Entusiastas do mundo todo conhecem as qualidades dinâmicas do Ford Ka de primeira geração. Mesmo equipado com um motor 1.0 de 65 cv (caso do modelo brasileiro), seu comportamento dinâmico estimula uma direção mais empolgada. Por outro lado, isto também significa que ele tem potencial para se tornar uma bela cadeira elétrica — é só colocar um motor maior e (bem) mais potente. Que tal um Cosworth?
Cosworth e Ford andam juntas há tempos: a fabricante de motores e componentes ajudou a marca do oval azul a desenvolver alguns de seus esportivos mais icônicos — entre eles, o Ford Escort RS Cosworth (leia nosso especial sobre ele aqui!). E foi justamente de um Escort Cossie que veio o motor deste Ford Ka do Reino Unido.
O Ka Cosworth pertence ao britânico Richard Philips, conhecido no fórum PassionFord como “Richie”. Ele começou a construir o carro usando como base um Ford Ka que seria vendido em partes por seu dono anterior — e ainda bem que isto não aconteceu, porque o mundo perderia um dos project cars mais legais que conhecemos em termos de visual, funcionalidade e capricho em sua execução.
Todas as etapas do processo foram documentadas no tópico do fórum, que foi criado em dezembro de 2007 e hoje tem 50 páginas. Nele, Richie definiu sua prioridade: fazer um sleeper com o qual pudesse andar nas ruas sem chamar muita atenção, mas que fosse monstruoso nas pistas. E ele chegou a conclusão de que, para tal, precisaria converter o carro para tração traseira.
A potência ficaria por conta de um Cosworth YB — o motor turbo de dois litros com comando no cabeçote do Escort RS Cosworth que, em configuração original de rua, entregava 220 cv a 6.250 rpm e 29,6 mkgf de torque a 3.500 rpm. Com ele, o Escort Cossie era capaz de chegar aos 100 km/h em 6,3 segundos. Em um carro mais leve como o Ka (que pesa cerca de 900 kg), o estrago deve ser ainda maior, certo?
Certo, mas Richie queria algo mais — algo na casa dos 300 cv. Para tal, ele trocou a turbina Garrett T3/T04B por uma T34 .63 — depois de fazer todas as adaptações necessárias para mudar a tração de lugar. Na Europa, existem adaptações para não precisar trocar a posição do motor — em carros como o Fiesta de quarta geração e o Ka, que compartilham plataforma, alguns entusiastas colocam o câmbio do Lancer Evolution (!). Contudo, Richie decidiu que usaria o câmbio do Escort “Cossie” e, assim, instalaria o motor em posição longitudinal.
Para isso, foram necessários alguns cortes no cofre do motor e novos suportes sob medida, além da fabricação de um novo túnel de transmissão — por sorte, manter a estética do interior original não estava entre as prioridades de Richie. O motor foi instalado em posição recuada, o que exigiu a instalação de um novo painel — no caso, vindo de um Fiesta de quinta geração.
Por outro lado, o exterior foi planejado de forma impecável: Richie instalou em seu Ka o body kit do Ford SportKa — versão esportiva do Ka na Europa, que tinha um visual bastante agressivo e para-lamas alargados, e um motor 1.6 de 93 cv (nosso XR era o Ka mais potente do mundo, com 95 cv). A carroceria, que era vermelha, deu lugar a um belo tom de cinza metálico, e as janelas traseiras foram escurecidas para esconder o interior depenado e equipado com bancos de competição e gaiola.
Os para-lamas alargados também serviram para acomodar rodas maiores; de início, um jogo de rodas Compomotive de 17 polegadas, passando por mais três ou quatro setups diferentes de rodas e pneus — sempre com foco na funcionalidade e na capacidade de abrigar os freios AP Racing.
Contudo, um carro rápido não serve para muita coisa se não tiver um bom acerto de suspensão. Richie manteve o sistema McPherson com subchassi original do Ka na dianteira, enquanto a traseira usa um sistema multilink inspirado nos carros de rali do WRC.
Descrevendo desta forma, fica parecendo que Richie usou uma receita pronta e acertou tudo na primeira vez. Ledo engano: foram cinco anos de trabalho até que, em 2012, o carro finalmente andou pela primeira vez — e foi direto para a Ford Fair, um dos maiores encontros de entusiastas da marca no Reino Unido. Foi ali que o carro começou a ficar famoso fora da comunidade PassionFord, tendo ganhado destaque em uma matéria do Speedhunters. Meses depois, o Ka Cosworth foi capa da revista Fast Ford, que provavelmente é a maior publicação para entusiastas da marca em toda a Europa.
Acontece que Richie fez o carro para detonar em track days. E foi exatamente isto o que o Ka Cosworth fez nos últimos dois anos — período em que também recebeu algumas melhorias técnicas — bloco reforçado, algumas reprogramações no módulo de controle e retrabalho no cabeçote. Atualmente, o conjunto entrega 345 cv — que, como dá para ver, são muitíssimo bem aproveitados.
O mais legal é que, depois de tudo ele ainda pode andar nas ruas — até porque deve ser mais fácil registrar carros extensamente modificados no Reino Unido do que no Brasil, por exemplo. Ou seja: Richie pode entrar no carro, dirigir até o autódromo e ainda se divertir ao volante no caminho para casa. Não é o que todo mundo quer quando monta um belo projeto?