Se você curte hot rods e cinema, certamente conhece o clássico “Loucuras de Verão”. Não? Que tal American Graffiti? A gente nunca vai entender a lógica por trás das traduções de nomes de filmes no Brasil, mas o que importa é que a película é obrigatória para quem quer conhecer ou se aprofundar na cultura hot rodder americana.
Dirigido e escrito por George Lucas, American Graffiti (1973) é baseado em suas experiências na juventude e conta a história dos jovens recém saídos da escola Curt Henderson e Steve Bolander, John Milner e Terry “The Toad” Fields, que se aventuram pelo universo teenager de Modesto, Califórnia, no início da década de 60. Nessa transição de adolescentes para adultos, Curt e Steve participam de rachas e cometem pequenos delitos, envolvendo-se com garotas e arriscando suas vidas nas noites californianas.
Tendo como cena mais marcante a arrancada na chamada Paradise Road, entre o Ford ’32 “Deuce Coupe” de Milner e o Chevy ’55 de Falfa, American Graffiti deixa bem clara uma coisa: a cultura hot rodder está profundamente ligada aos famosos pegas de semáforos — em um tempo onde se tinha mais sangue nos olhos e menos preocupação com a segurança, era muito comum ver cupês coloridos e barulhentos disputando metros quando a luz verde acendia.
Por isso mesmo, as maiores preocupações eram a estética dos carros e a aceleração — os caras deixavam os carros nos trinques, preparavam o motor V8 e pé na tábua. A dinâmica ficava em segundo plano, porque ninguém precisava dela para impressionar os brotos, mora?
Só que o tempo passa e as coisas mudam — e não é diferente com a cultura automotiva. Au contraire, meus amigos: as coisas só se diversificam e evoluem, e esta é a graça da cultura automotia. E foi esta evolução constante que nos trouxe o Urchfab, um hot rod, ou melhor, um rat rod de drift. É, pois é!
Para o criador do Urchfab, o britânico Matt Urch, as coisas foram bem simples: em agosto de 2014, depois de enjoar de seu Escort Mk2 de drift, ele decidiu criar algo único, feito do zero, gastando a menor quantia possível. O resultado: um rat rod com motor Saab, carroceria de Ford Anglia (ou parte dela), suspensão ajustável e um visual que, seguramente, é único no planeta.
Urch conta que gosta de fuçar em carros desde os 13 anos, mas que sua primeira paixão de verdade foram as motos. Ainda bem jovem ele começou a praticar o Motocross mas, há alguns anos, um acidente grave lhe causou uma lesão na perna e fez com que, a partir dali, Urch buscasse uma alternativa mais segura. Em 2012, ele conheceu o drift — o que nos faz questionar seriamente seu conceito de “mais seguro”.
O caso é que Urch é dono da Urchfab, que começou como uma oficina de soldagem mas logo se transformou em um negócio bem mais interessante, ao menos do ponto de vista entusiasta: hoje, Matt constrói chassis sob medida, realiza engine swaps, constrói componentes e até faz carrocerias inteiras sob medida.
Nada mais natural que tentar colocar todas as suas habilidades à prova e construir um carro inteiro, não é mesmo? Foi exatamente isto o que ele fez — e não titubeou em batizar sua obra com o mesmo nome de sua oficina. Até porque é um nome bem bacana.
Tudo, absolutamente tudo no Urchfab, foi pinçado em ferros-velhos e oficinas, e comprado por um preço muito camarada ou mesmo conseguido de graça. Isto vale para a carroceria, que veio de um Ford Anglia 1953; para o motor, que é um Saab B204, de quatro cilindros e dois litros; e, bem, para todo o resto: transmissão Vauxhall, eixo traseiro com diferencial Volvo, faróis, lanternas, para-brisa, grade do radiador… tudo.
Quer dizer, algumas coisas foram feitas sob medida, como a gaiola de proteção, a parede corta-fogo, os comandos para o piloto e o túnel de transmissão. Este percorre todo o carro e é levemente deslocado para a esquerda, visto que o hot rod usa a mão inglesa.
Foi um projeto que levou oito meses para ficar pronto, com Urch dedicando todas as noites e fins de semana ao Urchfab. E, logo em seu primeiro evento — uma exibição de drift no circuito de Castle Combe, na Inglaterra, levou uma bela pancada ao perder o controle na saída de uma curva. Urch, como bom entusiasta, sabe que errou — um pouco na condução, um pouco no acerto da suspensão.
E muito na ausência do dispositivo HANS, que protege o pescoço do piloto em situações como esta…
Sendo assim, ele decidiu publicar o vídeo onboard do acidente — e, acreditamos, nem esperou o arquivo acabar de subir para começar a consertar seu carro, realizando novos testes na suspensão e, por tentativa e erro, melhorando o comportamento dinâmico do Urchfab.
Pode não ser o carro mais bonito, nem hot rod mais perfeito ou “culturalmente correto”, mas, honestamente, dá para criticar um cara que decide fazer um carro com suas próprias mãos?