O segmento dos sedãs médios não é exatamente o mais descolado. Embora isto não seja regra, um sedã médio geralmente é visto pelos entusiastas como um carro sensato, prático e talvez até genérico. Um carro perfeito para um pai de família que quer um carro prático e razoavelmente potente para o dia-a-dia, mas não abre mão de um bom porta-malas e de um rodar confortável para longas viagens. Beleza é importante, mas não fundamental. E a esportividade, quando presente, costuma se manifestar através de alguma versão especial de visual mais agressivo – e raramente mais do que isto.
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Uma exceção a esta regra é o Honda Civic Si, que marcou época por aqui na oitava geração do sedã, em 2007. Fabricado no Brasil, e considerado um dos melhores esportivos nacionais já feitos, ele tinha no motor K20 seu maior trunfo: o quatro-cilindros de dois litros com comando duplo no cabeçote, comando variável i-VTEC e 192 cv era capaz de levá-lo de zero a 100 km/h em 7,9 segundos. E ainda tinha (tem, na verdade) imenso potencial de preparação.
Mas nem todo sedã médio vendido no Brasil teve uma carta na manga de alto nível, como o Civic, para melhorar sua imagem aos olhos dos entusiastas. O pobre Nissan Sentra, por exemplo: ele começou a ser importado para o Brasil em sua quinta geração em 2004, e a sexta geração foi lançada por aqui em 2007. Nenhuma das duas conseguiu chegar à liderança do mercado – embora, especialmente na sexta geração, fosse um carro competente, bem acabado e bem equipado. Enfim, um bom sedã médio. Um dos motivos? O estigma de “carro de tiozão” – que foi agravado por uma propaganda na TV que brincava justamente com esta imagem. Você deve lembrar.
A geração atual também não vende muito. Em 2018 ela emplacou apenas 4.423 unidades ao longo do ano inteiro, ficando na quarta posição em seu segmento. O Toyota Corolla, líder do segmento, teve 59.065 exemplares vendidos no ano passado. O Honda Civic foi o segundo colocado, com 25.945 unidades, e o Chevrolet Cruze, com 19.831 unidades, foi o terceiro.
Será que poderia ter sido diferente? Talvez, se a Nissan tivesse se dado o trabalho de colocar no mercado brasileiro um rival para o Civic Si. É uma suposição, claro – mas este carro existiu, lá fora: o Nissan Sentra SE-R, que foi fabricado entre 2001 e 2011.
A quinta geração do Nissan Sentra estreou em 2000, trazendo um projeto mais refinado e um aumento de dimensões em relação ao modelo antigo – nos EUA, na Europa e no Japão, ele deixou de ser um subcompacto e passou a ser um compacto. No Brasil, ele já era considerado um sedã médio. Por aqui, ele era oferecido com um quatro-cilindros de 1,8 litro com comando duplo no cabeçote, quatro válvulas por cilindro e 115 cv, com 15,8 mkgf de torque e câmbio automático de quatro marchas.
No fim de 2001, para o ano-modelo 2002, a Nissan decidiu dar um pouco mais de pimenta ao Sentra de quinta geração, e lançou o Sentra SE-R Spec V.
No lugar do motor 1.8, um quatro-cilindros de 2,5 litros (2.488 cm³) chamado QR25DE, originalmente utilizado na Nissan Frontier e no Nissan Altima da época. Com um aumento na taxa de compressão de 9,5:1 para 10,5:1, ele entregava 177 cv a 6.000 rpm e 24,9 mkgf de torque a 4.000 rpm – no Altima e na Frontier, eram 154 cv e 24,1 mkgf de torque. O motor era acoplado a uma caixa manual de seis marchas, que levava a força do motor para as rodas dianteiras através de um diferencial autoblocante.
“Spec V” era uma referência ao Nissan Skyline GT-R, e o desenho do para-choque dianteiro era de fato inspirado pelo icônico cupê esportivo. Havia saias laterais maiores, faróis com máscara negra e um spoiler traseiro funcional. E também foram executadas modificações na suspensão: molas e amortecedores mais firmes, buchas de poliuretano e uma strut brace entre as torres dianteiras.
As rodas eram de 17 polegadas, com pneus de perfil baixo, e eram oferecidos como opcionais freios ABS nas quatro rodas e pinças Brembo de quatro pistões. O interior trazia bancos que também eram inspirados pelo Skyline GT-R e um volante revestido em couro com aro mais grosso, garantindo uma pegada mais esportiva.
Capaz de ir de zero a 100 km/h em 7,1 segundos, o primeiro Sentra SE-R Spec V tinha desempenho mais do que decente para um sedã médio esportivo. Mas ele não pode ser encontrado no Brasil – ao contrário da segunda geração, lançada em 2007.
O segundo Sentra SE-R Spec V mantinha o motor de 2,5 litros QR25DE, porém com diversas modificações: um novo coletor de admissão, comando de válvulas de perfim mais agressivo, pistões com um revestimento especial para produzir menos atrito e uma reprogramação eletrônica. Com isto, o quatro-cilindros passou a entregar 203 cv a 6.600 rpm, com os mesmos 24,9 mkgf de torque – porém agora a 5.200 rpm. Novamente o câmbio era manual de seis marchas, opcionalmente ligado a um diferencial de deslizamento limitado. Era o bastante para que o Sentra SE-R fosse de zero a 100 km/h em 6,7 segundos, de acordo com a fabricante.
As modificações no sistema de suspensão e nos freios eram semelhantes às vistas na geração anterior, porém com a adição de uma barra de amarração em “V” (V-brace) no porta-malas. Já o interior trazia detalhes mais agressivos, como cintos de segurança vermelhos, bancos com apoio mais generoso, costuras vermelhas no volante revestido em couro.
Àquela altura, a Nissan do Brasil já havia percebido o sucesso do Honda Civic Si, e chegou a preparar seu lançamento em nossas terras, previsto para algum momento entre 2008 e 2009. Foram importados dois exemplares, um carro preto e um carro vermelho, para promoção do modelo em eventos e também para testes por parte da imprensa.
De acordo com as impressões publicadas na época, a suspensão era sensivelmente mais dura que no Sentra comum, e fazia bem o seu papel nas curvas graças à barras estabilizadora na traseira. No entanto, dizia-se também que o Sentra SE-R tinha rodagem mais confortável que o Civic Si e que, com isto, o Honda demonstrava dinâmica mais afiada.
O caso é que seria uma bela briga, mas no fim das contas o Sentra SE-R não veio. O motivo do cancelamento jamais foi esclarecido, mas acredita-se que, por ter motor de 2,5 litros, o sedã entraria em uma faixa superior do IPI. Com alíquota mais elevada (quase o dobro, na verdade, sendo 13% para o Civic e 25% para o Sentra), o sedã esportivo da ficaria mais caro, e economicamente inviável.
O que aconteceu com os dois carros? De acordo com informações de alguns membros do Clube do Nissan Sentra, o carro vermelho sofreu um acidente no Sul do Brasil e acabou destruído.
O carro preto, que foi tema do nosso quatro Achados meio Perdidos em 2016, aparentemente também já não roda mais. A referência mais recente que encontramos do carro foi um tópico em outro fórum, o Nissan Clube, que mostra o carro parado em um pátio, coberto, aparentemente bastante judiado.
O que é realmente uma pena, pois desde que o Sentra SE-R Spec V deixou de ser fabricado, em 2012, a Nissan optou por dar ao modelo uma abordagem mais voltada ao conforto e ao luxo, deixando de lado qualquer pretensão esportiva.