Sabe aquele discurso chato que sempre começa com “antigamente…” ou “no meu tempo…”? Então: de vez em quando a gente precisa disso, porque um pouco de nostalgia nunca fez mal a ninguém. Por isso, em meio às novidades do Salão do Automóvel, perguntamos aos leitores quais eram as coisas que os carros antigos (ou nem tão antigos assim) tinham, porém desapareceram (ou estão sumindo) e deixaram saudade. Agora, temos a lista com a respostas!
Alavanca de câmbio na coluna
Na década de 30, o câmbio manual de três marchas com alavanca na coluna de direção — o famoso “three on the tree” — começou a se popularizar popular nos EUA nos anos 1930, atingindo seu auge nas décadas de 40 e 50. Apesar do mecanismo mais complicado por ficar mais longe da transmissão, o sistema tinha a vantagem de não exigir que se tirasse a mão do volante para acionar as duas primeiras marchas.
Começaram a desaparecer em meados da década de 1980, e um dos últimos veículos a serem equipados com câmbio na coluna foi o Ford Crown Victoria, que saiu de linha em 2011.
Banco dianteiro inteiriço
O chamado bench seat começou a desaparecer junto com o câmbio na coluna, pois a instalação da alavanca no assoalho tomava mais espaço e tornava mais desconfortável a viagem de quem ia sentado no meio. Além da vantagem de levar mais uma pessoa no carro (com a possibilidade de estreitar laços de amizade em conversas muito mais próximas), o visual de um banco inteiriço também é muito charmoso.
Os bancos inteiriços ainda eram bastante populares na década de 1970 em picapes e nas grandes station wagons americanas e, no Brasil, foram muito bem representados por modelos como Ford Galaxie, Chevrolet Opala e Caravan, além de serem frequentemente instalados no Fusca. Picapes como a Ford Pampa e a Chevrolet S10 também tinham bancos inteiriços em algumas versões.
Carburador
Tudo bem que a injeção de combustível — primeiro a mecânica e depois a eletrônica, cujo funcionamento explicamos neste post — é muito mais eficiente na hora de alimentar o motor com o combustível que será queimado dentro dos cilindros. Só que a magia de um bom motor carburado (ou mesmo um não-tão-bom-assim) é insubstituível para uma parcela considerável dos entusiastas.
Dizer que a arte de regular o ponto do carburador usando como referência o ronco do motor é mais que papo chato de quem não aceita mudanças: é a saudade de uma época em que o homem era mais conectado à máquina e havia muito mais oportunidades (ou desculpas) para se sujar de graxa em uma tarde de domingo. Não é à toa que muitos projetos de preparação substituem a injeção eletrônica e toda a sua tecnologia pelo bom e velho carburador.
Faróis escamoteáveis
O primeiro carro a usar faróis retráteis ou escamoteáveis foi o Cord 810, apresentado em 1935. Amplamente usados para fins aerodinâmicos ou estéticos, os faróis escamoteáveis acabaram se tornando a marca registrada de alguns modelos, como o Mazda MX-5 de primeira geração — quando acesos, parecem formar um rosto sorridente por causa do formato da entrada de ar inferior.
Ganhando popularidade na década de 1960 e atingindo seu auge no fim dos anos 80, os faróis escamoteáveis caíram em desuso no início dos anos 2000. Algumas razões foram as mudanças na legislação de segurança para pedestres (os faróis protuberantes aumentavam a chance de ferimentos em caso de acidente) e o surgimento dos faróis com projetores, que eliminavam a necessidade de uma grande carcaça e possibilitavam um design aerodinâmico sem precisar esconder os faróis.
O problema é que alguns modelos, como o Honda NSX, perderam o charme sem eles. Um dos últimos carros a usar faróis escamoteáveis foi o Chevrolet Corvette C5, descontinuado em 2004.
Painel de instrumentos à moda antiga
O cluster de instrumentos com vários mostradores analógicos, grandes e legíveis está desaparecendo, e cada vez mais vemos painéis digitais com telas de alta definição, como o do atual Mercedes-Benz Classe S e do novo Audi TT. Isto não é ruim: eles são versáteis, configuráveis e, para quem aprecia tecnologia, muito legais, por que não? Acontece que ver o ponteiro do conta-giros subindo acompanhando as rotações do motor é insubstituível para muitagente. Por sorte, modelos como o Porsche 911 ainda mantém seu tradicional cluster analógico com vários instrumentos alinhados, algo que não deve desaparecer tão cedo.
Do outro lado da moeda, temos os painéis dos modelos de entrada, que há anos vêm ficando cada vez mais econômicos. Quem não se lembra dos carros populares da virada da década de 2000, que tinham um relógio “vago” com um lembrete para usar o cinto de segurança? Hoje, vemos marcadores de temperatura subsituídos por luzes espia e layouts confusos, sem conta-giros e, muitas vezes, dotados apenas de um velocímetro analógico nas versões mais baratas — uma pena.
Acabamentos internos e externos em metal
Não é raro ver entusiastas reclamando dos “carros de plástico” modernos, dizendo que eles são frágeis e que os carros de verdade eram as enormes caixas de metal de 20, 30 ou 40 anos atrás. A verdade é que hoje, os tais “carros de plástico” costumam ser naturalmente mais seguros com suas zonas de deformação programável que diminuem as chances de, em caso de acidente, o carro se tornar uma pilha de metal retorcido. Há exceções, claro, mas via de regra é assim.
Por outro lado, o visual dos para-choques, frisos, aros do volante e até painéis de metal é o favorito de uma legião de amantes dos carros. O metal ainda aparece no interior de alguns modelos como elemento de estilo, e seu visual alegre é simulado por alguns modelos como o Fusca e o Up!, da Volkswagen, que podem ter apliques na cor da carroceria aplicados ao painel.
Quebra-vento
Até meados da década de 1990, se seu carro não tivesse ar-condicionado, sem problemas: era só abrir a pequena janelinha triangular ao lado do para-brisa e se refrescar sem precisar baixar os vidros. Um dos últimos carros brasileiros a abandonar o quebra-vento foi o VW Santana, quando foi reestilizado em 1998.
Além do ar fresco, os fãs do quebra-ventos curtem o visual da janelinha aberta (é um charme, mesmo). Alguns carros, por exigência do formato das portas e janelas, até têm um quebra -ventos “falso” (minivans, por exemplo), mas definitivamente não é a mesma coisa.
Câmbio manual
O câmbio automático, automatizado e até mesmo as caixas CVT têm ficado cada vez mais acessíveis e, por isso, mais populares — a ponto de muitos modelos nem oferecerem mais os três pedais. Nos EUA, câmbio manual é exceção há décadas. É claro que as transmissões automáticas ou automatizadas são muito mais práticas na cidade e, na pista, muito mais rápidas (especialmente as transmissões com dupla embreagem).
Acontece que trocar as próprias marchas é uma das partes mais legais do ato de dirigir para boa parte dos entusiastas. Não vamos cair naquele discurso cansado e dizer que “querem tirar isso da gente”, pois a popularização do câmbio automático/automatizado é uma evolução natural e a tendência é vê-lo cada vez mais em carros mais acessíveis. Preferimos dizer que, como o disco de vinil, o câmbio automático nunca vai morrer, e sim se tornar um recurso de nicho. Com ou sem grelha.
Carros com duas portas
Houve um tempo em que, no Brasil, até os sedãs tinham duas portas — as pessoas os achavam que os carros de quatro portas eram muito mais frágeis e menos seguros e os rejeitavam. Isto começou a mudar em meados da década de 1990 e hoje, duas décadas depois, é cada vez mais raro encontrar carros novos de duas portasa um preço acessível — são populares ou modelos de nicho.
Carros de duas portas costumam ser mais leves, ter maior rigidez torsional e, não raro, desenho mais harmônico (é só comparar o up! de duas portas com o modelo de quatro portas). Mas até versões esportivas, como o Golf GTI, estão chegando por aqui apenas com quatro portas — neste ponto, há quem prefira o novo Civic Si, um herói da resistência com sua carroceria de duas portas e perfil fastback. Situação semelhante está acontecendo nos EUA, que só recebem a versão de quatro portas do pequeno e invocado Ford Fiesta ST — que, na Europa, pode ser adquirido com duas portas. Sinal dos tempos.
Cores vibrantes
Preto, branco, prata e um ocasional vermelho dominam a paisagem urbana quando se trata de carros, mas houve um tempo em que as ruas eram lotadas de carros laranja, amarelos, verdes, azuis… É só dar uma pesquisada rápida na internet e você vê como as coisas eram muito mais coloridas há 30 ou 40 anos.
Medo de se destacar na multidão e facilidade para revenda são os fatores que contribuem para a paleta automotiva quase monocromática que temos hoje. Mas isto está mudando — ainda que timidamente, os fabricantes com maior presença de mercado estão voltando a oferecer cores vivas e vibrantes em seus catálogos. Ainda bem!
Tração traseira… acessível
Houve um tempo em que a tração traseira era a norma e o esquisito era levar a força para as rodas dianteira. Modelos como o Mini Cooper clássico e o VW Golf, nas décadas de 1950 e 1970, mostraram que a tração dianteira era a melhor solução para carros de uso diário e hoje, na maioria das vezes, são as marcas tradicionalmente associadas à tração traseira (BMW e Mercedes-Benz, por exemplo) e os carros esportivos que fazem uso desta configuração.
Por mais que muitos carros de tração dianteira tenham dinâmica excelente graças a um projeto bem acertado em potência, distribuição de peso e suspensão; e os carros de tração integral sejam referência em estabilidade, a experiência de pilotar um carro de tração traseira é sempre mais intensa (quando se sabe o que está fazendo, claro).
Ou não
Agora, parece que um pequeno revival começou — pequeno, literalmente: a nova geração do popular Renault Twingo voltou com tração e motor na traseira. Vamos cruzar os dedos e ver onde isto vai dar.
[ Fotos: Marcos Camillo Silva/Muscle Car Fotografia, Blog do Flavio Gomes ]