Ok, se você olhar para nosso gigantesco arquivo de posts, vai ver que já dissemos algumas vezes que algo era “a coisa mais impressionante que já vimos”. Mas qual é o problema de uma hipérbole de vez em quando? Ainda mais porque esta réplica em miniatura de um protótipo de corrida da Ferrari é mesmo de deixar qualquer um boquiaberto.
Talvez você já tenha visto o vídeo abaixo. Trata-se de um quadro apresentado por Jeremy Clarkson no programa Jeremy Clarkson’s Extreme Machines em fevereiro de 1998. Um cabeludo Jezza se encontra com Pierre Scerri, o criador desta réplica em escala 1:3 da Ferrari 312 PB, protótipo da Ferrari que competiu entre 1971 e 1973 no Mundial de Carros Esporte da FIA.
A Ferrari desenvolveu a 312PB depois de uma mudança no regulamento do campeonato, que colocava um fim nos motores de cinco litros e limitava o deslocamento dos motores a três litros. A concorrência era forte: a Porsche tinha o 917K e o 908 e a Alfa Romeo apostava em uma versão spyder de seu protótipo 33.
A temporada de estreia não foi das melhores: os alemães dominaram e os italianos conseguiram duas vitórias com o Alfa Romeo 33/3. No ano seguinte, porém, a Ferrari venceu todas as corridas do campeonato — com exceção das 24 Horas de Le Mans. E por uma boa razão: o motor — um V12 com ângulo de 180º (na prática, um flat-12), deslocamento de 2.991 cm³ e generosos 450 cv, não suportou 24 horas sob testes. Quem diria, então, 24 horas participando de uma das corridas mais devastadoras do planeta?
A 312PB encerrou uma era no Mundial de Carros Esporte — depois dela, a Porsche tornou-se a maior força das provas de longa duração. E foi esta fama que inspirou o artista France Pierre Scerri, admirador da Ferrari desde criança, a construir a réplica mais fiel possível. Detalhe: isto aconteceu em 1980, e o carro ficou pronto em 1992. Isto mesmo: foram 12 anos de trabalho!
Parece muito tempo mesmo para a mais detalhada das réplicas em miniatura mas, uma vez que você compreende a escala do projeto, fica fácil entender. Scerri fabricou sob medida, sem exceção, cada um dos componentes do carro — dos pneus à carroceria, do motor à suspensão, dos freios ao sistema elétrico. Tudo mesmo.
Sua principal referência foram as fotografias do carro original — dezenas delas, que foram cuidadosamente analisadas por Pierre, que então fezos desenhos que esquematizariam todo o trabalho. Só esta etapa levou três anos e, uma vez concluída, chegou a hora de desenhar e fabricar os moldes de cada uma das peças.
O tamanho da dedicação de Pierre ao projeto foi gigantesca e envolveu muito aprendizado: ele teve de descobrir como fazer pneus para calçar as rodas com borracha de verdade, nas especificações corretas. Estudou mecânica para projetar o motor — uma réplica exata do flat-12 original e totalmente funcional, com injeção eletrônica e cárter seco porém com apenas 100 cm³ de deslocamento; e fez um curso de fundição de metais para fabricar o sistema de escape. Aliás, este levou mais três anos para ficar pronto, e Pierre fez inúmeras alterações para que o ronco da réplica tivesse a mesma “música de Ferrari” do original. Palavras do próprio.
A transmissão foi a única coisa que levou Pierre a buscar ajuda. Ele recorreu à Colleti, que forneceu a transmissão do carro original, e eles fabricaram versões em miniatura das engrenagens usadas pela 312PB — algo que ele simplesmente não conseguiria fazer com a máquina de usinagem que tinha em casa. Tem até marcha a ré!
O mais impressionante é que o conjunto mecânico não é a única coisa funcional neste carro: no sentido mais literal possível da expressão, esta réplica é um autêntico carro de corrida em miniatura, com suspensão de verdade, faróis que acendem; freios que, bem, freiam; rodas que esterçam; painel de instrumentos que realmente mostram a quantas está o carro e até uma chave de ignição que realmente liga o carro.
Em tese, não há nada que impeça que a réplica seja dirigida por aí com exceção da ausência de alguém pequeno o bastante para entrar nela. Caso um piloto tão pequeno existisse, ele se sentaria em um banco concha revestido com o mesmo couro usado no carro de corrida de verdade — Pierre se deu ao trabalho de procurar o mesmo homem que fez o serviço na década de 1970 e, por sorte, ele ainda tinha um pedaço do material em seu estoque.
O carro de Pierre ficou famoso quando apareceu na BBC em 1998 e, de tempos em tempos, o vídeo circula pelos sites de carros e redes sociais. Quando isto acontece, sempre surge a pergunta: o que esse cara aprontou depois? Bem, ele planejava construir mais réplicas, e acabou abrindo uma empresa para isto — a MPS-Sport Proto.
Agora ele tem uma equipe para o ajudar, mas continua fazendo questão de usar a maior quantidade de componentes originais possível. Três carros estão “sob construção”: outra 312 PB, uma 330 P4 e uma icônica 250 GTO. Não há uma previsão a respeito de quando os carros ficarão prontos, mas não tem problema. Quando se trata de uma arte tão incrível, a pressa definitivament é inimiga da perfeição.