Motores de quatro cilindros podem não ser os mais exaltados pelos entusiastas nos fóruns de internet e nas rodinhas de amigos, mas nem por isso deixam de existir motores emblemáticos entre eles. Prova disso foi quanto rendeu a pergunta que fizemos a alguns dias: “qual o motor de quatro cilindros mais emblemático do planeta”.
Depois de duas partes (parte 1 e parte 2) com as sugestões dos leitores, ainda ficaram faltando alguns – que você vai conferir agora, na terceira (e derradeira) parte da lista!
Honda K20
Foto: Import Tuner
Sugerido por: Doge
O Honda K20 é o mais novo membro da trindade dos quatro-cilindros da Honda – foi lançado em 2001, três anos depois do F20C (citado aqui) e treze anos depois do B16 (falamos dele aqui), sendo instalado na segunda geração do Honda Civic Type R, a EP3 (aquele com jeito de minivan) e no Integra Type R, além do Honda Stream (que era, de fato, uma minivan).
De concepção semelhante ao F20C, o motor K20 é um quatro-cilindros de dois litros com bloco e cabeçote de alumínio, camisas de ferro fundido deck de 212 mm e 86 mm de curso e diâmetro para deslocar exatamente 1.998 cm³. Existem, ainda, as versões K23 e K24, com bloco mais alto (231,5 mm) e, no caso do K24, diâmetro de 87 mm.
O K20 teve diversas versões, com diferentes detalhes, para vários modelos em vários mercados. Há versões com comando variável i-VTEC apenas nas válvulas de admissão, enquanto outras contam com o sistema também nas válvulas de escape, por exemplo. O “nosso” K20, encontrado no Civic Si de nona geração, é o K20Z3, com polia variável, i-VTEC apenas nas válvulas de admissão e respeitabilíssimos 192 cv a 7.800 rpm, com limite de giro às 8.300 rpm. Existem versões ainda mais potentes lá fora, e uma infinidade de componentes de preparação – afinal, é um projeto com mais de quinze anos que tem um potencial enorme (temos um belo guia de preparação aqui).
A própria Honda continua aperfeiçoando o K20. Sua versão mais nervosa atualmente é o K20C1, motor do atual Civic Type R – uma pequena maravilha de 310 cv que até nos faz perdoar a adoção dos turbocompressores (e a consequente redução no giro do motor, que é limitado a 7.000 rpm.
Volkswagen AP
Foto: Bernardo Rosset Pastore
Sugerido por: muita gente
Não há como fazer uma lista de motores de quatro cilindros icônicos e não citar o AP – deixamos para o final de propósito. O quatro-cilindros em linha arrefecido a água tem suas origens em um projeto da Mercedes-Benz, que em 1959 passou a fazer parte do mesmo grupo que a Auto Union, a companhia que deu origem à Audi. Através de uma série de mudanças de dono, a Auto Union foi parar nas mãos da Volkswagen, que aproveitou o projeto em modelos da Audi e de sua própria marca.
Projetado para entregar robustez e economia de combustível, o projeto trazia diversas características inovadoras para a época: quatro cilindros, quatro tempos, comando de válvulas no cabeçote (acionado por correia dentada) e instalação longitudinal. O chamado EA-827, que estreou em 1972, era ligeiramente inclinado para a direita para caber no cofre do Audi 80 e do VW Passat de primeira geração, com o radiador do lado esquerdo do cofre – configuração compartilhada pelas duas primeiras gerações da família Gol (G1, G2, G3 e G4), grande responsável por popularizar o motor AP no Brasil.
O EA-827 deu origem a literalmente dezenas de configurações diferentes, e moveu boa parte dos automóveis do grupo VW em todo o planeta por décadas. Apesar de antigo, o projeto sempre foi muito receptivo a melhorias, como a adição de cabeçotes de quatro e até cinco válvulas por cilindro, turbo, supercharger (caso do Volkswagen Corrado G60, por exemplo) e diferentes sistemas de injeção. Até o ano passado, o atual VW Jetta usava uma variação do motor AP, de dois litros e 120 cv, com injeção multiponto e cabeçote de oito válvulas – e vendeu relativamente bem até ser substituído pelo 1.4 TSi de 140 cv na versão de entrada.
Sendo um dos motores mais comuns no País, o AP tem um mercado gigantesco de peças de reposição e também de preparação, com receitas consagradas e capazes de atingir números de potência impressionantes com sobrealimentação. Além disso, foi o primeiro motor da Volkswagen a abandonar o arrefecimento a ar, o que já garante seu status de ícone por si só. Não deixe de conferir sua história completa aqui!
Mitsubishi 4G63
Sugerido por: ESantos
O motor usado pelo Mitsubishi Lancer Evolution entre 1992 e 2006, do I ao IX, carrega para si o mérito de enfrentar o carismático boxer EJ da Subaru com uma configuração muito mais tradicional. Versão de dois litros do motor Sirius, da Mitsubishi, o 4G63 tem curso de 88 mm e diâmetro de 85 mm. Ele foi usado pela primeira vez em 1981, ainda com cabeçote de oito válvulas, no Mitsubishi Lancer EX2000 Turbo – que, como o nome diz, era sobrealimentado por um turbocompressor e entregava 170 cv com a ajuda de um sistema de injeção eletrônica, ainda pouco difundido na época.
Era o bastante para que o retilíneo sedã esportivo chegasse aos 200 km/h de velocidade máxima – uma de suas características mais interessantes, além da tração que ainda era traseira.
Nos anos seguintes, o 4G63 recebeu comando duplo no cabeçote em 1967, com o Mitsubishi Galant vendido no Japão, e podia ser turbo ou naturalmente aspirado. Além do Galant (incluindo a versão esportiva VR-4, com turbo, tração integral e 241 cv), carros como o Eclipse, o Colt e o próprio Evo vieram com o 4G63 – além de carros de outras fabricantes, como Hyundai, Dodge e Plymouth, através de parcerias e joint ventures.
Suas versão mais potente de fábrica foi o motor do Lancer Evolution FQ-400, que foi lançado em 2004 e, graças a uma preparação de primeira pela equipe Ralliart do Reino Unido, chegava a nada menos que 400 cv. A potência impressiona até mesmo para os dias atuais – era a mesma cavalaria da então recém-aposentada Ferrari 360 Modena. O quatro-cilindros recebia um turbo Garrett maior, pistões Omega e bielas HKS, ambos forjados. Da HKS também eram a junta do cabeçote e os parafusos, além das velas de iridium.
Com as modificações, o 4G63 de dois litros passou a produzir 405 cv a 6.400 rpm e impressionantes 49 mkgf de torque a 5.500 rpm. Era suficiente para fazer o FQ-400 ir de zero aos 100 km/h em 3,5 segundos e passar dos 280 km/h!
Offenhauser
Sugerido por: Alexandre Garcia
Nem só de maravilhas modernas da engenharia vive esta lista. Prova disto é o Offenhauser, motor cujo projeto data dos anos 1930 que se tornou um dos favoritos das equipes de corrida americanas na primeira metade do século XX. Desenvolvido por Harry Arminius Miller, que já era um respeitado projetista de carros de corrida na década de 1920, o motor Offenhauser se tornou um dos mais bem sucedidos motores de competição de seu tempo, especialmente na Fórmula Indy.
Feito com base em um projeto aeronáutico, o Offenhauser era um quatro-cilindros bastante avançado na época. Com 2,47 litros de deslocamento, tinha comando duplo no cabeçote, quatro válvulas por cilindro e injeção mecânica de combustível. No entanto, seu maior trunfo era a simplicidade. Cabeçote e bloco eram uma peça única (ou seja, nada de vazamentos na junta), as válvulas eram atuadas diretamente pelos comandos (que ficavam bem aparentes em suas carcaças na parte superior do motor), e estes eram fáceis de ser substituídos, tornando a tarefa de colocar comandos de perfil mais agressivo relativamente simples.
Foi um funcionário de Harry Miller, Fred Offenhauser, quem desenvolveu a primeira versão realmente bem sucedida do motor, e por isto o mesmo foi batizado com seu sobrenome. Nas mãos de Fred, o deslocamento cresceu para 3,6 litros. Com diâmetro de 107,9 mm e curso de 114,3 mm, não era um motor exatamente girador (até porque, nos anos 30, poucos eram), mas entregava saudáveis 250 cv a 5.200 rpm. Em 1933, a companhia de Miller pediu falência – consequência da Grande Depressão de 1929. Para não interromper o projeto, Offenhauser abriu sua própria companhia e comprou os direitos sobre o design, chamando Miller e outros ex-colegas para dar sequência ao desenvolvimento e à produção do motor.
Evoluções do motor Offenhauser desenvolviam algo entre 420 cv com aspiração natural e quase 1.000 cv na versão de 4,4 litros (1,1 cilindro por litro!), que tinha taxa de compressão de 15:1. O motor Offenhauser venceu nada menos que 27 edições da Indy 500, tendo participado da corrida de 1934 a meados da década de 1970. Entre 1950 e 1960, todos os lugares do pódio, em todas as edições da prova, foram ocupados pela Offenhauser.
O último dos Offenhauser, aposentado em 1983, deslocava 2,65 litros e era capaz de entregar 780 cv a 9.000 rpm. Sim, ele era um monstro:
PSA THP
Sugerido por: Greg Fernandes
Um dos motores modernos que melhor provaram a capacidade dos quatro-cilindros foi o THP, projeto que nasceu do trabalho conjunto de BMW e Peugeot Citroën. Parte da família Prince de motores de 1,4 e 1,6 litro, o motor THP é o membro nervosinho da família, com turbo, injeção direta de combustível e sistema de comando variável VANOS para render até 270 cv.
São 77 mm de diâmetro e 85,8 mm de curso, para um deslocamento total de 1.598 cm³. Na maioria das vezes, o turbo é do tipo twin scroll, e em toda as versões o destaque é o torque em baixa – em certos casos, o pico já aparece a partir das 1.400 rpm.
O THP de 270 cv pode ser encontrado no Peugeot 308 GTI e no RCZ vendidos na Europa. No Citroën DS5 vendido no Brasil, eram 165 cv na época do lançamento, e há versões do BMW Série 1 com motor THP de 136 cv. O THP também pode ser encontrado em outros modelos da Peugeot e Citroën no Brasil, como o crossover 3008, o sedã 408 e o sofisticado DS4, além de certas versões do Mini.