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Project Cars Project Cars #88

Project Cars #88: um quebra-cabeças carburado no Gol GTS de Marcos Amorim

Depois de contar como o GTS chegou até mim e como foi recuperado após uma capotagem, finalmente chegou a parte da preparação. Porém há um pequeno problema: de certa forma isso começou antes mesmo do acidente, então às vezes pode faltar um pouco de linearidade na narrativa. Apesar de que antes a idéia fosse deixá-lo completamente original, a própria Volkswagen acabou forçando algumas modificações que serviram como base para uma primeira fase da preparação.

 

Carburação e sistema de alimentação

Em 1994 os modelos que originalmente saíam com o bom e velho (e limitado) carburador Brosol 2E7 passaram a ser equipados com o 2ECE, o famoso e igualmente odiado carburador eletrônico. Esse modelo, em teoria, deveria unir o melhor dos dois mundos, com a facilidade de manutenção de um carburador e o funcionamento liso de uma injeção.

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Porém o que acontecia na prática era exatamente o contrário. Com um afogador controlado pela temperatura do líquido de arrefecimento, rotação de marcha lenta, fechamento da borboleta, fluxo de combustível e até cut-off (sim, um carburador com cut-off) gerenciados por uma pequena central atrás do painel, seu funcionamento costumava ser irregular e acelerado, por mais limpo que fosse e utilizando combustível de boa qualidade. Quando novos realmente eram só elogios, mas hoje é difícil encontrar um carro que ainda seja equipado com ele.

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O meu caso não foi diferente. A lenta, mesmo com o motor aquecido, costumava ficar em mais de 3.000 rpm e só baixava para algo mais aceitável após mais de um minuto funcionando dessa forma. Tenho a impressão que o cut-off nunca funcionou, porque qualquer alívio do acelerador resultava em uma bela acelerada assim que se pisava na embreagem (vai ver eu tinha um punta-tacco automático e não sabia).

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Também era nítido que em aceleradas mais fortes ele ficava amarrado, porém não era possível saber se era algo relacionado ao gerenciamento eletrônico ou a uma escolha bem econômica de giclês e canetas. O único elogio vai para o acionamento do segundo estágio, que era a vácuo, que sempre funcionou e alterava nitidamente o desempenho – fora o assovio característico da linha 2E e 3E. Graças a tudo isso, acabei seguindo os conselhos de quase todo mundo e resolvi colocar um 2E7 novo nele, apesar de que na época já pensava em alguma coisa maior ou com pelo menos mais recursos.

O 2E7 é um velho conhecido dos preparadores brasileiros. Praticamente todos têm uma receita de bolo para ele (giclês 145 e 180 com canetas X100 e X110 é clássica em acertos para turbo, quase nunca funcionando direito) e até hoje é usado na arrancada, principalmente na DT-C.

O grande problema é que ele é famoso por ter um ótimo funcionamento quando pressurizado, mas é muito pequeno e extremamente limitado em termos de recursos para acerto. Venturis, giclês, nível de cuba, acesso aos componentes, tudo colabora para complicar um acerto fino de preparação aspirada, e até mesmo nos turbos. Esses são alguns dos motivos que fazem com que os modelos que hoje alimentam os motores no quarto de milha sejam tão alterados que basicamente o que sobra é apenas o corpo e a tampa. Para aspirados existem muitas opções melhores, como o Miniprogressivo (Weber 450), mas como a idéia de manter certa originalidade ainda estava na minha cabeça, fui para o lado dos GTS mais antigos e do GT.

Carburador montado no antigo coletor – que possui aquecimento e os “espinhos” na base para melhorar o funcionamento – lá fomos para a calibragem. Naquela época, sabendo menos ainda que hoje, não liguei muito para os tamanhos dos venturis, acreditei que era o modelo certo fornecido pela Brosol. Acontece que uma das melhores formas de descobrir se o carburador é do modelo certo, fora o código, é verificar o tamanho dos venturis, que variam de acordo com o combustível e até mesmo o ano, dependendo do modelo. Mas não o fiz e depois fui ver o código, que indicava um 2E2 alemão dos anos 70. Que beleza…

De qualquer forma, o tamanho era o mesmo, e por mais que os circuitos e calibres internos pudessem ter alguma diferença, ele daria acerto. Começamos pelo óbvio: tabela da Brosol para o carro e o ano. Ficou bastante econômico, só não funcionava tão bem em dias frios pela manhã, mas em alta era fácil perceber que amarrava, assim como em aceleração constante acima de determinada velocidade. Pelo menos já tinha lenta novamente e o motor respondia aos comandos do acelerador.

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A parte de alta representava um problema com duas causas prováveis, olhando de forma mais simplista. Poderia ser os giclês de combustível que estavam pequenos ou as canetas que estavam empobrecendo a mistura em alta. Grosso modo, para quem não está familiarizado com carburadores, o giclê de combustível tem muita influência na parte de alta, da mesma forma que as canetas (tubos emulsificadores) são responsáveis por fazer a progressão da mistura ao longo de toda a faixa de operação através dos furos e diâmetro do seu corpo (lembrando, explicação extremamente simplista essa, há muito mais variáveis nisso).

No 2E não tem muito para onde fugir, há algumas canetas disponíveis para certa configuração e que o retrabalho não traz grandes ganhos, então o jeito foi trocar os giclês. E é bom lembrar que ele tem dois estágios que atuam em conjunto e de forma seqüencial, por isso o mexer apenas no segundo pode até melhorar o desempenho, mas aumentará o buraco existente no funcionamento entre eles. Há formas de resolver isso, como a adoção de econostatos (tubos colocados dentro da cuba que atravessam a tampa e jogam combustível dentro dos corpos), mas é algo que particularmente não gosto, especialmente por ter que furar a tampa do carburador.

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No fim, na parte desse carburador, foi apenas trocado os giclês de combustível por outros um pouco maiores. Não lembro os calibres agora, afinal lá se vão uns sete anos, mas apenas isso melhorou o desempenho. Não virou um foguete, nem ao menos recuperou a potência perdida em relação ao modelo movido a álcool, mas a irritante amarrada em alta diminuiu sem comprometer o consumo. Outras coisas bem comuns poderiam ter sido feitas, como passar uma broca de 8 mm no difusor do segundo estágio, mas achei melhor deixar como estava. Na verdade até cheguei a comprar um difusor maior que nunca instalei, está guardado até hoje.

Ainda sobre coisas simples, no caso dos AP carburados, muito se fala sobre aumentar o avanço inicial para o máximo possível antes do motor grilar para obter um ganho de até 8 cv. Sim, esse ganho até é possível e o carro realmente fica muito esperto em baixa, porém em giros altos não rende tão bem. O motivo é simples: apenas girar o distribuidor não altera curva de avanço, que continua sendo ditada pelos contrapesos, cápsula de vácuo e batentes.

Cheguei a rodar com um mundo de avanço ainda nessa época, mas o que ganhava em baixa não compensava em alta, o que me fez pensar em montar um distribuidor parecido com o aquele que os Voyage do Brasileiro Marcas e Pilotos usavam — eles tinham um avanço bem limitado, mas por motivos diversos acabei não fazendo até hoje.

 

A suspensão

Se agora em acelerações e retomadas o desempenho já era mais ou menos condizente com a época do GTS, ficando um pouco menos distante do modelo a álcool, o mesmo não se podia dizer da suspensão. A frente oscilava bastante em ondulações, parecendo que os amortecedores estavam com pouca carga, fora que em algumas situações era fácil perceber que as buchas já estavam gastas também. Sendo assim, melhor procurar uns Cofap originais do GTS e buchas originais Volkswagen, compradas em concessionária.

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Essa nova suspensão, nos padrões originais, se mostrou muito boa e resistente… por quatro meses! Depois disso as oscilações voltaram e ele se tornou um destruidor de buchas, inclusive do agregado. Não forçava tanto na rua a ponto de chegar nesse resultado, da mesma forma outros Gol que conhecia ficavam anos com componentes originais sem apresentar maiores problemas, apenas o desgaste natural (naturalmente rápido…), então não conseguia achar uma explicação para isso. Nessa época o monobloco ainda estava praticamente intacto e eu não me achava tão cupim a ponto de conseguir destruir suspensões em tão pouco tempo.

Fiquei andando assim algum tempo, não estava ruim, apenas tinha um desgaste rápido e era nítido que as oscilações aumentavam (o que fez com que as buchas fossem trocadas outra vez). Andando normalmente não tinha problemas, mas em uma tocada mais esportiva incomodava, não a ponto de atrapalhar, mas incomodava.

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Depois veio o mundo de ponta cabeça. Remontei toda a suspensão nos padrões originais, com peças novas, mas tudo continuou da mesma forma. Manter essa linha parecia que não ia certo, então o jeito foi partir para algo voltado ao alto desempenho e que era menos confortável, além de, teoricamente, provocar um maior desgaste de outros componentes. Então amortecedores e molas, além das buchas dianteiras, foram trocadas por outros, que se mostraram realmente mais resistentes e com uma pequena perda de conforto, porém nada comparado com o que é alardeado por aí. Mas esta é uma história para o próximo post. Até lá!

Por Marcos Amorim, Project Cars #88

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