Todo entusiasta já gastou alguns minutos (ou horas, dependendo de sua dedicação) no Youtube ouvindo roncos de carros. Seis-em-linha, V6, V8, V10, V12… cada um tem seu som particular e todos têm sua beleza. Mas e os quatro-cilindros? Eles também podem ter uma bela voz — os motores Alfa Romeo são uma prova disso —, mas a gente nem sempre repara. Vamos dar um jeito nisso agora, com a ajuda de ninguém menos que Jean Ragnotti, vencedor do Rali de Monte Carlo em 1981. E do seu carro, claro.
Como contamos neste post, o Renault 5 Turbo seria, a princípio, a resposta dos franceses ao Lancia Stratos, que um protótipo disfarçado de modelo de produção que estreou no WRC em 1974 e acabou com a festa da Renault, que ainda estava comemorando comemorando o título conquistado pelo Alpine A110 no ano anterior. Eles até tentaram reagir aumentando a cilindrada do A110, mas para superar o desempenho matador do Stratos seria preciso copiar sua receita de motor central traseiro e um chassi feito especialmente para os ralis.
Esta resposta veio na forma do Renault 5 Turbo, que também era basicamente um protótipo com a cara e o nome do compacto lançado em 1972. Ele deveria usar um motor V6 central traseiro, com direito a uma nova traseira projetada pelo italiano Marcello Gandini (sim, o projetista dos Lamborghini Miura e Countach) para permitir a instalação (e respiração) de um motor à frente do eixo posterior.
Por questões de custo, no entanto, a Renault optou por usar o motor Cléon 1.4 sobrealimentado por um turbocompressor Garret T3 que operava com 0,9 bar de pressão. A potência era 160 cv na versão de rua, mas chegava perto dos 300 cv na versão de rali. O modelo foi apresentado como conceito no Salão de Paris de 1978, mas só chegou ao WRC em 1981. E venceu logo de cara.
Race it, break it, fix it, repeat
A primeira etapa da temporada foi o Rali de Monte Carlo, em Monaco, e o francês Jean Ragnotti, então com 35 anos de idade, dominou a prova ao lado do navegador Jean-Marc Andrié. Não houve chance para o Talbot Sunbean de Guy Fréquelin e Jean Todt, que chegou ao final da prova três minutos depois, e nem mesmo o Audi Quattro de Hannu Mikkola e Arne Hertz — também foi a estreia do alemão, que no ano seguinte deixou todo mundo para trás com seu sistema de tração integral, estabelecendo um novo padrão de competitividade. Na época, o Renault 5 Turbo ainda tinha tração traseira.
O vídeo acima é uma bela compilação de alguns dos melhores momentos de Ragnotti no Rali Monte Carlo de 1981 — com direito a ângulos onboard e de câmeras estrategicamente posicionadas no circuito. Dá para ter uma boa ideia do que era competir naquela que, para muita gente, foi a era de ouro dos ralis.
Mas o mais bacana é que, 35 anos depois, Jean Ragnotti se encontrou novamente com o exato carro com o qual venceu em Monte Carlo naquele 1981. E o palco não poderia ser melhor: foi durante o Monte Carlo Historique, rali de regularidade para carros que competiram décadas atrás. A última edição aconteceu no último mês de fevereiro.
E o carro está plenamente em forma, como dá para ouvir no clipe abaixo. São apenas 45 segundos de filmagem, que foi feita pouco antes da largada, mas os estalidos do quatro-cilindros são simplesmente animais. Vamos perguntar mais uma vez: quem disse que motor de quatro cilindros não ronca bonito?
Se isto não é ação suficiente para você, não se preocupe. Aos 70 anos, Ragnotti continua um cara bem ativo ao volante. Basta ver o que ele aprontou com outro Renault 5 — um Maxi Turbo, com motor 1.6 de 350 cv — no Goodwood Festival of Speed 2013, quando subiu a montanha escorregando a traseira e dando giros de 360° como se fosse a coisa mais fácil do mundo.