A cultura automotiva japonesa é tão diversificada que, para conhecer tudo, só mesmo indo até lá e passando uma temporada pelos encontros de entusiastas, eventos e oficinas. Só tem um problema: o Japão não é logo ali. Para nossa sorte, existem programas como o especial Retro Car Kings, do Discovery Japan, que se aprofunda como poucos neste universo tão rico.
Os personagens são cinco restauradores e customizadores de carros clássicos em oficinas do Japão, cada um com seu estilo e filosofia. Contudo, todos trazem uma coisa em comum: fazem seu trabalho com paixão e capricho.
O especial foi exibido em 2012, exclusivamente no Japão — eles parecem querer guardar as preciosidades todas para eles — mas, graças à internet, hoje todo o mundo ocidental pode vislumbrar as maravilhas da car culture japonesa. E é isso o que você vai fazer agora!
“A cena japonesa de clássicos é dividida entre os que amam a velha forma original e os que estão adotando novas tecnologias e estilos, e criando um novo tipo de cultura automotiva”, diz o editor da revista japonesa Motorhead, Ko-Hei Takada, logo no início do programa. E é com este espírito que você precisa assisti-lo, sabendo que duas vertentes que, em teoria, não deveriam se entender, convivem em encontros, autódromos e nas ruas.
A primeira oficina apresentada, a T.A. Auto, por exemplo, é especializada em restaurações totalmente artesanais. Tadashi Ando, o dono, restaura carros que a maioria de nós chamaria de “lixo” — usando quase exclusivamente peças de ferro-velho, que são retrabalhadas à mão, no martelo.
Ando é reconhecido pelos seus 240Z restaurados. Um deles, que estava totalmente apodrecido, levou dois anos para poder rodar, e mais vários meses para ficar parecendo novo. Ele diz que há muitos meios mais rápidos de restaurar carros sem ter tanto trabalho, porém diz que “restaurar carros que parecem lixo e normalmente seriam destruídos, fazendo-os parecer novos, é algo que me satisfaz e satisfaz meus clientes. Fãs de clássicos apreciam muito mais este tipo de trabalho”.
Além da T.A. Auto, outras quatro oficinas foram visitadas pela equipe do Retro Car Kings, que inclui Dino Dalle Carbonare, do Speedhunters, e cada uma delas tem uma abordagem diferente sobre a mesma paixão. Yoshiya Watanabe, da Rocky Auto, também restaura carros clássicos da Nissan, como o 240Z mas modifica tudo o que pode para equilibrar a aparência clássica com toques modernos, e dar aos carros um padrão próximo ao atual de desempenho e conforto. Isto inclui rodas e freios maiores, pneus novos, suspensão preparada e engine swaps — algo que Ando, da T.A. Auto, repudia.
Depois destes dois, o programa corta para uma oficina escura, cheia de peças empilhadas e penduradas na parede, uma jukebox, máquinas caça níqueis e um japonês de meia idade todo descabelado e sujo fumando um cigarro. Sim, você conhece este cara — Akira Nakai, o mago da Rauh-Welt Begriff, ou simplesmente RWB, que não restaura clássicos japoneses e certamente não liga se o motor de um Skyline é original ou não. Ele, como sempre, afirma que seu estilo é único e que gosta de fazer tudo do seu jeito — criando os inconfundíveis Porsche 911 com pneus extremanente largos, abundância de spoilers e outros apêndices aerodinâmicos, cores berrantes e motores preparados que tanto os fãs do stance quanto a galera da pista não sabem se amam ou odeiam — em qualquer um dos casos, é impossível passar incólume a Akira Nakai e a seu trabalho.
A Moon Auto, de Masayuki Seino, cria carros novos usando componentes de dois ou mais modelos já existentes. Um deles usa como inspiração a carroceria de um Mercedes clássico de corrida, o W196R — monoposto que já foi pilotado por ninguém menos que Juan Manuel Fangio — e a estrutura de um Corvette para criar um esportivo único, com visual clássico e recursos modernos como ar-condicionado (que pode ser escondido para não macular o minimalismo da cabine) e direção assistida e fosse fácil de guiar.
Já a Officina Ishikawa, fundada por Toru Ishikawa, leva a filosofia de “tudo original” a extremos, restaurando até mesmo carros das décadas de 20 e 30, em um trabalho impressionante. O Lagonda 1937 mostrado aqui, por exemplo, demorou 17 anos para ter todas as peças necessárias reunidas por seu dono, que esperou mais 3 anos até que Toru Ishikawa fizesse sua mágica. Espetacular.
Nestes 43 minutos de vídeo, podemos ter uma noção maior de como os japoneses dão valor aos clássicos — mesmo que este valor se manifeste de maneiras diferentes. E, no fim das contas, todos conseguem, cada um a seu modo, atrair a atenção de entusiastas do mundo inteiro.
Nenhum relato de quem esteve lá no Japão por algum tempo, mas não vive diariamente a cultura automotiva do país, poderá bater os depoimentos de quem ganha a vida restaurando e modificando clássicos na Terra do Sol Nascente.
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