No próximo domingo o mundo do automobilismo estará dividido entre duas das três maiores corridas do planeta: a 500 Milhas de Indianápolis e o Grande Prêmio de Mônaco. Neste ano as atenções serão ainda mais divididas especialmente porque Fernando Alonso simplesmente abriu mão de disputar o tradicional GP de Mônaco (o qual já venceu em 2006 e 2007), pegou as malas e foi para Indiana, onde irá disputar as 500 Milhas.
A presença de Alonso na Indy é a primeira de um piloto regularmente ativo na Fórmula 1 desde 1971, quando Denny Hulme encontrou um tempo entre os GPs de Mônaco e da Holanda, e deu um pulo em Indianápolis. Nigel Mansell também chegou a disputar as duas categorias em um mesmo ano, mas fez o caminho contrário: deu um pulo na F1 enquanto disputava a Indy — e boa parte de seus GPs foi após o fim da temporada da Indy.
Esse longo intervalo se deveu principalmente aos esforços de Bernie Ecclestone para impedir comparações entre as duas categorias — a F1, afinal, sempre se vendeu como o ápice da tecnologia de corridas; uma eventual vantagem da Indy, que gasta menos e tem soluções tecnológicas mais conservadoras, seria algo indesejável para a F1.
Também por este motivo as duas categorias disputaram uma prova em um mesmo circuito em um mesmo ano somente uma vez desde que a Indy 500 deixou o calendário da F1. Foi em 2002, quando a Indy (na época CART) correu a Molson Indy Montreal no mesmo traçado que o GP do Canadá de F1. Na ocasião Cristiano da Matta conquistou a pole na prova da CART, com 1:19,465 e o escocês Dario Franchitti fez a volta mais rápida com 1:20,238. Na F1, a pole e a volta mais rápida da corrida ficaram com Juan-Pablo Montoya, que fez 1:12,836 na classificação e 1:15,960 na corrida.
A participação de Alonso, contudo, permitiu um outro tipo de comparação entre as categorias: pela primeira vez um piloto teve a oportunidade de pilotar um carro da Indy e um de Fórmula 1 em uma mesma temporada, e ambos em situação de competição. Foi por isso que assistimos atentos à coletiva de Alonso após seus primeiros testes, e também é por isso, em menor parte, que o mundo está tão interessado no desempenho do espanhol na Indy.
Por isso, aproveitando a proximidade com a Indy 500, achamos que é uma boa hora para falar sobre as diferenças de cada categoria.
Os carros
Chassi
Enquanto na Fórmula 1 o chassi é fabricado pela própria equipe (ou comprado de um fornecedor), na Indy as equipes usam todas o mesmo chassi, fornecido pela Dallara e com o mesmo projeto básico.
Peso
Na Fórmula 1 o peso seco mínimo do carro com o piloto é de 728 kg (sendo, no máximo 330 kg sobre o eixo dianteiro e 391 sobre o traseiro). Antes de 2014, quando os carros ainda usavam V8 aspirados, o peso mínimo era inferior: 628 kg. Na mesma época a Indy permitia 676 kg, porém agora, curiosamente, as posições se inverteram: Indyexige carros mais leves, que devem ter, no mínimo, 701 kg (1.545 lbs) em ovais e 714 kg (1.575 lbs) em circuitos mistos.
Dimensões
Os carros da Indy medem, no mínimo, 5,13 m de comprimento (202 pol.), 2,01 m de largura (79 pol) e o entre-eixos deve ter entre 2,98 m e 3,08 m (117,5 pol e 121,5 pol). Os Fórmula 1 têm comprimento e entre-eixos sem restrições de medidas, porém não podem ter mais que 95 cm de altura, nem 2 m de largura com os pneus dianteiros sem esterçamento, a carenagem entre os eixos não pode ter mais de 1,6 m de largura e os balanços não devem exceder 71 cm na traseira e 120 cm na dianteira.
Aerodinâmica
Apesar dos chassis serem os mesmos para todas as equipes da Indy, o conjunto aerodinâmico é desenvolvido de forma independente pelo fornecedor de motores. Para 2017 o desenvolvimento foi congelado em relação ao ano passado, e em 2018 as equipes usarão um kit aerodinâmico único.
Motor
Na Fórmula 1 deve ter 1,6 litro de deslocamento, layout V6 de 90 graus, duas válvulas de admissão e duas de escape, um turbocompressor, uma unidade elétrica MGU-H com rotação limitada a 125.000 rpm conectada diretamente à turbina, e uma unidade elétrica MGU-K com rotação máxima de 50.000 rpm conectada ao virabrequim antes da embreagem e com relação direta (1:1).
As rotações do motor são limitadas a 15.000 rpm e o combustível deve ser gasolina. A potência não é declarada, mas é estimada entre 750 cv e 1.000 cv. Os fornecedores atualmente são Ferrari, Renault, Honda e Mercedes.
Na Indy o motor também é V6, porém o deslocamento é de 2,2 litros e a sobrealimentação é feita por dois turbocompressores. Não há assistências elétricas. A velocidade do motor é limitada a 12.000 rpm e o combustível deve ser E85 (15% de gasolina e 85% de etanol).
A potência varia entre 558 cv (550 hp) e 760 cv (750 hp) de acordo com o circuito em que a prova será disputada. Os pilotos ainda têm o push-to-pass que acrescenta mais 20 cv por 20 segundos, no máximo. Os fornecedores atualmente são apenas Honda e Chevrolet.
Câmbio
Nas duas categorias o câmbio com trocas automáticas é proibido, porém a atuação automática da embreagem é permitida, o que faz deles câmbios “semi-automáticos” (ou automatizados, para usar o termo mais moderno). Na Fórmula 1 o câmbio deve ter obrigatoriamente oito marchas à frente e uma à ré, enquanto na Indy o câmbio precisa ter seis marchas à frente e uma à ré.
Direção
Nas duas categorias o mecanismo é de cremalheira e pinhão, porém na Indy é proibido qualquer tipo de assistência. Na Fórmula 1 qualquer ajuste eletrônico é proibido, bem como assistência elétrica, porém a assistência hidráulica é liberada e adotada por todas as equipes.
Os circuitos
Circuito misto de Indianapolis
A Indy corre majoritariamente em quatro tipos de circuito: ovais longos, com mais de duas milhas (3,2 km) de comprimento, geralmente chamados de superspeedways; ovais curtos com cerca de 1,5 milha (2,4 km), circuitos mistos (road courses) e circuitos de rua (street courses).
A Fórmula 1 não tem ovais desde 1960, quando a Indy 500 deixou de integrar o calendário oficial da categoria. Desde então os Grandes Prêmios são disputados apenas em circuitos fechados de autódromos e circuitos de rua.
Desempenho
Estas diferenças de configuração de circuitos também permite que os carros da Indy atinjam velocidades significativamente mais altas. O recorde de velocidade máxima da categoria americana, em corrida, é de 413,52 km/h, atingidos por Paul Tracy no oval de Michigan em 1996 (na CART, para ser mais exato), enquanto na Fórmula 1 é de 372,6 km/h, atingido por Juan Pablo Montoya no GP da Itália de 2005
Já a velocidade média mais elevada na Indy foi atingida por Gil de Ferran no oval de Pocono em 2000: 388,537 km/h. Na Fórmula 1 o recorde é de Damon Hill no GP de Monza de 1993: 249,835 km/h.
Já sobre o comportamento dinâmico dos carros, Fernando Alonso fez uma comparação rápida durante sua primeira coletiva da Indy 500:
São mundos muito diferentes em termos de condução. O carro está preparado para rodar apenas em ovais, com pouca carga aerodinâmica, com muito pouca resistência ao ar, andando sempre em grupos, aproveitando sempre os cones de ar do tráfego para melhorar seu tempo e sua posição. A Fórmula 1 é uma luta contra o cronômetro, uma luta consigo mesmo para buscar os limites do carro e do motor em condições perfeitas, não havendo nada que afete essa perfeição. São as maiores diferenças.
[…] Na Fórmula 1 com a direção assistida e todos os auxílios parece mais fácil. Também tem o nível de downforce e a sofisticação do Fórmula 1 que te dão mais aderência, um carro mais previsível. Aqui tem mais rolagem… mais corrida mesmo. É definitivamente mais rápido e diferente. Mas no fim das contas todos nós começamos nos karts e acabamos sentido falta dessa sensação. Na Fórmula 1 temos tudo sob controle, cada milímetro, cada décimo de segundo. Aqui tudo depende mais do piloto”.
Orçamento
O orçamento total de uma equipe de ponta da Fórmula 1 pode chegar aos US$ 470 milhões, caso da Ferrari. Na Indy o orçamento é bem mais em conta: US$ 15 milhões.
O desenvolvimento e construção dos carros de uma equipe da F1 chegam aos US$ 125 milhões, enquanto um carro de ponta da Indy sai por US$ 3 milhões. Isso porque as equipes de F1 precisam desenvolver seu próprio chassi e, embora a construção do carro seja relativamente barata — cerca de US$ 15 milhões — as equipes de ponta chegam a gastar mais de US$ 100 milhões em pesquisa e desenvolvimento. Na Indy os carros são todos fornecidos pela Dallara, que cobra US$ 345.000 pelo chassi. O pacote aerodinâmico custa entre US$ 150.000 e US$ 200.000.
O desenvolvimento de motores custa outros US$ 130 milhões na F1, enquanto a Indy gasta apenas US$ 2 milhões. As equipes de F1 que compram os motores de outras desembolsam cerca de US$ 13 milhões para receber os motores necessários ao longo dos anos. Já na Indy os motores são mais baratos: dois milhões por oito motores.
Os testes da F1 custam outros US$ 15 milhões, enquanto na Indy saem apenas US$ 1 milhão — isso considerando que o orçamento de testes é limitado por regulamento na F1.
A taxa de inscrição no campeonato também é incluída na conta, obviamente: a Fórmula 1 cobra US$ 500.000, enquanto a IndyCar pede US$ 456.000 – US$ 12.000 por carro em cada corrida.
O campeonato
Em 2017 o campeonato da Indy tem 15 equipes e 29 pilotos, e está sendo disputado em 17 etapas — seis ovais e 11 mistos/rua. Para cada prova, contudo, classificam-se apenas 26 carros — exceto na Indy 500, onde largam 33 pilotos. Há disputa de construtores (os fornecedores de motor) e pilotos, mas não de equipes.
O sistema de pontuação prevê pontos para todos os pilotos, do vencedor ao último colocado. O primeiro colocado ganha 50 pontos, o segundo 40 e o terceiro 35. Da quarta posição até a décima, a diferença entre uma posição e outra é de dois pontos — de 32 (4º) a 20 (10º). Da 11ª posição até a 24ª, a diferença de pontos é de apenas um (de 19 a 6 pontos. Os pilotos que ficarem na 25ª posição ou abaixo disso levam somente cinco pontos.
Na Fórmula 1 atualmente são dez equipes e com dois carros cada, somando 20 pilotos. Em 2017 o campeonato tem 20 etapas, que são disputadas por todos os 20 pilotos. Há disputa de construtores (como são chamadas as equipes pelo regulamento) e pilotos.
O sistema de pontuação distribui pontos apenas para os 10 primeiros: 25 pontos para o vencedor, 18 para o segundo colocado, 15 para o terceiro, 12 para o quarto, 10 para o quinto, 8 para o sexto, 6 para o sétimo, 4 para o oitavo, 2 para o nono e 1 para o décimo.