Pra quem ainda não sabe o Chevrolet Chevette nasceu como Opel Kadett C(terceira geração) em meados de 1973. Foi desenvolvido na Alemanha em conjunto com engenheiros brasileiros, americanos, japoneses, australianos e inglêses e portanto é o primeiro carro de plataforma mundial da General Motors Company. Seu estilo arrojado logo caiu no gosto do Brasileiro afinal, quando lançado por aqui, ele era o carro mais moderno do Brasil com soluções até então inéditas no nosso mercado.
Em torno de outubro de 1975 a GMB lançou uma série esportiva do Chevette que de esportiva mesmo só tinha a estética, rodas taludas de 6,0 polegadas(as comuns tinha 4,0 polegadas) calçadas com pneus radiais de escritas brancas e sobre aro de aço inox. Faixas “rally” completavam o diferencial. O Chevette GP ja vinha como modelo 1976.
Mas foi em meados março de 1976 que a GMB resolveu criar uma nova série especial diferenciada e de produção limitada denominada “País Tropical”. Não se sabe exatamente o que levou a Chevrolet a escolher este tema, mas sabe-se que foi uma homenagem ao cantor Jorge Ben Jor que acabara de lançar um album homônimo de grande sucesso.
Pois bem, o Chevette “País Tropical” é na verdade uma fusão do Chevette GP com o Chevette SL(super luxo). Saíam as molduras cromadas das janelas presentes em todos os SL 76 e consideradas cafonas e retrogradas naquele mesmo ano. E entravam em cena a rodas esportivas de tala larga, o espelho cônico de desenho aerodinâmico usados no Opala SS e Chevette GP e um rádio toca-fitas da marca NISSEI que incluia, vejam só, uma fita cassete com a música “país tropical” de Jorge Ben Jor. Curiosiamente, era uma fita demo com apenas uma música. O kit também incluia 2 auto falantes pra usufruir do som estereo. Pra se ter uma idéia, nem mesmo o Opala Super Luxo 4.100 vinha com cassete estereo de fábrica. Era algo realmente bem ousado pro Chevette.
O mais legal da série “País Tropical” era a combinação exótica de cores. Eram apenas 4 opções: As sólidas Bege Copacabana com faixas e rodas na cor “GM laranja bronze 76″(que na verdade é um marrom metálico acobreado) e interior monocromático marrom. Azul Clássico com rodas e faixas prateadas e interior preto e as metálicas Laranja Bronze 76 com rodas e faixas bege e mais rara de todas, Verde Ouro com rodas e faixas cinza metalico e interior preto. Não se sabe ao certo se estas combinações eram única pois existe um preto com rodas e faixas preateadas e fotos antigas de um na cor prata com rodas e faixas cinza escuro.
A cor mais vendida provavelmente foi a mesma do meu carro, bege copacabana afinal naquele ano, por incrível que pareça a cor bege era a cor da moda e considerada uma preferência nacional apesar de atualmente quase ninguém curtir. A segunda cor mais vendida provavelmente foi a marrom, seguida da azul e a verde, esta só Deus sabe pois ninguem nunca viu um “Tropical 76” verde, ou pelo menos não existe nenhum registro conhecido.
Agora vamos aos fatos mais peculiares. Eu tenho Chevette a 13 anos, sou chevetteiro “doente” e do tipo que vive buscando fotos, informações e relatos sobre Chevettes e seus parentes internacionais e levei quase 12 anos pra ver um legítimo “país tropical” ao vivo. Até meados de 2015 a grande maioria dos chevetteiros davam a ele o status de “extinto” até que um amigo meu de Chapecó, tão fanático quanto eu por Chevettes encontrou um marrom em SP, de único dono e o arrematou. Ficamos todos surpresos e animados com a descoberta afinal eles estavam desaparecidos. Apenas 3 meses depois surgiu outro anunciado, desta vez um bege copacabana. Eu tinha acabado de vender meu Chevette rosa pantera 1973 de placa preta para um colecionador de São Paulo.
Foto antiga resgatada na internet
Este Tropical 76 estava anunciado por um valor exorbitante e por isso não dei muita bola no início mas acompanhei por uns dias e vi que o anunciante estava baixando o valor semanalmente e após duas reduções de preço eu finalmente entrei em contato e fui até Pelotas – RS de ônibus pra ver a relíquia pessoalmente. Isso da 400 km de Bento Gonçalves aonde moro. O carro não tava lá estas coisas, tinha muito mais a fazer do que eu esperava, era de um senhor de 78 anos, muito simpático. Quem havia feito o anuncio e falado comigo foi a filha dele, Liliane.
O Chevette estava meio que abandonado na garagem, pois ele ja não dirigia mais devido a um problema de visão. Eventualmente ligavam e davam uma voltinha pra não atrofiar. Mesmo assim não me intimidei em voltar rodando os 400 km até em casa afinal sou chevetteiro a quase uma década e meia e nunca fiquei na mão. Enchi o tanque, verifiquei o nível e a cor do oleo, comprei um litro extra pra garantir, enchi uma garrafa pet de agua e peguei a estrada. Andei alguns km de boa, no máximo a 80km/h numa estrada quase sem curvas, quilometros de reta e estranhei um Focus novo atrás de mim por mais de 20 km sendo que ele podia me ultrapassar a qualquer momento pois era tudo linha reta.
Aí num trecho em obras , trânsito em meia pista, tivemos que parar, o motorista do Focus desceu do carro e veio até mim perguntar se era 76 e após eu confirmar ele disse que teve um igualzinho a 25 anos atrás. Eu disse que tinha acabado de comprar e ele elogiou e me desejou boa sorte e logo após me ultrapassou e sumiu. Começara ali a despertar a nostaligia em outros motoristas.
Primeiro test-drive antes de fechar o negócio
O Chevette tava uma coisa, 4 pneus velhos, dois deles recapados e quase lisos, vim morrendo de medo que algum deles estourassem pois era uma tarde muito quente de novembro, eu estava sozinho, sem carro de apoio e o ponteiro da temperatura marcava no máximo mas o nivel do óleo e da agua estava ok então deduzi que era um mal contato. Tudo isso vem acrescentar emoção pra apimentar a aventura, dar aquela adrenalina. Saí de Pelota as 15:30 da tarde e cheguei em Bento as 21h da noite parando somente para abastecer, lanchar e ir ao banheiro.
Despedida do Sr. Wilson Jeziorski do seu querido Chevette
Primeira parada da viagem para reabastecimento
Rodar 400km com um carro semi-novo é algo bem tranquilo mas acreditem, tirar um carro de 40 anos da garagem de um idoso, cheio de coisas por fazer, carro que estava parado a tempo e pegar a estrada sozinho, sem apoio e com pneus velhos, é uma aventura daquelas cheia de tensão e adrenalina aonde você precisa ter muita fé na máquina e na sua sorte. Nos próximos conto como foi lapidar este diamente até conquistar a placa preta.
Chegada em Bento Gonçalves/RS às 21h daquele mesmo dia
Por Gutto Morais, Project Cars #433