Feliz ano novo, prezados FlatOuters! Como sempre, a virada de ano também traz uma série de carros antigos que podem ser importados para o Brasil por completarem 30 anos. Até 2020 nossa lista trazia os carros que “finalmente” poderiam ser trazidos ao Brasil, porque tivemos importações fechadas entre 1976 e 1990, o que deixou muita coisa legal fora do nosso mercado.
A partir de 2020, a lista passou a trazer carros que não foram importados oficialmente quando ainda em produção — o Lamborghini Diablo foi um deles. Já era possível trazê-lo novo, mas pouquíssimas unidades rodavam por aqui. Desta vez — e daqui por diante —, a lista será um tanto diferente. Isso, porque os carros que completam 30 anos neste ano, foram produzidos em 1994. E 1994, além de já ter importações liberadas, foi o ano em que surgiu o Plano Real, que começou a controlar a inflação e teve um regime cambial fixo deslizante nos primeiros anos.
Isso significa que o governo controlava a valorização da nova moeda frente ao dólar como uma das medidas para impedir o aumento da inflação. Com isso, o Real foi “artificialmente” pareado ao Dólar — quem viveu a época lembra das cotações do Dólar comercial inferiores a R$ 1 — o que resultou em uma verdadeira explosão de importados no Brasil.
Supermercados traziam todo tipo de bebidas — de whiskies a refrigerantes, chás e sucos. Biscoitos, bonés, tênis, jaquetas, video-cassettes, tocadores de CD, televisores, computadores… tudo podia ser importado. Tudo ficou mais acessível por um breve momento. Os carros, inclusive.
Eu mesmo morava em uma cidade onde os BMW E36 eram populares como hoje são os Jeep Compass. Em 1995 vi uma Ferrari pela primeira vez e os Porsche se tornaram uma visão menos rara nas maiores capitais como São Paulo ou Rio de Janeiro. Veja a quantidade de Jeep Grand Cherokee ZJ a venda nos sites de carros usados e você terá uma dimensão do que foram aqueles primeiros anos do Plano Real.
E mesmo para a classe média, era possível comprar um importado. Os mais baratos eram os modelos da Lada e da Asia Motors, que foram razoavelmente bem-sucedidos por aqui. Mas pense que absolutamente todo Honda vendido no Brasil entre 1993 e 1996 era importado. E não foram poucos. Os Toyota também: o Corolla só foi nacionalizado em 1998. Faça o mesmo exercício do Jeep Grand Cherokee: procure os modelos Peugeot, Citroën, Renault Toyota, Honda e Subaru de 1990 a 1998 e você terá o panorama do sucesso dos importados.
Mas não são estes os carros que nos interessam, evidentemente. O que queremos aqui são os carros que não foram vendidos oficialmente ou que tiveram pouquíssimas unidades importadas na época. Mas ainda há um outro ponto importante neste novo cenário de clássicos dos anos 1990: o pareamento de preços com o mercado global.
Quando você não pode importar um produto, seu preço será definido pela oferta local. Um exemplo é o Audi RS2, que nunca foi vendido nos EUA quando novo e só pôde ser importado a partir de 2019, quando completou 25 anos. Mas imagine que alguém tivesse conseguido colocar um deles nos EUA em 1994 — um diretor da Audi, por exemplo. Qual seria o valor do carro? Você não pode importar e ele não é mais vendido novo. Para ter um desse, era preciso esperar 25 anos ou pagar o preço cobrado pelo único exemplar disponível no mercado interno.
Quando o mercado volta a se abrir, o que acontece nos EUA depois de 25 anos e, no Brasil, depois de 30 anos, o valor dos carros no país passa a acompanhar o valor do mercado internacional. Porque agora você tem a opção de importar o carro, se não quiser aquele que o sujeito tem aqui dentro. Isso ajuda a reduzir o preço de carros que ficaram extremamente raros pelo baixo volume de importação. Um Lamborghini Diablo custava o que o dono pedisse por ele até 2020. Depois disso, seu preço interno passou a ser “limitado” pelo custo do carro no mercado internacional, mais despesas de importação.
Por outro lado, a aproximação dos 25-30 anos também acaba valorizando outros modelos que, até então, eram pouco valorizados. Vimos isso acontecer com o Audi RS2 no Brasil há cerca de cinco anos. De repente, os preços da perua Audi-Porsche começaram uma escalada que já os colocou acima dos R$ 500.000. Quem causou isso foi a possibilidade de importação para o mercado norte-americano, onde os carros usados podem ser importados com 15 anos no Canadá e 25 anos nos EUA.
A possibilidade de exportação dos carros para estes países acabou elevando os preços do modelo em todos os países onde ele foi vendido — tanto na Europa, quanto no Brasil, Nova Zelândia, Hong Kong e África do Sul.
A lista deste ano, portanto, também indica os carros que passaram ou devem passar por este processo de valorização. o Audi RS2 é um deles.
Audi RS2
Lançado em 1994, ele foi oferecido no Brasil logo na época — a família Senna representava a marca por aqui e trouxe, segundo algumas fontes, 82 unidades das quais apenas 62 foram vendidas. Em seu ponto máximo de desvalorização ele jamais baixou de R$ 70.000 (algo na faixa dos R$ 150.000 atualmente), mas hoje você precisa desembolsar, em média, US$ 75.000 mais impostos se quiser um destes em bom estado. Na prática estamos falando de valores entre R$ 650.000 e R$ 800.000, considerando o preço do frete, desembaraço aduaneiro, impostos e licenciamento.
Contudo, alguns exemplares já no Brasil trocam de mãos por menos de R$ 650.000. Até quando? Difícil dizer. Clássicos têm altos e baixos dependendo da época — hoje os carros pré-guerra, por exemplo, estão estagnados em preços, até desvalorizando devido à redução do interesse por eles, enquanto os carros dos anos 1990 e 2000 estão em alta. Ao mesmo tempo, um eventual aquecimento da economia pode aumentar a demanda pelo modelo, fazendo o preço subir.
Clio Williams 2
Em 1994 a Renault já estava no Brasil, havia dois anos. Ainda não era a operação da própria fabricante por aqui, mas uma representação oficial feita pela CAOA (sim, a mesma da Subaru, Hyundai e Chery). Por alguma razão, eles trouxeram o Renault Twingo e o Renault 19 como modelo compacto é médio, mas não o Renault Clio — que só apareceu por aqui em 1997.
Por isso, ficamos sem o Clio Williams 2, que foi lançado em 1994 para atender a demanda pelo Clio Williams original, de 1993, que teve apenas 3.800 exemplares. Sabe quem teve esse carro? Os argentinos. Pois é… eles sempre ficam com o que há de mais legal.
A receita do carro era parecida com a do Sandero RS, criado 25 anos mais tarde. Por baixo da carroceria de hatch compacto, estava um 2.0 aspirado com comando duplo e 16 válvulas, produzindo 147 cv a 6.100 rpm e 17,8 kgfm a 4.500 rpm. Isso, claro, combinado à suspensão recalibrada, voltada à condução esportiva e à otimização dinâmica por meio de novos braços triangulares e bitolas mais largas, além de suspensão mais firme. O câmbio manual era de cinco marchas, mas com escalonamento próprio e as rodas eram da Speedline, com 16 polegadas de diâmetro e tala de 7,25 pol.
Como ele nunca veio ao Brasil, mesmo estando na Argentina, ele não poderia ser importado antes de completar 30 anos, o que acabou de acontecer. O problema é que os 30 anos foram suficientes para que o Clio Williams se tornasse um clássico valorizado na Argentina e na Europa. Aqui ao lado, quando se encontra, ele custa entre US$ 25.000 e US$ 45.000, dependendo do estado de conservação. É caro? Sem dúvidas — não espere que ele chegue por menos de R$ 250.000 com todo o processo de importação realizado corretamente.
Mas… ainda pode ser mais barato que trazer um da Europa, onde ele custa entre 20.000 e 30.000 euros (entre US$ 22.000 e US$ 33.000), mas tem frete mais caro e, como o frete é incluído no cálculo dos impostos cobrados na importação… é melhor negociar na Argentina mesmo.
Subaru WRX STi
Outro carro mundano que pode ser trazido a partir deste ano é o primeiro Subaru WRX STi. Produzido a partir de fevereiro de 1994, ele ainda era feito à moda antiga, usando um WRX como base para as modificações da Subaru Tecnica International na própria sede da divisão esportiva a um ritmo de 100 exemplares mensais.
Por isso, há apenas 1.100 exemplares produzidos em 1994, o que limita a oferta para trazê-lo ao Brasil. A conta inclui os modelos Type RA, com motor de 275 cv em vez de 250 cv, com o diferencial central eletromecânico DCCD e com intercooler ar-água.
É claro que um desse não sairá barato, mas também não é algo insanamente caro como o Clio Williams. A maioria dos STi de primeira geração é vendido por cerca de US$ 15.000, o que significa que um deste deve chegar aqui pelo preço de um Corolla novo.
McLaren F1
Talvez tenha sido o timing, mas o McLaren F1 nunca foi vendido no Brasil, nem trazido por um brasileiro. Nelson Piquet pilotou um em Le Mans. Maurizio Sandro Sala pilotou outro também. E os carros chegaram a acelerar nos autódromos brasileiros, mas nenhum ficou por aqui.
Por que o “bad timing”? Porque o McLaren F1 foi apresentado em 1992, em produção limitada. Os exemplares foram vendidos logo ali. Sabe-se lá por que, Ayrton Senna nunca foi envolvido com o carro — que teve o projeto muito segregado da equipe de Fórmula 1. Em 1992 o Brasil ainda enfrentava hiperinflação, instabilidade econômica e política. As importações já estavam liberadas, mas não acho que alguém estivesse disposto a pagar tanto dinheiro por um carro da equipe do Senna.
Apesar de ter completado 30 anos em 2022, o primeiro modelo de produção do McLaren F1 ficou pronto somente no final de 1993, por isso, a maioria dos McLaren F1 são 1994 e 1995 — nos anos seguintes foram feitas as variações, como o LM e o GT. E por isso, se você quiser importar um McLaren F1, somente agora isso será realmente possível.
O problema é que o F1 valorizou nada menos que 1.000% entre 2008 e 2023. Vinte anos atrás um exemplar bem-cuidado do esportivo não custava mais de US$ 800.000, mas o potencial de valorização futura acabou inflacionando o modelo que, hoje, não troca de mãos por menos de US$ 15.000.000.
A escalada foi rápida: em 2008 eles já custavam cerca de US$ 2.000.000. Em 2014, eles já valiam mais de US$ 6.000.000. Não deixe os zeros te enganarem: estamos falando de mais que o triplo do valor original em apenas seis anos. Em 2015, o McLaren do Mr. Bean, Rowan Atkison, batido duas vezes, foi vendido por mais de US$ 10.000.000. E em 2017 o chassi 044 foi arrematado por mais de US$ 15.000.000 — supostamente por Lewis Hamilton, que teria gostado do número do chassi.
Portanto, neste 2024 você pode importar um McLaren F1. O problema será, além de encontrar um a venda, bancar o valor dele em reais. Se você encontrar um desses por US$ 15.000.000, ele não chegará ao Brasil por menos de R$ 150.000.000 — US$ 30.000.000, o dobro do carro original. Quem pode gastar tudo isso, simplesmente compra um destes na Europa e o mantém por lá. E ainda sobra um trocado para comprar outro igual.