Os carros da Dallara são quase onipresentes no automobilismo. Parece uma afirmação ousada, mas é verdadeira: a companhia italiana Dallara Automobili, fundada em 1972, é uma das mais mais conceituadas fabricantes de carros de corrida do planeta. Ao longo das décadas, seus projetos correram em provas de longa duração, na Fórmula 3, na Fórmula 1, nos ralis e em corridas de turismo. Além disso, a Dallara projeta e fabrica todos os monopostos da Fórmula Indy desde 1997.
A Dallara nunca havia feito um carro de rua, contudo. Isto mudou no fim do ano passado, quando foi apresentado o Dallara Stradale – nome que, literalmente, significa “Dallara de rua”. Um nome simples e direto, que reflete perfeitamente a personalidade do carro: um carro que, como todo Dallara, foi feito para as pistas, mas que possui todos os equipamentos e respeita todos os regulamentos necessários para ser emplacado e rodar nas ruas. Mesmo que seja apenas no caminho entre a garagem e o autódromo.
Isto porque, apesar de ser um carro legalizado para as ruas, o Dallara Stradale é um brinquedo de pista, com construção monocoque em fibra de carbono com para-brisa removível e dois lugares, praticamente sem itens de conforto e conveniência. Ele foi feito para ser leve e veloz, e não para ser usado todos os dias como um carro normal. Ainda que, em tese, nada o impeça de ser usado como daily driver por quem estiver disposto a abrir mão de algumas coisas, como um banco traseiro, sistema de som ou ar-condicionado.
Em sua configuração básica, o Dallara Stradale é uma barchetta, sem para-brisa ou portas: o piloto sobe nele como se fosse um monoposto, mesmo. É possível, contudo, colocar um para-brisa e fazer dele um roadster. Com um teto removível, ele se transforma em um targa. Por fim, adicionando duas portas que se abrem para cima, ao melhor estilo “asa de gaivota”, o Dallara Stradale se torna um cupê com teto transparente. Seu desenho é bastante atual e atraente, embora fique claro que a carroceria está mais para uma carenagem para dar ao carro um aspecto mais civilizado. Os para-lamas são vazados, os bancos não passam de suportes em formato de concha com almofadas e o interior com fibra de carbono aparente traz praticamente todos os comandos concentrados no volante, além de um painel digital e… não muito mais do que isto. O sistema de entretenimento do Dallara Stradale é o próprio carro.
Dito isto, o motor escolhido para ocupar a porção central traseira é algo bem menos exótico do que o visual e a configuração da carroceria poderiam sugerir (como um V8 feito com dois motores de Hayabusa, por exemplo): trata-se de um quatro-cilindros Ford Ecoboost de 2,3 litros com turbo e preparação Bosch para entregar 400 cv a 6.200 rpm e 50,9 mkgf de torque entre 3.000 rpm e 5.000 rpm. Considerando que o Dallara Stradale pesa 855 kg, estamos falando então de uma relação peso/potência de 2,1 kg/cv. Para efeito de comparação o Ford Focus RS, que tem uma versão de 350 cv do mesmo motor, pesa 1.557 kg – peso/potência de 4,44 kg/cv. Neste quesito, o Dallara Stradale é melhor que a do novo Porsche 911 GT3 RS, que pesa 1.430 kg e tem 520 cv, ou seja, 2,85 kg/cv.
Segundo a Dallara, o carro pode ir de zero a 100 km/h em 3,25 segundos, com velocidade máxima de 280 km/h. Considerando que o carro tem motor quatro-cilindros são números bem impressionantes: a aceleração é comparável à do novo Porsche 911 GT3 2018 (o não RS) e o Corvette Z06 da geração atual, ambos capazes de ir de zero a 100 km/h em 3,2 segundos.
Dito isto, o Dallara Stradale é exatamente o que o nome sugere: um carro da Dallara que pode rodar nas ruas. E os carros de corrida da Dallara são, em sua maioria, monopostos. Embora sua filosofia se aproxime daquela exercida por carros como o Ariel Atom e o Caterham Seven – um conjunto minimalista, com apenas o necessário para andar rápido – seu objetivo é outro: ele se comporta muito mais como um monoposto, exigindo muita perícia para ser levado ao limite e intolerante a erros. O Atom e o Seven são carros de condução mais solta.
Os caras do site do Top Gear estão entre os primeiros a publicar uma avaliação, e eles resumem muito bem a personalidade do Dallara Stradale.
Se você adora escorregar pela pista, controlando a traseira com o acelerador ou jogar um hot hatch nas curvas para curtir o sobresterço quando alivia o pé, o Stradale pode não ser bem o que você procura. Ele não é um carro para acelerar e curtir logo de cara; há um nível de habilidade e engenharia que torna possível cavar cada vez mais fundo e ainda assim encontrar mais potencial no carro, mais velocidade. Dito istoé interiamente possível, com o talento e a coragem necessárias, gerar mais de 2G de aceleração lateral nas curvas.
A primeira coisa que um amador precisa depois de comprar um Stradale é passar mais tempo na pista. Muito, muito mais tempo na pista. E a segunda coisa é um instrutor profissional. E então, com o tempo à medida que sua técnica melhora e você alcança os limites absurdamente altos do carro, então haverá a satisfação de ter conseguido dominá-lo. Então, é mais uma satisfação duradoura do que diversão imediata.
É errado esperar que o Stradale te faça gargalhar alto como faria um Caterham. Não é um carro para te fazer dar risada no track day. É um carro para ir levar até o autódromo, humilhar todo mundo e voltar contente para casa.
E ainda existe outro aspecto interessante. Apesar de a suspensão por braços triangulares sobrepostos ter acerto natural de pista, os três modos de ajuste permitem que se opte por uma configuração mais confortável que, de acordo com o pessoal do Top Gear, absorve impactos em piso irregular de maneira muito mais eficiente e confortável do que a de outros track day toys como o Radical SR8. Além disso, há um modo de condução que reduz a potência do motor para “apenas” 300 cv, a fim de torná-lo mais civilizado em uso… civil. Além disso, diferentemente destes carros mais old school, o Stradale tem controles de estabilidade e tração desenvolvidos pela Bosch.
A Dallara disse que vai produzir 600 exemplares do Stradale, e que os preços variam entre €155.000 (R$ 625.000 em conversão direta) pelo modelo básico e €190.000 (R$ 765.000) pela versão mais completa, com para-brisa, teto, portas (que na verdade são apenas janelas laterais que abrem para cima) e asa traseira ajustável.