diferentes e trabalha remotamente; é raro nos encontrarmos no mundo real, e ainda mais raro em dias como este, sem muitos compromissos profissionais. É meio a festa da firma, sem a cerveja e os vexames indesejados do Pereira da contabilidade, mas com carros na pista em seu lugar. O que também dá oportunidades diversos para vexames, mas que felizmente não aconteceram.

@brucegyenge

Este ano, além da sensacional organização impecável e costumeira da Crazy for Auto (@crazyforauto ), tivemos também a participação da Roda Bem Pneus de Indaiatuba (@rodabem_pneus) no trabalho de calibragem e troca de pneus. A Roda Bem, se você se lembra, foi onde eu troquei os pneus do Virtus e do Forester recentemente; é uma loja sensacional que sempre uso para este tipo de serviço. Indaiatuba representada! Valeu!

Uma tradição que se formou quase espontaneamente desde o primeiro evento foi o “Capuava Taxi”, onde levamos os presentes a andar na cadeira dois. Nos dois primeiros eventos, o Juliano Barata foi o principal taxista, mas neste a gravação do F.O.D.A. que ele aproveitou para fazer lá o impediu de se dedicar à atividade. Mas ninguém parece ter sentido falta dele: no lugar estava o Eduardo Cenci com seu sensacional (e raríssimo aqui no Brasil) Subaru BRZ de primeira geração.

É claro para todos que o BRZ e o Cenci foram as estrelas do evento: o carro na pista estava em seu habitat natural e o Cenci deu um show de pilotagem. Rodou nada menos que 117 voltas e destruiu um jogo de pneus no processo. Seu tempo mais rápido foi 1:47.990, impressionante.

Foto de @leandromoraesrosa

Além do Cenci, o Taxi Clássico Capuava, uma iniciativa bolada por meu amigo Gui Murad ano passado, voltou este ano. O taxi Capuava funciona com ajuda voluntária de amigos do site; assim foi com o Cenci e seu BRZ, e com os taxi clássicos. Este ano os Poladian, pai e filho, vieram com um sensacional Porsche 911SC Targa 1979 vermelho; o Rogério “Senhor BMW” Moreno (@senhor_bmw ) estava com seu BMW Z3, e o Marcelo Lóss estava com sua réplica de Porsche 550 Spyder. E, é claro, se o sujeito estivesse querendo experimentar o ápice da pirâmide automotiva de todos os tempos, eu também estava dando carona com o meu Chevette.

Falando sério agora; para variar um pouco o Chevette estava entre os carros mais lerdos do dia. Mas como sempre, é divertidíssimo de dentro. Fiquei feliz pela presença bem maior dos Chevettes: além de mim e do Chrisvette, o amigo Fabio “Road Runner” Pinho apareceu de Chevette também. Nossa informal “Copa Chevette” foi disputadíssima, me forçando nos 30 minutos finais dispensar os passageiros e tirar o estepe e o macaco do carro para acabar na frente. Ufa!

O Chevette do Fabio

O Chevette do Fabio é um 1.6/S a álcool original, bem usadinho, mas bem cuidado mecanicamente. Mostra como tem carro bom de andar na pista (se não extremamente veloz) barato e parrudo por aí ainda; rodou o dia inteiro sem problema algum, e num ritmo fortíssimo para Chevette. Valeu Fabinho!

Rodei bastante também, 72 voltas no total. O engraçado é o seguinte: é um evento de pista, o objetivo é andar na pista. Mas nos outros eventos fiquei apenas conversando e ajudando fora, mas não consigo dizer em qual dos 3 eventos me diverti mais. É sempre sensacional, pelo clima de encontro particular e reservado, entre amigos.

Outro motivo de ser um evento diferente é a variedade de gente e carro que participa. Estava lá a poderosa E36 Malbina, fazendo volta em 1:36.089 (segundo tempo do dia; o melhor foi o 1:31.646 do Evo X de corrida de Rafael Kasai), mas tinha também o Vitor Katanosaka com seu Fusca 1986 largamente original, me dando um trabalho danado no miolo.

O Felipe Leonardo Da Silva veio de longe com seu Del Rey 2.0 para fazer bonito na Capuava. Corsas, Ka, Fiesta, 205, e todo tipo de carro preparado para pista estavam lá; os onipresentes Sandero RS, tanto originais como mais acertados, fazendo tempos incríveis como sempre. Tinha literalmente de tudo. Inclusive o nosso amigo Max Loeffler com seu Smart; andei na cadeira dois e desacreditei como aquela cabine telefônica faz curva. E ainda assim,  mesmo com tanta disparidade de desempenho, não vi nenhuma briga ou ânimo acirrado.

Claro; é um encontro de gente parecida, de amigos, de companheiros que pensam parecido. Um encontro entre irmãos. Porque você, que dividiu o asfalto comigo, será para sempre, meu irmão.

“From this day to the ending of the world,

But we in it shall be remember’d;

We few, we happy few, we band of brothers;”

 

Um sorriso no rosto

Começar quando menos se espera. O FlatOut tem muito disso. Como o próprio site, que começou em um ano de recessão e Copa do Mundo, nosso Track Day começou em plena pandemia, ainda com máscaras alternadas com os capacetes. E deu certo. Chegamos à terceira edição de um evento que está se tornando uma tradição de novembro — uma festa de encerramento para os FlatOuters.

Reparou que todos nós chamamos o Track Day de “festa”? Por que é isso o que ele se parece: diversão por todos os lados em um grande encontro que reune gente de todo o Brasil e carros de todos os tipos. Se me pedissem para resumir o FlatOut em uma imagem, eu colocaria todos os carros do track day alinhados na reta da Capuava, com bandeiras de seus estados de origem e os proprietários em uma grande roda conversando sobre os carros. É exatamente isso.

Neste ano eu fiquei sem carro para a pista – não me sinto seguro com os freios do Focus num circuito (e quem tem Focus sabe o porquê), mas peguei uma carona com qualquer um que abrisse a porta do passageiro e aceitasse o “lastro flatouter” por algumas voltas.

Também fui o último a deixar a Capuava, extremamente satisfeito por mais um encontro bem-sucedido, de onde todos partiram com um p*** sorriso no rosto. É isso o que importa para a gente. (Leo Contesini)

 

O FlatOut materializado em um evento

Esse dia é sempre especial, eu acho que representa muito o que é a alma do FlatOut e o perfil de quem nos acompanha. Encontrar parte dessa turma que ajuda a suportar o FlatOut, compartilhar um dia inteiro de pista, papo furado nos boxes, dar umas risadas, tostar sob o sol e derreter uns pneus e pastilhas. Estando cada um em um canto do estado de São Paulo, também são raras as ocasiões em um ano em que eu, Leo e MAO estamos juntos, quanto menos fora do trabalho. Então vira uma confraternização por este motivo também.

Em nome das gravações do FlatOut Driving Academy que eu estava fazendo, nesta ocasião eu não pude realizar o Taxi Ride, uma tradição do nosso evento. Mas como vocês viram, tive substitutos que fizeram muito melhor este trabalho! Essa turma é foda. Aliás, o primeiro vídeo de todos teve uma coincidência épica: comecei a gravar justamente quando o Eduardo Cenci estava à minha frente com o seu BRZ – foi um pega espetacular, digno de um episódio de Initial D. Tração dianteira x tração traseira, cada um com uma vantagem em um trecho da pista, ambos no mesmo ritmo, separados por poucos metros. Este pega vira uma daquelas lembranças que a gente carrega pela vida.

Olhando para trás, fico feliz em ver a miscelânea de carros, entre clássicos, populares, esportivos premium e ratoeiras inusitadas! Não são muitos os eventos onde você vai ver um 911 aircooled, um Del Rey 2.0, um Mustang S550 e uma trupe de Chevettes dividindo a pista. De forma respeitosa, amistosa, mas todo mundo ali levando o cronômetro a sério. Isso é o corpo e a alma do FlatOut. Valeu mesmo, caras! (Juliano Barata)