Quanta potência é potência demais? Claro, a gente adora carros absurdamente potentes mas, ao mesmo tempo, somos defensores daqueles automóveis com potência na medida certa, que dão mais valor à dinâmica do que à cavalaria bruta. No entanto, de vez em quando nos pegamos babando em um carro preparado de mais de 1.000 cv.
Este Porsche 911 1976, por exemplo, tem um flat-6 biturbo capaz de entregar mais de 1.000 cv para acompanhar seu visual maroto. E não tem como não admirá-lo por isto, concorda?
Bisi Ezerioha é o cara por trás deste monstro. Filho de nigerianos, ele poderia ter sido um cientista de sucesso — começou a estudar engenharia petroquímica aos 15 anos na universidade de Anambra, na Nigéria e, depois de se mudar para os EUA, ainda conseguiu graduações em ciências naturais e engenharia química na Universidade da Califórnia. Sua maior paixão, contudo, sempre foi preparar motores, e foi com isto que ele decidiu ganhar a vida ao fundar a Bisimoto Engineering em 1995.
A filosofia de Bisi é simples: não há limite para a potência que se pode extrair de um motor, desde que isto possa ser feito com segurança e que o resultado fique confiável. Sendo assim, a Bisimoto acabou ganhando fama graças a suas preparações extremas, com motores que raramente não passam dos 1.000 cv. Se você acompanha o mundo dos carros modificados há algum tempo, certamente já deve ter visto a Honda Odyssey preparada por ele:
Com a intenção de ser um “quase-sleeper”, a minivan só começa a revelar sua verdadeira natureza quando se oberva o gigantesco intercooler pelo buraco onde deveria haver uma grade. Atrás dele está o mesmo V6 de 3,5 litros que originalmente entrega 250 cv. No entanto, com componentes internos reforçados e dois turbos (mas, definitivamente, não apenas isto), a potência agora é de insanos 1.043 cv.
A Honda Odyssey foi feita para o SEMA Show em 2013, mas Bisi acabou adotando-a para usar de vez em quando. O Porsche, por sua vez, foi pensado como carro de uso pessoal desde o início. Porque há quem ache sensato dirigir por aí em um esportivo peso-pena com motor na traseira e quase 1.000 cv nas rodas, e Bisi é um destes caras.
Tudo começou com um Porsche 911 Turbo 1976. Se você tem boa memória, vai lembrar como comentamos algumas vezes aqui no FlatOut como o Porsche 930 (codinome do 911 Turbo de primeira geração) era um carro arisco: além de ter muito peso concentrado atrás, tração traseira e entre-eixos curto, a atuação do turbo estava longe de ser linear — perto das 4.000 rpm, você tomava uma patada capaz de te fazer perder o controle, dependendo da situação.
A fama de “viúva negra” do 930, mais o fato de ele ter para-lamas alargados e um visual mais agressivo, motivaram Bisi a optar por um deles como base para seu projeto. No entanto, não demorou nada para que ele percebesse que o motor original (um flat-6 de três litros refrigerado a ar de 260 cv) não daria conta do recado — sua ambição era grande demais.
A primeira coisa que ele fez foi procurar um motor mais moderno a um preço bacana, encontrando logo um boxer de 3,4 litros vindo de um 911 996 — aquele que não é bem aceito por alguns fãs por causa dos faróis de Porsche Boxster. De qualquer forma, a origem pouco importava — o importante é que o motor tivesse potencial.
E, de fato, com dois turbocompressores Turbonetics de 61 mm, bielas de inox e pistões forjados feitos sob medida, injetores de alta vazão, cabeçotes retrabalhados e coletores de escape e admissão exclusivos, quase dá para dizer que o motor é outro. Também foram instalados dutos de alumínio, intercooler Sparco do tipo ar-ar, um radiador maior da Griffin, válvulas Supertech (sendo que as de escape são feitas de Inconel, uma liga de níquel, cromo e ferro) e comandos com graduação mais agressiva.
O resultado é um motor plenamente capaz de entregar mais de 1.000 cv. No entanto, é aí que entra um segredo: o módulo de controle do motor (que permitiu até a instalação de um acelerador eletrônico) atua junto com o controlador de boost dos turbos e, na maior parte do tempo, mantém a potência do motor na casa dos 800 cv — cerca de 660 cv nas rodas, de acordo com testes no dinamômetro.
Se, com 260 cv originais, o 911 Turbo já era um carro bruto, imagine o que acontece quando você triplica esta potência! Por isto, Bisi fez questão de adequar todos os outros aspectos do carro à nova cavalaria. Assim, a suspensão recebeu amortecedores ajustáveis do tipo coilover Eibach, retrabalhados pela Bisimoto; gaiola de proteção integral e freios mais modernos, também vindos do Porsche 991.
O carro já teve diferentes conjuntos de rodas e pneus ao longo de sua existência, e atualmente está com um jogo de Fifteen52 Outlaw 001 (aquelas rodas criadas por Magnus Walker, inspiradas nas clássicas Fuchs) de 17×9” na dianteira e 17×11” na traseira, calçadas por pneus Toyo Proxes R888.
Com as mesmas cores usadas pelos Porsche 911 de competição nos anos 1970, elas casam muito bem com o visual agressivo do carro, que teve os para-lamas ainda mais alargados, recebeu um body kit projetado e fabricado sob medida e uma asa traseira de fibra de carbono. A cor azul se chama Bisimoto Electric Blue, e também foi desenvolvida exclusivamente para Bisi.
Por dentro, o que se tem é uma ode à forma a serviço da função: ao mesmo tempo em que não há qualquer tipo de luxo, com todos os revestimentos removidos e apenas banco, painel e gaiola de proteção integral na cabine; não há aquela bagunça típica dos carros de corrida. Nada para te atrapalhar, nada para tirar sua atenção, apenas o necessário para andar rápido e apreciar uma boa experiência ao volante.
Agora, se você acabou lembrando daquele outro cara que transforma os Porsche 911 em monstros — Akira Nakai, da RAUH-Welt Begriff — saiba que há uma relação entre os dois: é a Bisimoto que fornece os motores preparados que os carros de Nakai-San usam nas corridas de longa duração no Japão. Tudo fez sentido agora, não é?
Parece que o mundo fica cada vez menor às vezes, não é?
[Fotos: Bisimoto Engineering]