Meu nome é Danilo Caldeira Rodrigues, tenho 31 anos, casado e pai babão de um mini piloto de 2 anos! Trabalho na indústria automotiva como designer e sempre estive envolvido com carros desde que nasci, seja pela influência e gosto por desenhos de automóveis, de meu pai, pelos meus dois tios (já falecidos) — um deles sócio da empresa Fibrão, autorizada puma no auge dos anos 80 e responsável pelo desenho da GTB Daytona, um cara que me inspirou muito, me incentivou na compra de meu primeiro carro (um puma P-018, bem raro hoje em dia e que infelizmente já não ocupa mais minha garagem) e me fez ter capricho pelas coisas e a enxergar os carros como uma obra de arte e não como meio de locomoção apenas.
Meu outro tio era um colecionador e adorador de chevrolet clássicos e piloto da extinta fórmula Classic e força livre com um Camaro#37 1974 – praticamente um Nascar disfarçado, responsável por me levar à Interlagos por diversas vezes também nos anos 80 e 90.
De lá pra cá hoje o meu primo Ricardo, aka Zumbi para aqueles que assistem o programa Turbinados da discovery channel, eterno rival nos tempos de Gran Turismo no PS2 e 3, herdeiro do Camaro #37 segue a linha do pai pelo gosto por Chevrolet, gasolina e pista. Hoje ele é um acertador de carros de primeira! Fera em telemetria! Calculista em tudo! Isso tudo naturalmente me envolveu nesse universo sobre 4 rodas como hobby e trabalho.
O Objetivo de compartilhar meu projeto é além de incentivar, também ajudar e poder esclarecer dúvidas de quem pretende entrar pro lado negro da força dos modificados!
A escolha do carro
Não seria nada mal guiar uma barca de seis metros com um V8 torcedor de chassis, queimador de pneus, afinal sempre fui um admirador dos muscle cars americanos, mas minha idéia para este projeto seria um carro acessível, antigo, leve e de tração traseira. Por essas características não restaram muitas opções: Chevette e Fusca. Confesso que não foi fácil decidir.
Por um lado um VW que permite uma grande oferta no mercado mas que há alguns anos vem numa ascensão de preço absurda; por outro lado um clássico GM que sempre admirei mas que raramente se encontra um modelo “honesto” em condições boas a um preço acessível.
Normalmente vemos exemplares muito originais a preços bem salgados ou em contrapartida em condições péssimas, de restauro – que não era de meu interesse. Até que, após muitas buscas por anúncios de classificados, me aparece um fusca 65 aparentemente muito íntegro e com muitos itens originais. O preço? Abaixo do que considerava justo para um carro realmente íntegro. O jeito foi conhecer de perto.
Rumo a Cerquilho, interior de SP. Não tinha nada a perder. Se o carro estivesse bom, fechava negócio, se não, aproveitaria a viagem para conhecer e almoçar na simpática e pacata cidadezinha. Pra minha surpresa o carro realmente estava muito inteiro e com muitas peças originais. A exceção era a mecânica, adaptada para 1600 e 12 volts, o que não era problema algum pra quem não pretendia fazer parte do “clubinho dos originais” .
Após algum tempo conversando com o proprietário do #marley65 (esse era o nome dado àquele vw pelo proprietário). Confesso que gostei do nome e também desta parte de negociações. Resumindo, após algumas propostas chegamos a um acordo: um valor muito justo e certo que seria um ótimo negócio! (poderia vir até sem motor! Que já estava no lucro!).
Na semana seguinte marcamos para resolver a papelada e levar o carro no guincho dirigindo! Sim, já aproveitei para testá-lo em condições reais, ouvir possíveis barulhos e sentir qual relação de diferencial tinha naquele ex-1200cc.
Tudo certo: carro na mão e uns trocados no bolso, frutos da negociação! O que fazer primeiro?
Digamos que antes de partir para o projeto e suas fases, pretendia corrigir algumas questões básicas. Não estava difícil, pois o carro sempre foi muito alinhado estruturalmente.
Primeiros passos
Não sou aquele cara extremamente chato com carro, nunca pretendi tirar carroceria, restaurar toda chapa, repintar chassis e me tornar escravo de meu próprio projeto. (cansei de ver muitos carros não serem concluídos por falta de tempo, dinheiro, enfim, Não queria isto acontecendo comigo). Este foi o motivo por não comprar o carro mais barato que encontrasse! Se você, assim como eu, pretende curtir seu brinquedo o quanto antes, não faça isso, a não ser que você viva de restaurar carros, tenha muito tempo livre ou esteja disposto a injetar muito dinheiro, caso contrário a chance do carro virar um grande peso de papel é grande.
Assim a primeira e crucial providência após o carro chegar em casa foi arrancar aquele filme velho e escuro dos vidros, o que já melhorou muito a aparência geral do carro. Uma revisada na mecânica, freios e suspensão também foi feita e denunciou já a idade e a eficiência de muitos componentes, como amortecedores sem vida, buchas ressecadas, freios pouco eficientes entre outros.
A aparência geral externa agradava mas como designer e consequentemente com um olho crítico para detalhes, a pintura apesar de boa não me agradava totalmente. Mismatching de cores dos paralamas pro restante do carro incomodava, reforçado por um ralado herdado do antigo dono, alguns poucos pontos de oxidação querendo brotar e somado ao fato de ter que eliminar os furos oriundos das polainas e saias de inox (acessórios bem comuns nos fuscas da década de 60).
Decidi dar um banho completo nele na cor original – branco pérola. Aproveitei então para trocar o parabrisa degrade já bem riscado por um convencional usado mas bem conservado e substituir as borrachas dos vidros já bem ressecadas por novas. Aproveitando q emblemas e frisos seriam reinstalados após a nova pintura, comprei novas presilhas para a reinstalação dos frisos que também receberam polimento. O alumínio antes fosco agora tinha brilho! Pois bem. Esta foi a fase inicial e básica após a compra do carro. Obviamente o projeto nem tinha começado.
Eliminando a película escura dos vidros. A aparência mudou da água pro vinho!
Merecido banho para igualar a cor Branco Pérola, segundo alguns artigos, original até 68 sendo substituída pelo Branco Lotus (pérola só no nome, a pintura é sólida)
Como é difícil não cair na tentação por novas peças! Primeiros mimos abaixo:
O conceito “Outlaw”
Era a hora de conceituar como seria o projeto. (parte mais tesão!!) Independente de ser Fusca ou Chevette, já tinha em mente um estilo a seguir, já que os dois se enquadrariam muito bem. Pois bem, sempre admirei a forma como a Singer trabalha nos Porsches 911, assim como a Emory modifica seus 356. Há muitos 356 “fora da lei” muito bem feitos e não necessariamente de empresas de renome. A essência do carro permanece neste tipo de preparação – personalização. São modificações de bom gosto e bem exclusivas onde prevalece a qualidade sempre! Foi isto que me inspirou!
Colocar no papel foi a parte mais fácil, uma vez que não é muito diferente do que estou acostumado a fazer em meu trabalho. A diferença é que agora preciso ser realista e contar com meu orçamento mais enxuto do que a de uma montadora, que prepara um show car em tempo recorde sem medir esforços, por exemplo. Outra dificuldade é encontrar profissionais que acreditem e executem bem tudo aquilo que está no papel. Fóruns, amigos, eventos, tudo isso ajuda a conhecer as empresas influentes e o mais importante: as pessoas por trás das empresas. Para algumas modificações basta um acompanhamento bem forte que a coisa sai, mesmo em empresas pequenas. É só querer!
*Dica: Mesmo que você não domine desenhar, procure esboçar ou listar suas idéias. Crie um painel em cartolina. Fixe na parede da garagem ou de seu quarto (se tiver esposa, melhor deixar na garagem!) Filtre-as e coloque as prioridades. Organização é vital em tudo! Isto poupará tempo e dinheiro
Digamos que o Outlaw Project se divide em três etapas: Interior / Exterior / Mecânica / Detalhamento.
Começando o interior, defini de cara que os bancos originais (em ótimo estado, inclusive) não me atenderiam mais, seja por conforto ou por eficiência: primeira curva forte você toma um escorregão e para sentado no lado do passageiro, além do encosto ser reclinável e não ter trava. Desapeguei!
Bancos não tinham o revestimento pijaminha original, mas a estrutura estava impecável. Aliás, revestimento branco nunca mais! Encarde bem pouco, viu?
Nova aquisição: mini concha que em breve terá sua espuma remodelada e o revestimento de fábrica jogado no lixo!
O primeiro passo foi desenhar e construir a roll bar pensando no novo banco. Whaat?? Não seria roll cage? Existem algumas diferenças básicas entre estes dois tipos de estrutura. Ambas reforçam a carroceria conferindo maior rigidez, mas somente o Roll cage te protegerá por completo em caso de capotamento, por ex. Nenhuma categoria de automobilismo homologaria um Roll bar, pois não seria a estrutura mais eficiente para a proteção do piloto. Sacou?
Em vermelho os tubos determinantes para uma legítima rollcage. Imagens: Bangshift.com
No meu caso, onde o uso do carro não será extremo, optei pela rollbar por ser mais leve (menor quantidade de tubos) e menos complexa, permitindo ainda total conforto para ocupantes dianteiros e relativo conforto para quem anda no banco de trás. Este tipo de estrutura foi construída baseada no estilo Club Sport, pois seria praticamente plug&play, permitindo uso de cintos de quatro ou cinco pontos.
Ainda sim ficou bem feita, funcional e atendeu minhas expectativas, ficando bem fiel ao desenho apresentado. Ela é dividida em três partes para permitir que os módulos entrem dentro do carro, evitando soldar as bases no chassis e sim utilizando parafusos de inox com porca auto travante. Outra vantagem é que fica totalmente reversível.
Para quem quer construir uma estrutura funcional e esteticamente bonita, converse com especialistas e deixe claro qual seu objetivo. Existem opções de tubos em cromo-molibdênio ou aço carbono além de várias medidas e tipos de dobras – com ou sem areia (em SP temos boas casas de escapamentos, mas o que conta muito é a boa vontade do profissional para medir e soldar com capricho. Busque por carros já construídos como referência para se avaliar o trabalho executado).
Dica: Definida a empresa, leve o carro depenado, sem carpete, sem forrações e proteja as guarnições e cantos de portas com plástico bolha. Isto te dará menos preocupações com arranhões além de deixar o profissional trabalhar mais a vontade além de você poder pechinchar desconto, pois o carro estará desmontado. Lembra dos frisos externos em alumínio, polidos e restaurados? Ganhou um amassado misterioso na loja de escapamentos. Ninguém sabe, ninguém viu… deveria ter guardado e reinstalado após o carro retornar pra casa.
Referências gringas: Beetles, Vochos, Escarabajos e suas respectivas “gaiolas”
Primeiros esboços
Idéias pro Marley65. imaginei o extintor entre os bancos
Emaranhado de tubos já praticamente finalizados: quebra-cabeça:
Test fit com os novos bancos, adaptados e com suas bases devidamente reforçadas pela própria empresa que fez a gaiola
Roll bar pronta, era hora da pintura. O acabamento escolhido foi um grafite metálico quente, que também foi a cor escolhida para a parede corta fogo do motor assim como o centro das rodas, criando um alinhamento e identidade entre elas.
Peças pintadas, era hora de levar para a tapeçaria e esperar a execução do interior, para então iniciar a montagem.
No próximo post escrevo sobre a fase final do interior: a tapeçaria, um dos pontos mais exclusivos e bem executados do carro!
Até lá!
Por Danilo Rodrigues, Project Cars #296