A Alfa Romeo é mesmo uma fabricante de diversas faces – e todas elas verdadeiramente entusiastas… ou quase. Isto porque, na década de 1960, a Alfa Romeo decidiu recorrer aos franceses da Renault para oferecer um carro popular na Itália. E eles optaram por vender o pequeno Dauphine – sim, o carro que tinha fama de “desmanchar sem bater”, com a marca Alfa Romeo. E como você notou, ele não tinha um coeur sportif.
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O acordo foi firmado em 1958. Até então, o carro mais barato da Alfa Romeo era o charmoso Giulietta, vendido em diversas opções de carroceria e sempre com o motor Twin Cam de 1,3 litro, cuja potência variava de acordo com a taxa de compressão e os carburadores escolhidos. O modelo mais em conta era a Giulietta Berlina, com carroceria de quatro portas, carburador de corpo simples, taxa de compressão de 7,5:1 e 53 cv. Era possível, porém, comprar uma Giulietta cupê fastback, a Sprint Veloce Speciale, que usava dois carburadores de corpo duplo e, com taxa de compressão de 9,7:1, chegava aos 100 cv.
A Giulietta Speciale era, em essência, a prova de que mesmo o mais barato dos Alfa era ainda sofisticado demais para ser um carro de entrada. A Alfa Romeo precisava de um automóvel simples de verdade para ocupar esse segmento. E, na década de 1960, dificilmente podia-se ser mais simples que o Renault Dauphine sem apelar para o VW Fusca ou o Citroën 2CV, por exemplo.
Talvez você esteja se perguntando por que a Alfa Romeo não recorreu aos conterrâneos da Fiat para um badge engineering com o Fiat 500, que havia sido lançado pouco tempo antes, em 1957. Isto talvez se deva a duas coisas: primeiro, a Fiat e a Alfa Romeo ainda não eram tão ligadas àquela altura. Segundo, a Alfa Romeo estava interessada em explorar o mercado francês, e um acordo com a Renault parecia a solução perfeita.
A Alfa Romeo entraria com a fabricação e comercialização do Dauphine na Itália, com peças enviadas da França para a fábrica em Milão, e a Renault ficaria encarregada de vender os Alfa Romeo na França. Todo mundo saía ganhando.
A fabricação do Dauphine Alfa Romeo começou em junho de 1959, em uma linha de montagem dedicada na fábrica de Milão, inaugurada pelo próprio presidente da Renault na época, Pierre Dreyfus. A única diferença visível entre um exemplar Alfa Romeo e um Renault eram os emblemas, mas também havia um sistema elétrico de 12 volts fornecido pela Magneti-Marelli – o Dauphine francês tinha elétrica de 6 volts.
O carro evoluiu de forma muito semelhante ao que ocorreu no Brasil – primeiro, o carro era equipado com um motor Ventoux de 845 cm³ e 26 cv líquidos (ou 31 cv brutos), adotando já em 1960 uma versão mais potente do mesmo motor, com comando de válvulas mais bravo, maior taxa de compressão e escape menos restritivo – chegando assim aos 32 cv (ou 40 cv brutos). O motor mais forte era acompanhado de uma nova caixa de quatro marchas, pois antes eram três – uma forma de explorar melhor o rendimento do motor.
Ainda em 1960, no mês de outubro, foi lançada a versão Ondine Alfa Romeo, que tinha a mesma mecânica, porém acabamento mais luxuoso – até onde era possível para um carro de entrada. Na prática, isto resumia-se a tecido cotelê nos bancos e portas e detalhes no volante que combinavam com o revestimento.
O Dauphine Alfa Romeo fez relativo sucesso na Itália – só no ano de estreia foram vendidos 6.452 exemplares, número que saltou para 20.047 carros no ano seguinte. A partir daí, porém, as vendas começaram a diminuir novamente – 19.297 carros em 1962, 6.347 carros em 1963, 6.447 carros em 1964 (ano em que foram adotados freios a disco) e 3.120 carros em 1965. No último ano de produção do Dauphine italiano, apenas 345 unidades foram vendidas.
No total, 73.841 unidades do Dauphine Alfa Romeo (contando a versão Ondine) foram vendidas, desempenho semelhante ao que ocorreu no Brasil, onde 74.627 exemplares foram emplacados entre 1959 e 1967.
Depois do Dauphine, a Alfa Romeo decidiu concentrar-se em sua linha intermediária, composta pela família Giulia – mesmo o Giulietta foi descontinuado. A Alfa só tornou a ter um carro popular em 1971, quando foi lançado o primeiro Alfasud, que desta vez era um projeto da própria Alfa Romeo, e bem mais moderno: um hatchback com motor e tração na dianteira, primeiro modelo da marca com esta configuração mecânica.
O Alfasud veio a ser um dos automóveis mais bem sucedidos da Alfa Romeo, com mais de 890.000 unidades vendidas entre 1971 e 1983.