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Trânsito & Infraestrutura Zero a 300

São Paulo terá fiscalização por velocidade média – mas não irá multar ninguém

Apesar da redução gradual do número de acidentes fatais na cidade de São Paulo desde 2011, a prefeitura decidiu reduzir os limites de velocidade e atribuir a isto a queda no número de mortes. Em 2016 o número voltou a cair e, em 2017, o relatório preliminar diz que os números continuam em queda, apesar do aumento dos limites nas marginais. Mas assim mesmo a prefeitura decidiu instalar um sistema de fiscalização por velocidade média. A intenção é coibir os motoristas que freiam apenas nos radares, e depois voltam a acelerar.

O sistema já foi testado em São Paulo em 2012, mas como a legislação brasileira não permite este tipo de fiscalização, ele foi desativado. Na ocasião, foi feito um estudo que revelou que a cada motorista multado por excesso de velocidade, outros sete motoristas também poderiam ser multados.

Desta vez, a Companhia de Engenharia de Tráfego fará um estudo acompanhado de uma campanha de conscientização. Os radares já instalados, equipados com leitores de placas, serão atualizados para medir o tempo levado pelo carro entre dois pontos. Se ele for inferior ao tempo mínimo necessário para percorrer a distância entre os dois medidores na velocidade máxima permitida, o carro será fotografado e o infrator notificado.

De acordo com a CET, a instalação será permanente, bem como as notificações, ainda que elas tenham somente valor educativo. Contudo, já tramitam no Congresso Nacional alguns projetos que visam liberar este tipo de fiscalização, e São Paulo vem sendo uma vitrine (de Overton) de medidas de controle e fiscalização de trânsito desde o início desta década.

 

Prós e contras

A fiscalização por velocidade média já é utilizada em países como o Reino Unido, na Austrália, Itália, França, Holanda, Bélgica, Polônia e Áustria, e ajuda a resolver o problema dos motoristas que abusam do acelerador e freiam apenas nos radares para depois retomar a aceleração. Isso, claro, se for levado em consideração fatores como a velocidade operacional da via e elementos que condicionem os motoristas a reduzir a velocidade naturalmente, evitando uma geração de multas devido a limites artificialmente baixos (algo que comentamos por aqui).

Na África do Sul as autoridades dizem que o número de multas foi reduzido e o comportamento dos motoristas mudou positivamente

Contudo, o sistema também seu pontos negativos. Como por exemplo a incapacidade de ler as placas traseiras, o que significa que as motos não serão fiscalizadas — e como sabemos, os motociclistas são as principais vítimas dos acidentes fatais nas vias onde a CET irá adotar o sistema, a Marginal Tietê e as avenidas 23 de Maio e Bandeirantes.

Outro ponto negativo observado pelos países que adotaram o sistema de fiscalização por velocidade média é que os motoristas não transferem seu comportamento defensivo para áreas onde a fiscalização não mede a velocidade média, e voltam a acelerar onde não estão sendo observados. É um efeito parecido com o que se vê após um engarrafamento: para compensar o “tempo perdido” na zona fiscalizada, eles excedem os limites nas zonas não fiscalizadas, transferindo o risco para outro local.

Além disso, o Brasil faz perícias de acidentes fatais, porém os dados não geram estatísticas. É feita a perícia sem conclusão de culpa ou causas, e quem define o que aconteceu são os juízes, promotores, delegados, procuradores e advogados em um julgamento. O último relatório estatístico baseado nas investigações de acidentes fatais foi feito pela CET, por amostragem de 1.000 acidentes fatais, no distante ano de 2011. Deste então, não há um banco de dados público com os motivos exatos que causaram os acidentes fatais na capital paulista — ou em qualquer outro. É por isso que algumas instituições dizem que 90% são causados por falha humana, enquanto outras dizem que 90% são causados por imprudência. Conceitos vagos que não apontam exatamente onde devemos melhorar. O resultado são soluções genéricas, que punem infratores de ocasião e deixam impunes os motoristas com comportamento de risco.

O estudo dos acidentes é uma das recomendações da ONU em seu programa da Década de Ação para a Segurança Viária, bem como o aprimoramento do socorro aos acidentes,  a adequação (veja bem: adequação, não apenas redução ou aumento) dos limites de velocidade, a otimização das vias e a aplicação de soluções de engenharia de tráfego. Você viu alguma coisa por aí?