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Motos

Six Days Enduro, o maior desafio do motociclismo off-road

Se você acompanha o mundo das duas rodas, deve saber que nos últimos dias rolou a edição 2021 do Six Days Enduro – que é provavelmente a mais tradicional competição de motociclismo off-road do planeta. Se você não acompanha, ficou sabendo agora.

Também conhecido simplesmente como Six Days, a prova é exatamente o que seu nome diz: uma prova de longa distância com seis dias de duração, em um percurso que pode ter mais de 2.000 km de extensão. Tradicionalmente, o piloto deve começar e terminar a prova com a mesma moto, realizando apenas os reparos permitidos, e de preferência, precisa consertar sua moto sozinho caso tenha algum problema. Não é por acaso que o Six Days também é conhecido como “o teste supremo de humano e máquina” e “as Olimpíadas do Motocross”. Tem até medalhas!

Primeira coisa: é uma competição antiquíssima – o primeiro Six Days Enduro aconteceu em 1913, dez anos antes da primeira edição das 24 Horas de Le Mans, e 14 anos antes da inauguração de Nürburgring Nordschleife. A prova de estreia aconteceu no Reino Unido, em Carlisle, e era um pouco diferente em concepção e propósito.

Naquela época ainda não havia uma distinção muito grande entre carros e motos – ambos ainda eram maravilhas da engenharia relativamente recentes, e ambos contribuíram para a revolução do transporte pessoal. Já havia bons carros e motos, mas as fabricantes ainda estavam encontrando a melhor forma de fazer as coisas. Então, a ideia do evento era colocar tais veículos em um teste sob condições severas, a fim de verificar sua robustez e durabilidade. O foco eram as motos, mas sidecars e mesmo ciclocarros – automóveis leves que aproveitavam o motor e a transmissão das motos – podiam participar.

Já naquela época a ideia era que os participantes estivessem por conta própria assim que fosse dada a largada. As motos deveriam ser consertadas apenas com as peças que pudessem ser levadas, e deveria terminar a prova nas melhores condições possíveis. Cada componente danificado, substituído ou ausente custava pontos à classificação final, assim como desvios de rota e paradas fora de hora.

Na concepção e na maior parte de sua história, o Six Days foi uma prova mais parecida com um rali de velocidade tradicional, com mais ênfase nas disputas por tempos nos estágios – e, por causa disso, se chamava International Six Days Trial (ISDT).

No começo não era difícil encontrar terrenos desafiadores por toda a Europa, já que naquela época as estradas pavimentadas eram raridade. Para completar, as provas aconteciam geralmente depois de agosto, quando tem início a estação chuvosa no Velho Continente – onde foram realizadas todas edições até 1973. Em 1974, o Six Days foi realizado nos EUA pela primeira vez, e de lá para cá, um punhado de outras edições foram realizadas em outros locais fora a Europa, incluindo Brasil, Chile e México.

A década de 1960 certamente é a mais memorável na história do Six Days. Isso porque, em 1964, ninguém menos que Steve McQueen decidiu participar. O king of cool ainda não tinha entrado no radar dos entusiastas – afinal, “Bullitt” só veio em 1968 e “As 24 Horas de Le Mans” é de 1971. Mas McQueen já era fã de carros, motos e tudo o que tivesse motor desde muito antes – e sabia se virar tanto ao volante quanto sobre duas rodas. Logo em seu primeiro grande papel no cinema, “Fugindo do Inferno” (The Great Escape, 1963), McQueen fez questão de pilotar a moto usada pelo protagonista sem dublês sempre que podia, incluindo na perseguição principal do filme.

No ano seguinte, empolgado com as motos, McQueen chamou os amigos Bud Ekins, Dave Ekins, Cliff Coleman e John Steen para formar uma equipe no Six Days, que em 1964 foi realizado em Erfurt, na antiga Alemanha Oriental. A equipe de McQueen, coordenada pelo piloto John Penton. E eles fizeram bonito nos primeiros dias, chegando a liderar a classificação geral ao fim do primeiro dia. McQueen abandonou a prova no terceiro dia, depois que um acidente deixou o garfo de sua Triumph TR6 750 encostando no quadro. No fim das contas, apenas Cliff Coleman e Dave Ekins terminaram a competição, e cada um deles ficou com uma medalha de ouro individual.

A premiação em medalhas, aliás, é um aspecto interessante do Six Days. As equipes inscritas concorrem a troféus em diferentes categorias para times de seis, quatro ou três pilotos. Mas há as medalhas individuais, e elas ajudam a ilustrar a severidade do Six Days Trial: qualquer um que termine a prova com um tempo até 10% maior que o líder de sua categoria ganha uma medalha de ouro. Quem terminar com um tempo até 25% maior, ganha uma medalha de prata. E todos os que terminarem os seis dias de prova dentro do tempo limite ganham medalhas de bronze. Considerando que a maior parte dos competidores abandona a prova, quem chega ao fim merece mesmo um prêmio.

A edição de 2021, que rolou dos dias 30 de agosto a 4 de setembro na Itália, e terminou com medalha de ouro para os brasileiros Bruno Crivilin e Vinícius Calafati. Foi a terceira vez que Bruno recebeu o prêmio individual máximo do Six Days, enquanto Vinícius fez bonito logo em sua estreia. Na classificação geral, o Brasil ficou na oitava colocação, enquanto os italianos venceram em casa.

Os finlandeses é que foram a surpresa desta edição: nos últimos 20 anos, a Finlândia despontou como uma das potências do Enduro mundial, e os Six Days eram seu palco favorito – eles até chegaram a usurpar o posto de Itália e França como maiores vencedores. Em 2021, porém, os competidores do país gelado conseguiram apenas a 14ª e última posição.