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Car Culture

Tucker Carioca: esboços originais podem ter sido encontrados por acaso na internet

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Preston Tucker morreu há quase 60 anos, mas seu nome voltou à tona no universo automotivo nesta semana depois que supostos esboços de um carro que ele nunca conseguiu construir foram descobertos em um fórum de internet quase sem querer. Este carro era o Tucker Carioca, o modelo que Preston Tucker queria produzir no Brasil dos anos 1950.

As imagens foram descobertas meio ao acaso no fórum de charadas e desafios automotivos Autopuzzles. Um usuário da Alemanha, identificado pelo nome Wendax, publicou a foto abaixo no site, desafiando os demais usuários a descobrir o nome do carro.

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Depois de três meses de tentativas de identificar o carro, o autor do post revelou que o modelo deveria ser uma proposta de design para a Studebaker, feita por Raymond Loewy. Contudo, ele publicou outros esboços e modelos de argila que seriam relacionados ao carro misterioso.

Acontece que os desenhos publicados pelo alemão se mostraram excessivamente parecidos com um outro carro esquecido: o Tucker Carioca, o carro que Preston Tucker estava tentando desenvolver quando morreu. Segundo Wendax, os esboços faziam parte de um lote de desenhos do designer Raymond Loewy para a Studebaker que estava sendo leiloado online, mas as semelhanças com o Tucker Carioca são inegáveis, especialmente comparando a imagem em 3/4 de frente.

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O conceito estético é praticamente o mesmo: rodas destacadas da carroceria, três faróis com um par sobre os para-lamas e outro central e banco traseiro curvo. A única diferença é o balanço traseiro do carro do esboço, que é bem mais longo que as projeções mais conhecidas do Carioca — o que pode indicar que esta é uma versão inicial do futuro carro de Tucker, uma vez que foram feitos vários esboços apenas a título de anotação e visualização da ideia do americano, como conta o Conde Alexis de Sakhnoffsky, o designer do Carioca:

“Embora eu não concordasse inteiramente com Preston a respeito do visual do carro, preparei uma série de rascunhos que ilustravam suas ideias e, a partir deles, Preston selecionou o desenho final (a projeção que ficou mais famosa)”

Ainda é difícil dizer se estes esboços são verdadeiros ou falsos. Contudo, agora que eles apareceram para o mundo, é importante investigar a verdade. Particularmente eles parecem bastante verdadeiros, mas considerando todo o experimentalismo da época, é possível também que eles não tenham relação alguma com o Tucker Carioca.

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O Tucker Carioca surgiu depois que Preston Tucker foi absolvido dos tribunais americanos. Tudo o que lhe restara foi uma empresa falida, uma reputação seriamente abalada e seu sonho de construir carros. Mas isso era bastante para uma história tão interessante quanto intrigante, que envolve até mesmo o nascimento da indústria automotiva brasileira.

Até a década de 50 não haviam fabricantes de carros no Brasil. Havia as linhas de montagem, que usavam peças importadas e projetos estrangeiros. A produção nacional era praticamente nula e para reverter a situação e estimular o crescimento da indústria nacional – incluindo aí os automóveis – o governo do presidente Getúlio Vargas criou a Comissão de Desenvolvimento Industrial, nomeando o então almirante Lúcio Meira como responsável pela implementação da indústria automobilística.

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Em 1953 Lúcio Meira e Getúlio Vargas foram apresentados aos modelos VW que seriam produzidos no Brasil seis anos mais tarde.

O almirante fez uma viagem aos Estados Unidos à procura de interessados em produzir carros no país, e Preston Tucker foi um dos executivos com quem Lúcio conversou. Com sua credibilidade totalmente destruída e desestimulado, Tucker sabia que seria difícil conseguir novos investidores nos EUA. No início de 1951, desembarcava no aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro.

Apesar da reunião, não é possível saber o que realmente trouxe Tucker ao Brasil. Durante sua estada nos trópicos, Preston – já diagnosticado com câncer – visitou o médico americano William Koch, que estudava um novo tratamento para a doença e vivia no Brasil desde que foi acusado de charlatanismo em seu país por tentar tratar tumores sem drogas ou radioterapia. Portanto, há quem diga que o tratamento dos pulmões tenha sido o real motivo da viagem.

Independente das razões, Tucker gostou do que viu e, visionário como era, percebeu um futuro promissor num país tão grande, que estava em processo de desenvolvimento, mas ainda não tinha produção automotiva local. Abriu um escritório na rua Mayrink Veiga, no centro do Rio de Janeiro.

No mesmo ano, de volta aos EUA, Tucker começou a projetar um novo carro tendo em mente os mercados emergentes. É importante ressaltar que na época a Europa ainda estava começando a recuperar-se da guerra e o processo de “motorização” dos países afetados mal havia começado.

Tucker imaginou inicialmente um táxi em que o banco dos passageiros seria voltado para a traseira do carro, mas logo desistiu da ideia. No começo de 1952 Preston reuniu-se com o designer Alexis De Sakhnoffski, famoso no começo do século por seus projetos aerodinâmicos, e dali saíram as primeiras linhas do carro que seria chamado de Carioca, uma homenagem ao país e à cidade onde Tucker recomeçaria a construção de seu sonho.

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O Carioca foi projetado para ser um carro produzido em massa e divertido de guiar. Para Preston, ele deveria ter um visual esportivo e um projeto inusitado, com bom desempenho e preço acessível. A intenção era vendê-lo por menos de mil dólares na época, com a possibilidade de vender o carro em kits.

Os para-lamas seriam como os de moto, fáceis de remover, pois Preston dizia que a sujeira acumulada no interior dos para-lamas comuns poderia pesar até cinco quilos, o que afetaria o desempenho do carro. Os para-lamas dianteiros moveriam-se junto com as rodas, como no projeto inicial do 48 Torpedo. Ele também teria o conjunto de três faróis, sendo um central, mas ao contrário do sedã Torpedo, o farol “ciclope” seria fixo. Por dentro, acomodaria quatro ocupantes e o painel seria compacto com um único instrumento agrupando o amperímetro, indicador de nível de combustível, velocímetro, manômetro do óleo e termômetro do motor – exatamente como o do Torpedo.

Preston conseguira salvar seu maquinário e ferramentas, por isso o Carioca seria construído com o maior número possível de peças já existentes. O motor permaneceria sobre o eixo traseiro, mas em vez de um gigantesco flat-6, ele usaria um flat-4 de 100 cv que levaria o carro aos 160 km/h e permitiria percorrer até 11 quilômetros com um litro de gasolina.

O maior custo seria a produção das chapas da carroceria. Algumas peças teriam que ser metálicas, como o capô e a tampa do motor traseiro, mas o restante poderia ser de fibra. Tucker recebeu boas propostas de fabricantes de trailers e ficou entusiasmado, dizendo que “se os compósitos são bons para a carroceria de trailers, também podem ser bons para os carros”.

Pelos cálculos de Tucker, ele precisava de nada menos que US$ 2,5 milhões para produzir o carro, uma fortuna para a época. Apesar disso, ele não precisou de muito esforço para encontrar interessados em bancar o projeto. Um dos mais entusiasmados era o ex-governador paulista e candidato das eleições presidenciais de 1955 Adhemar de Barros (célebre pelo slogan “rouba, mas faz”). Ele achava o carro ideal para São Paulo, e ofereceu benefícios a Tucker para construir sua fábrica na cidade. Contudo o americano disse que achou a terra da garoa “fria e úmida demais para viver”.

Na verdade, a intenção futura de Tucker era dar a volta por cima e voltar à carga contra seus inimigos de Detroit. A capa da edição de dezembro de 1955 da revista Car Life trazia estampada uma projeção do Carioca com os dizeres “O novo carro secreto de Preston Tucker”. Na entrevista, Tucker disse que tinha propostas para produzir seu novo carro em outros países, mas que daria preferência aos EUA até que as possibilidades fossem esgotadas.

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Enquanto isso o recém-eleito presidente Juscelino Kubitschek ofereceu a Preston uma série de incentivos fiscais para que o Carioca fosse produzido por aqui. Mas o câncer de Preston estava evoluindo e sua saúde estava tão fragilizada que durante um vôo para os EUA Tucker precisou receber oxigênio para auxiliar sua respiração.

Em dezembro de 1956, Preston Tucker morreu de pneumonia, decorrente de seu câncer. Seu amigo Alex Tremulis, contudo, declarou que a real causa da morte fora “o coração partido”.

É difícil, senão impossível, dizer o que seria da indústria automotiva brasileira se Preston tivesse concretizado a segunda parte de seu sonho. Seus carros traziam soluções à frente de seu tempo que ficaram décadas esquecidas antes de serem efetivamente aplicadas aos carros produzidos em massa.

Poderíamos realmente ter avançado 50 anos em cinco? Talvez Preston Tucker tenha sido o cara certo no momento errado. Ou talvez não: na década seguinte, outro projeto polêmico e visionário, o Democrata, causaria no Brasil sensações de júbilo e reações contrárias de forma semelhante ao Tucker nos EUA, até ser enterrado na história.

[ Fotos: Kustorama/Darcy Vieira (projeções)]