Há alguns dias, começamos uma nova série aqui no FlatOut, falando sobre os motores com as configurações mais inusitadas da história do automóvel – tanto em posicionamento quanto em número e arranjo de cilindros. E também explicamos como foi que os motores que consideramos comuns se tornaram comuns.
Você pode conferir a primeira parte aqui. A segunda parte, você confere agora!
Motor V8 transversal
É meio que um senso comum: motores em V são instalados longitudinalmente, com a transmissão logo atrás para levar a força para as rodas traseiras. Mas este nem sempre é o caso – e a gente não está falando dos carros com tração integral: existem motores V8 transversais!
O primeiro exemplo que vem à cabeça é o Lancia Thema 8.32, o sedã italiano que, graças o motor V8 da Ferrari Mondial, é um verdadeiro sleeper.
Sendo um projeto de tração dianteira, ele tinha motor transversal – fosse ele um quatro-cilindros, um V6 ou um V8.
Mas ele não é o único: o motor B8444S, da Volvo, é um V8 projetado pela Yamaha sob encomenda dos suecos, e foi desenvolvido especificamente para ser instalado na transversal. Para isto, ele têm um ângulo de 60° entre as bancadas de cilindros, típico dos motores V6.
Ele começou a ser usado em 2005 nos carros da plataforma P2 da Volvo – primeiro, no SUV XC90 de primeira geração e, depois, no sedã S80. Curiosidade: o nome B8444S significa que se trata de um motor a gasolina (“B” de bensin, que é “gasolina” em sueco), com oito cilindros, de 4,4 litros, com quatro válvulas por cilindro e naturalmente aspirado (o “S” é de “standard”, que era o codinome dos motores naturalmente aspirados).
Outra curiosidade: o motor B8444S é bastante semelhante ao V8 SHO da Ford, que foi projetado para o Taurus SHO em 1996 e também é instalado na transversal. Na época, a Volvo pertencia à Ford, o que levou muita gente a achar que ambos os motores derivam do mesmo projeto. As companhias negam veementement, dizendo que embora algumas dimensões, como a altura do bloco e o curso dos pistões, sejam iguais, as semelhanças param por aí.
Seis-em-linha transversal
A Volvo também utilizou um seis-em-linha transversal atée 2016. A primeira geração do S80, de 1998, era movida por um seis-em-linha que podia ter 2,7 ou 2,9 litros, naturalmente aspirado ou turbinado. O chamado SI6 (short inline-six, ou “seis-em-linha curto”) veio depois, em 2005. Com deslocamento de três litros (turbo) ou 3,2 litros (aspiração natural), o motor tinha comando duplo variável e era empregado em carros de tração dianteira ou integral, como o S60, V60, S80, o V70, XC60 e o XC90.
A configuração é particularmente curiosa porque os motores de seis-cilindros em linha são dos mais longos fabricados atualmente (junto com os V12). Isso não é um problema quando se instala o motor longitudinalmente, porém quando você decide colocá-lo na posição transversal, o espaço é limitado pelas torres dos amortecedores nas laterais do cofre. Por esse motivo o layout é tão incomum. E também por isso a Volvo teve que fazer este seis-em-linha com bloco mais curto.
V12 transversal
É comum dizer que, com o Miura, a Lamborghini inventou os supercarros como os conhecemos hoje: carroceria baixa, em formato de cunha; dois lugares; tração traseira e desempenho matador para um carro de 50 anos atrás. Só tem um detalhe: a grande maioria dos supercarros tem motor longitudinal. O Miura, não.
Pois é: o motor V12 de quatro litros do touro italiano, que na época do lançamento produzia 350 cv a 7.000 rpm, era montado na transversal por dois motivos. Primeiro, para melhorar a distribuição do peso, que ficaria muito concentrado na traseira com arranjo longitudinal. Segundo, por questões de estética: com o motor transversal, a carroceria projetada por Marcello Gandini tinha uma traseira mais curta e melhor proporcionada em relação ao resto do carro.
Há, contudo, outro exemplo de motor V12 transversal: o Honda RA272, bólido de Fórmula 1 que a fabricante japonesa construiu na década de 1960. Ele tinha um motor V12 que já era incrível por si só, com apenas 1,5 litro de deslocamento e capacidade para girar a mais de 13.000 rpm – rotação que era incomum para a época, e produzia uma bela sinfonia:
Volkswagen W16
Na primeira parte desta série, falamos sobre o motor W8 da Volkswagen. Mas o que acontece se você juntar dois motores W8 pelo virabrequim?
Se você disse “um W16”, é porque leu o subtítulo, acertou: foi mais ou menos isto o que a Volkswagen fez no início da década passada para dar um motor ao Bugatti Veyron. Na verdade, a estranheza começa com o fato de o motor W16 ser derivado do W8, que é basicamente dois motores VR4 montados lado a lado, sendo que o VR4 é um VR6 com dois cilindros a menos. É praticamente um inception de esquisitice.
Como se não bastasse, o W16 ainda é um exercício de extravagância por parte do setor de engenharia da Volkswagen, com oito litros de deslocamento, quatro turbocompressores e dez radiadores, ele entrega pelo menos 1.001 cv e 127,5 mkgf de torque. Além disso, como o espaço no cofre é bem mais generoso, o ângulo que separa os as bancadas de cilindros é maior: no W8, são 72°, enquanto no W16 são 90°.
Oito cilindros em linha
Quando os carros eram muito maiores e mais pesados, os motores também eram assim. Até a década de 1940, eles ainda eram relativamente comuns nos automóveis – e, nas décadas de 1920 e 1930, eram muito populares nos carros de corrida. Naquela época, questões como distribuição de peso e eficiência energética ainda não faziam parte das preocupações das fabricantes.
Fabricantes como Alfa Romeo, Mercedes-Benz e Bugatti tinham motores de oito cilindros em linha com alto deslocamento e, surpreendentemente, até mesmo comando duplo no cabeçote. Eles eram empregados em modelos de luxo, e eram gigantescos – o motor de alguns modelos da Duesenberg tinha mais de 1,2 m de comprimento.
E eram motores potentes: o oito-cilindros de dois litros do Bugatti Type 35, por exemplo, tinha três válvulas por cilindro, comando simples no cabeçote e entregava nada menos que 100 cv – em 1924!
Dois-cilindros Ferrari
Em 1954, a Fórmula 1 sofreu uma mudança no regulamento: os compressores mecânicos, muito populares entre as equipes, foram banidos, e o deslocamento foi limitado a 2,5 litros. A Ferrari, que já era uma das potências da categoria, decidiu contornar a situação com um motor de dois cilindros em linha. Sim, a Scuderia, conhecida por seus V12 extremamente avançados para a época, apelou para o downsizing!
OK, não foi bem assim (até porque o motor era naturalmente aspirado), mas é curioso do mesmo jeito. Foi o engenheiro Aurelio Lampredi o autor da façanha: ele projetou um motor bicilíndrico de 2,5 litros para ser usado no GP de Mônaco de 1955.
Na prática, o motor era uma variação de um quatro-cilindros, com 118 mm de diâmetro e 114 mm de curso, oito válvulas e quatro velas. Era como se ele tivesse unido as câmaras de combustão de um quatro-cilindros em pares.
O motor jamais foi instalado em um carro: na hora de testá-lo em uma bancada, Lampredi descobriu que ele vibrava excessivamente a ponto de quebrar o virabrequim. Assim, apesar do torque mais alto — os números nunca foram divulgados — a aplicação prática do motor de dois cilindros era inviável e o projeto foi abandonado.