O quadro FlatOut Street se dedica aos carros preparados e customizados estrangeiros e nacionais, de todas as épocas e estilos. São matérias especiais, feitas para serem saboreadas como as das clássicas revistas que amamos.
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É engraçado até, se a gente analisar olhando de fora. Por algum motivo, uma carroceria menos prática, mas de aparência menos quadrada, mas baixa e larga, sempre capturou a mente, e a carteira, de alguns compradores.
Até hoje, nessa nossa era da singularidade SUV, o fenômeno permanece: cada X5 tem o seu parceiro X6, ainda que o segundo é nada menos que o primeiro, piorado. É o estilo que importa aqui, a promessa de velocidade e esportividade, de um dono diferente e sem medo de nada. Inclusive de pagar mais caro por algo logicamente pior.
No passado, porém, costumava ser mais que apenas promessa. Os cupês derivados dos carros familiares era mais focados em sua missão alterada, muitas vezes muito além do que poderia imaginar sua mecânica original. Eram carros esporte, algo meio démodé, mas que já foi imprescindível para a saúde financeira de todo fabricante de automóveis.
Sim, saúde financeira. Peguemos o exemplo do antecessor direto deste carro de hoje, o VW Corrado: o Karmann-Ghia. Usando um chassi derivado do VW sedan, o cupê era pouco diferente mecanicamente, e pesava praticamente o mesmo, talvez ajudado pelas grandes quantidades de chumbo que eram usadas para fechar os gaps de carroceria.
A grande vantagem era apenas aerodinâmica, e de CG mais baixo, conseguida da forma clássica: no mesmo entre-eixos (e praticamente o mesmo comprimento total), a Kombi levava 9 pessoas, o VW sedan, 5 pessoas, e o Karmann-Ghia duas pessoas. Tá, teoricamente o último é um 2+2, mas humanos de verdade não deveriam ser aconselhados a ocupar esses ínfimos espaço atrás do motorista que a empresa chama de “+2”.
Como? Apenas mexendo na altura e posição dos ocupantes. Na Kombi, a posição é de banco de bar, e você, o motorista, está alto, com seu bumbum bem cima do eixo dianteiro. No Sedan, a posição é a mesma, mas você está mais baixo, no assoalho atrás do eixo dianteiro, e por isso pode levar só mais 4 amigos agora. No Karmann-Ghia a sua busanfa está quase no assoalho, o que lhe obriga a esticar as pernas, e ficar bem mais para trás no carro, basicamente bem no meio dele. Três carros diferentes, de dimensões básicas iguais, feitos diferentes apenas pela posição do derrièrre do motorista. O que define um automóvel, na verdade, é onde fica a sua bunda dentro dele.
Mas divago; o fato é de que, sim, o Karmann-Ghia era um Fusca mais esportivo só em regulagem de suspensão e CG mais baixo; mecanicamente eram idênticos. Mas o Karmann-Ghia, apesar de levar menos gente, e ter um desempenho igual, era muito mais caro que o Fusca. Importantíssimo para a saúde financeira da VW: a margem de lucro era expressiva.
Assim, a maioria dos fabricantes tinha seu cupê a venda para capitalizar esta tendência. Ainda se faz isso hoje, mesmo que de forma bem mais discreta, com tetos rebaixados apenas. Mas é uma importante parte da linha de produtos de qualquer empresa. Uma maquininha de imprimir dinheiro.
Mas depois do Karmann-Ghia, a VW meio que patinou por um tempo em como fazer isso. O substituto direto deveria vir da joint venture VW-Porsche, o 914, mas este, muito caro para um VW, e muito pouco exclusivo em sua mecânica para ser um Porsche, foi um fracasso. Era, na verdade, algo diferente, que só usava motores VW, mas sua própria plataforma. Sua evolução é na verdade o Porsche 924, uma outra história maluca.
Mas enfim, ao mesmo tempo que o 914 se mostrava ineficiente como cupê esportivo, a VW abandonava sua dependência com a Porsche em engenharia, e começa a criar uma nova família de carros baseada em soluções da Audi. Com isso o novo Golf seria criado por Giugiaro, mas usaria o esquema básico de Giacosa da Fiat, com motor transversal dianteiro em linha com o transeixo, e McPherson dianteiro.
O Golf, como o Fusca e o Karmann-Ghia, ganhou também seu cupê esportivo, o Scirocco. Foi na verdade lançado seis meses antes do Golf, que por ser uma mudança forte de paradigma na empresa, deveria se beneficiar desses seis meses de mercado do seu irmão cupê sem prejudicar sua imagem.
Os motores eram da Audi com quatro cilindros em linha OHC, a família que depois seria conhecida aqui como “AP”. o Scirroco de primeira geração teve motores que iam de 1,1 a 1,7 litros. O 1,7 litro era um motor para os EUA apenas; o Scirocco mais esperto era o GTI, com um deliciosamente suave e girador 1600 injetado com 110 cv, o mesmo motor que ficou famoso no Golf GTI.
Como o carro que substituiu, o Scirocco era feito na Karmann, em Osnabruck, com plataformas vindas da VW. O seu substituto, a segunda geração do cupê, de 1981, muito por isso mesmo continuou usando a plataforma antiga, do Golf original, A1. Mas era fora isso um carro totalmente novo.
A grande novidade desta geração foi o motor DOHC de quatro válvulas por cilindro. Este cabeçote novo foi aplicado num motor de 1,8 litros, e com isso dava saudáveis 139 cv. Lançado em 1985, se tornaria um motor lendário entre os amantes da VW.
A mudança para a plataforma de segunda geração do Golf, a A2, veio em 1988. Ainda fabricado na Karmann, tinha porém ambições de subir de categoria, e, por isso, mudou de nome: seria o VW Corrado.
O Corrado foi produzido por apenas sete anos, coincidindo com a queda da popularidade dos cupês nos mercados onde atuava; morreu sem substituto, e quando a VW reviveu o conceito em 2008, o chamou de Scirocco de novo.
O Corrado, porém, foi um carro universalmente adorado pela imprensa, apenas seu alto preço “para um VW” como um problema real. Mas outro problema atrapalhou o carro no seu início de produção: o compressor G.
Esta foi uma tentativa da VW de criar sobrealimentação sem o tradicional lag dos turbocompressores, mas com algo mais eficiente, e especialmente, menos barulhento que um tradicional compressor Rootes ou Lysholm. Não era algo exatamente novo, patenteado que foi em 1905, mas a VW acreditou que era uma solução possível, e única.
O compressor G tem este nome, G-lager, por sua construção de duas espirais, onde uma delas gira excentricamente expelindo ar. As espirais se assemelham à letra G visualmente. Inicialmente a VW criou dois tamanhos, um com largura de espiral de 40 mm (o G40, usado no Polo GT G40 com motor 1.4 litro) e de 60 mm (o G60, usado nos 1.8 litros).
O Corrado foi a maior plataforma de lançamento mundial desta nova tecnologia. O G60 era o mais potente Corrado; seu AP OHC de duas válvulas por cilindro e 1781 cm³, com o G60, dava 160 cv e 23 mkgf de torque; impulsionava o luxuoso cupê de 1210 kg até 230 km/h. O 0-100km/h era em igualmente impressionantes 7,5 segundos.
Mas contrariando as altas expectativas da VW para o seu compressor “silencioso”, os G-lader eram propensos a se autodestruir sem aviso ou motivo aparente. Propagandeado como um compressor “livre de manutenção”, acabou tudo menos isso.
Em 1992, a empresa abandona o G60 por outros motores bem interessantes. O primeiro é o 2.0 litros 16v com 136 cv e 18,4 mkgf. O segundo, o magnífico V6 com um só cabeçote e ângulo estreito entre cilindros chamado de VR6. Na Europa, o VR6 tinha 2861 cm³, 190 cv e 25 mkgf; nos EUA, 2781 cm³, 178 cv e 24 mkgf. O Corrado básico, só para Europa, permanecia com um 2.0 8v de 116 cv.
O carro durou em produção até 1995, e desapareceu sem um substituto direto, sempre algo triste. Aqui no Brasil, existem alguns poucos, mas é um carro raro, e altamente cobiçado pelos amantes da marca.
Mas nenhum deles é como o carro muito especial que vocês podem ver nas fotos.
O Corrado especial do Chico Herrera
O carro que vocês podem ver nas fotos nasceu justamente com motor G60. O Francisco “Chico” Herrera (@red_dvision), de Jaú, interior de São Paulo, o comprou em 2019, com o motor desmontado, e já sem o malfadado compressor.
A ideia inicial era colocar um VR6, mas acaba desistindo da ideia; existem muitas diferenças nos carros com este motor. O motor na verdade é o bloco original: foi preparado aumentando-se a cilindrada para 1,9 litros. Pistões, bielas, virabrequim, tudo é novo para esta nova versão.
O cabeçote é de Gol GTI 16v G2, com os comandos originais, mas uma admissão importada com quatro borboletas individuais. O coletor de escape também é importado, original do Corrado 16V. O transeixo manual de cinco marchas também é o original do carro.
A carroceria do carro já estava muito boa e não precisou de muito trabalho; o cofre foi onde mais trabalho foi gasto, para ficar completamente clean e com pintura tão brilhante quanto o exterior.
Motor montado, veio a parte mais difícil: o chicote elétrico e a instalação e calibração da Fueltech 450. Um longo processo que durou quase um ano. O carro pronto, foi instalada uma suspensão de rosca, e rodas aro 17.
É um carro onde o dono se preocupou com todo detalhe de aparência para fazê-lo exatamente a seu gosto, nos mínimos detalhes, inclusive com um cuidado incomum debaixo do capô. Um carro que agora certamente fará sucesso sempre que donos de VW se encontram.