Aqui estamos nós de novo, 2017, primeiro papo do ano. Na verdade este post deveria ter ficado pronto no ano passado, mas é realmente difícil simplificar a transferência de calor. Essa área específica da termodinâmica, do meu ponto de vista é uma das que mais impactam o nosso dia-a-dia. Pois se o modelamento de cálculo não for preciso teremos problemas que podem ir desde uma simples sala que não é refrigerada corretamente até um acidente de avião (lembrem-se, o acidente do Air France 447 iniciou-se por uma falha dos tubos Pitot que permitiam a formação de cristais de gelo em seu interior).
Para fechar a sequência de sobrealimentação vamos falar sobre um item importante para qualquer projeto que possua indução forçada. Os intercoolers ou mais corretamente trocadores de calor da carga de ar existem até mesmo na natureza. Exemplo disso são as orelhas dos elefantes e nossos testículos (!), que possuem uma malha de veias especificamente para resfriar o sangue que retorna para a parte interna do corpo. Como eles funcionam (os intercoolers, claro), quais tipos, os efeitos colaterais, e claro, como fazer a melhor escolha. Esses serão os nossos tópicos nos próximos parágrafos.
Por que ficar frio é bom?
Se vocês leram esse texto e este aqui. Perceberam que sempre que o ar é comprimido parte da energia transferida para ele se torna calor. A quantidade de calor transferida determina a eficiência de compressão de cada equipamento. Quanto menos eficiente for o compressor, mais calor será transferido para a massa de ar.
E esse calor nos leva a dois pontos chave:
– Segurança: imagine o ar saindo do compressor a 120°C. Então ele segue para ser admitido pelo cilindro perdendo pouco calor nesse caminho (vamos supor que ele entre a 100°C no cilindro). Ele será novamente comprimido, nessas condições a temperatura pode facilmente ultrapassar os 450°C. A temperatura de autoignição da gasolina fica em torno dos 250°, ou seja, quanto maior a temperatura maior será a tendência à pré detonação até chegarmos ao ponto da autoignição como num motor diesel. Mas diferentemente deste tipo do motor a ignição acontece sem controle algum e a tendência é que ela gere grandes danos ao motor.
– Desempenho. Primeiramente o ar mais quente é menos denso que o ar mais frio. Então quando o cilindro é preenchido a quantidade de oxigênio ali será menor que a encontrada num ar admitido a 30°C por exemplo. Isso acontece por conta da agitação dos átomos que acabam se afastando cada vez mais uns dos outros com o aumento de temperatura. Então com menos oxigênio no cilindro, menos combustível pode ser queimado e menos potência gerada. Além disso com o crescimento da tendência à pré detonação o ponto de ignição deve ser atrasado cada vez mais para afastar o risco. Com isso o ponto de ignição se afasta ponto de vantagem mecânica do conjunto biela/arvore de manivelas (sobre esse assunto aguardem o próximo post) e menos potência pode ser gerada nessa condição.
Por isso é de essencial usar um trocador no caminho entre o compressor e os cilindros do motor. Agora que sabemos o porquê, vamos ao como. Quando o ar quente sai do compressor (na verdade antes mesmo disso) ele passa a transferir calor para o ambiente através das paredes dos dutos. Porém os tubos têm uma área relativamente pequena para que ocorra uma boa transferência do calor.
O que os trocadores fazem é aumentar essa área significativamente através de um número maior de dutos (de menor área individual) e aletas. Além de aumentar a turbulência do fluido para permitir uma melhor interação entre as moléculas aumentando a troca térmica. Quanto maior for a diferença entre as temperaturas de entrada e saída do trocador maior é a eficiência deste.
Definições para a melhor escolha
Como na maioria dos equipamentos que compõem um projeto a escolha de um trocador é norteada pelo compromisso entre duas características. No caso dos intercoolers o compromisso fica entre a capacidade de resfriamento da massa de ar e a perda de carga do fluxo que passa pelo intercooler. Um intercooler escolhido devidamente, ou mesmo desenhado especificamente para o seu projeto, deve gerar uma perda menor que 3 PSI (0,2 bar) e ainda sim retirar o máximo de calor possível do ar que passa por ele.
Um bom intercooler começa pela parte de uma boa distribuição do fluxo entre todos os seus canais. Para isso os difusores e coletores devem ser corretamente projetados, de modo que não haja caminho preferencial. Observem a imagem acima, ela é uma demonstração da dinâmica do ar dentro de um trocador com um difusor deficiente.
Observe como o fluxo passa prioritariamente pela porção inferior da colmeia. Além disso podemos ver o turbilhonamento do fluxo dentro do difusor, isso gera uma perda de carga significativa. Por conta dessas falhas o trocador acaba sendo menos eficiente, pois não utiliza efetivamente toda a sua área. Agora observe a foto abaixo.
Essa é a Ligier JS23 do campeonato de 1984. Com o famoso Renault V6 EF15. Esses motores chegavam aos 1000 HPs no modo qualify, operando com 4,5 bar. Mas voltando ao nosso foco, vejam como o coletor tem sua área ampliada a medida que o fluxo vindo da colmeia também aumenta. Esse tipo de construção faz o fluxo se distribuir por toda a extensão da colmeia, além de manter uma alta velocidade de deslocamento.
Então, senhores, o aumento ou diminuição gradativa da área é o ideal para a construção dos difusores e coletores, pois cada passagem da colmeia se comporta como um duto que extrai parte do fluxo no difusor e adiciona parte dele no coletor. Outro ponto a ser observado é o sentido de deslocamento do fluxo em relação a colmeia. Observem que o deslocamento é perpendicular. Isto é essencial para evitar o turbilhonamento do fluxo e reduzir as possibilidades da formação de um caminho preferencial.
Após isso é importante levar em conta a razão entre capacidade térmica necessária e o volume pretendido. Esse dado é importante para estimarmos o delay que o trocador integrará ao sistema. Um trocador com capacidade térmica maior que a necessária fará pouca diferença na temperatura de saída, quando esta já está próxima da temperatura ambiente. Mas o volume necessário para que a maior capacidade térmica exista causa uma grande diferença no tempo de resposta do sistema de admissão. Isso acontece pela compressibilidade dos gases. Para entendermos melhor esse evento, precisamos enxergar o que acontece dentro do compressor.
No instante em que a borboleta se fecha o fluxo que seguia em direção aos cilindros é bruscamente reduzido, mas o compressor continua a girar enviando mais ar em direção a borboleta. Isso faz com que a pressão após a descarga se eleve. Com a maior pressão há o aumento de densidade, ou seja, há mais massa num mesmo volume. Essa maior massa criar uma maior resistência ao movimento do rotor e aumenta a carga sobre o eixo, pois a turbina continua a enviar energia para compressor.
A borboleta de admissão se abre novamente uma onda depressiva (sim, a depressão não é somente um estado emocional) segue em direção ao compressor, esta onda é responsável por aliviar a carga aplicada sobre o compressor, permitindo que ele acelere novamente. Porém antes que isso aconteça a massa de ar extra gerada pelo grande volume do intercooler precisa ser aliviada, e isso demanda tempo. Quando a carga é aliviada e o compressor volta a acelerar, uma onda inversa à anterior se desloca em direção a borboleta comprimindo o ar, e mais uma vez o volume do intercooler interfere no tempo desse evento.
São apenas milissegundos, que se somarmos o tempo de descarga, carga, a resposta ao atrito dos mancais de deslizamento do eixo e um conjunto de compressor e turbina superdimensionados, encontraremos um lag de segundos. E esses segundos entre o momento que você afunda o pedal da direita e a resposta do turbo tornam-se séculos, pode acreditar.
Então para que tenhamos um intercooler adequado ao nosso projeto, devemos começar o cálculo da capacidade de fluxo dos canais internos. Com isso evitamos que um trocador restritivo gere uma perda de carga significativa. Se fossemos seguir a linha de pensamento mais simplista. Quanto mais largos os canais, menor seria a restrição causada por estes. Tudo resolvido. Mas aqui temos um jogo de ganha e perde. Com dutos largos temos menor velocidade de fluxo e esta tem relação direta com a capacidade de transferência de calor. Então se a velocidade cai, o intercooler resfria menos.
Calculando o fluxo no core
Para que tenhamos a maior eficiência possível o fluxo dentro do core deve partir do regime transitório. Assim garantimos que no momento onde houver a maior carga térmica a interação das moléculas será grande o suficiente.
Mas aqui temos um compromisso também. Se a velocidade for baixa demais não teremos uma boa eficiência, porém se ela for alta demais a turbulência gera grande perda de carga e até mesmo erosão. Por isso a velocidade recomendada para os gases (que não possuam sólidos em suspensão) deve estar entre 10 e 30 metros por segundo. Já a perda de carga deve ficar entre 2 e 5 PSI. Com essas informações em mente vamos calcular o diâmetro teórico para uma tubulação que servirá de referência para determinarmos a área da secção transversal do trocador.
Usando como base os dados que criamos nesse post, vamos encontrar o diâmetro ideal para a vazão máxima de 8,9 kg/min (0,1483 kg/s). A densidade do ar é de 1,3165 kg/m³.
Encontramos o diâmetro ideal, mas quando tivermos a vazão mínima da faixa que definimos previamente será que o fluxo terá turbulência o bastante para que a troca térmica aconteça de modo satisfatório?
Para determinar se a velocidade do fluxo é adequada, nós utilizamos o número de Reynolds (Re), que é uma grandeza admensional usado para determinar o estado de deslocamento do fluxo, ou mais corretamente o regime de escoamento de um fluido. Existem basicamente dois regimes de escoamento:
– Laminar: o fluido divide-se em camadas bem definidas e não há interação entre estas camadas. E estas deslocam-se em velocidades diferentes, sendo que a velocidade máxima é encontrada no centro do fluxo. Em tubulações o fluxo é considerado laminar até o valor de 2300 para o número de Reynolds.
– Turbulento: o fluido não possui camadas definidas, havendo movimento aleatório das moléculas, assim a interação entre as partículas é intensa. A velocidade de deslocamento do fluido tende a ser igual em qualquer ponto. Em tubulações o fluxo turbulento normalmente é encontrado com valores do número de Reynolds acima de 2300.
Para os nossos cálculos a vazão mínima considerada é de 2,5 kg/min (0,04167 kg/s) e a viscosidade dinâmica de 0,00002094 m²/s, então:
Assim vemos que o fluxo continua turbulento, mesmo em velocidades mais baixas. Então o duto com diâmetro ideal de 0,0756 m (aproximadamente 3 polegadas) possui uma área de 0,004489 m². Essa seria a mesma área aplicada ao intercooler então? Não amigos, se vocês observarem a foto acima, é possível perceber que há barras que fazem parte da estrutura do plano cruzado dos outros dutos. Como não há fluxo através destas barras devemos considerar uma área 45% maior que a ideal. Então:
Agora devemos selecionar o core mais adequado para o espaço de instalação disponível. Cores para trocadores do tipo ar / ar preferencialmente não devem ter largura maior que 127 mm (cinco polegadas), pois valores acima disso causam restrição ao fluxo externo, sendo necessária uma maior velocidade de deslocamento do veículo para que o trocador se torne mais eficiente.
Alguns fornecedores e fabricantes de intercoolers usam regras de aproximação para determinar a área interna de fluxo. Segundo essa regra para cada cavalo de potência desejado são necessários 4,5 cm² de área. Por esse motivo vemos anúncios falando “Intercooler para XYZ cavalos”. Mas essa é uma aproximação grosseira, pois não leva em conta fatores como a densidade do ar que flui pelos dutos e a viscosidade. Fatores que causam uma grande diferença na precisão do cálculo. Além disso, a área frontal é de imensa importância pois é ela em conjunto com a área da secção transversal que determinam o delta de temperatura entre a entrada e a saída. E se você deseja uma temperatura de admissão específica é necessária muito mais informação para se obter um resultado sólido. E isso nos leva ao próximo tópico.
Transferência de calor
Esse é o ponto onde a conversa se complica mais um pouco. A partir daqui falaremos realmente de calor, condutividade, rejeição térmica e outros conceitos que são realmente complicados. Procurei explicar da forma mais simples que o assunto permite. Então tenham paciência e vamos lá.
Como falamos aqui, quando o ar sai do compressor ele absorveu uma grande quantidade de energia em forma de calor e para saber o qual o tamanho correto do trocador, precisamos definir a quantidade exata de calor que foi absorvido na condição de maior carga. Pois este valor será a nossa meta de energia a ser retirada do sistema. Mas para sabermos a quantidade de calor absorvido, precisamos determinar a temperatura de descarga do compressor. Então:
Conhecemos a temperatura de entrada no intercooler, então vamos considerar a temperatura de entrada do ar frio a mesma utilizada para a admissão do compressor mais acima, 313,15 K (40°C), pois temos temperaturas mais altas conforme no aproximamos mais do asfalto. Você pode definir a temperatura ambiente buscando a média anual de temperatura da sua cidade e região e adicionar aproximadamente 10°C para termos uma melhor aproximação da temperatura do ar próximo ao asfalto.
Como temos apenas os valores de temperatura de entrada definidos, a nossa alternativa é utilizar o método de efetividade para analisarmos a transferência de calor entre o ar que vem do compressor (fluido quente) e o ar do ambiente que percorre o trocador externamente (fluido frio). Nesse método as temperaturas de entrada são definidas, mas as de saída não são conhecidas. Ao menos a vazão de um dos fluidos é especificada, bem como o coeficiente global de transferência de calor (U).
Esse coeficiente, como o próprio nome já indica, leva em consideração a condutividade térmica de todo o conjunto. É uma média entre a condutividade do fluido quente, do fluido frio e do metal que compõe a colmeia do trocador. Vou deixar aqui os valores e condições de cada um dos elementos:
O processo a ser analisado não possui ponto de operação constante (processo dinâmico), temos que considerar a pior condição de operação, para que em todos os outros pontos estejamos acima do mínimo definido. Então vamos analisar e definir os parâmetros que precisamos.
Sabendo que a capacidade térmica específica para a condição de entrada do fluido quente é 1,013 devemos calcular a capacitância deste:
Agora vamos encontrar a troca de calor máxima e a troca real, para com isso determinarmos a efetividade do trocador. A troca de máxima acontece quanto temos o mínimo de calor retido pelo meio (menor capacitância entre os dois fluidos) e a máxima diferença de temperatura entre eles. E onde podemos encontrar essa maior diferença? No momento em que os dois fluidos estão entrando no trocador. Como determinamos que a capacitância do fluido quente sempre será menor que a do fluido frio, a Cq sempre será usada como referência de mínimo. Então:
Com a efetividade do nosso trocador definida podemos então calcular o número de unidades de transferência. Considerando que o nosso trocador seja do tipo placa aletada, o fluido quente se separe em correntes e que o fluido frio se mantenha misturado em corrente única quando entra no trocador, o modelo de cálculo que usaremos é:
Estamos perto de definir as dimensões da colmeia do nosso intercooler. Agora precisamos descobrir qual a área necessária para a troca térmica. Para isso vamos utilizar outra equação do número de unidades de transferência e converte-la para a equação de área:
Finalmente temos as duas áreas. 0,065 m² (65 cm²) para a área da face interna da colmeia e 0,042 m² (42 cm²) para a área de topo. O mercado disponibiliza várias dimensões para a os cores, então vamos basear a nossa escolha nos cores com 1,25 polegadas (3,175 cm). Assim calculamos as dimensões a partir da área de um retângulo:
Com esses valores vejamos na lista abaixo qual deles mais se adequa.
Assim encontramos um core de 1,25” x 6,60” X 6,00” (3,175 x 16,764 x 15,24 cm) que vai além do que precisamos, mas é a medida comercial disponível.
Trocadores ar/água
E se ao invés de usarmos um trocador do tipo ar / ar optássemos por um do tipo ar / água? Bom o procedimento de cálculo seria o mesmo visto acima, mas alguns fatores mudam Veja abaixo:
– O coeficiente global de transferência de calor será maior, pois a água passa a ser o fluido frio
– A capacitância térmica do fluido frio pode ser determinada facilmente, pois esta dependerá da quantidade de água que a bomba do sistema de refrigeração move.
Mas quais as vantagens em utilizar esse tipo de trocador? A primeira e mais evidente vantagem é a utilização de um trocador mais compacto, pois com um maior coeficiente de transferência, precisamos de menos área para transferir a mesma quantidade de calor. Esse sistema mais compacto nos leva a segunda vantagem. Menor lag, pois se temos um menor volume acumulado entre o compressor e a admissão, menor será o tempo de deslocamento da onda de depressão e consequentemente da resposta do turbo. A terceira grande vantagem é um sistema mais estável, que sofre menos com a variação da temperatura ambiente. Porém há desvantagens também. Como o maior custo, pois são necessárias mangueiras, bomba d’água e outro trocador (radiador) dedicado ao sistema. Além disso, há uma maior necessidade de manutenção quando comparamos com um intercooler convencional. Pois há água no sistema, e os riscos de vazamento aumentam.
Injeção de água
Outro método bastante empregado para resfriar uma corrente de ar é a refrigeração por contato direto. Sabe aquelas torres verdes com enormes ventiladores no topo, que vemos em shoppings, prédios comerciais e até mesmo usinas nucleares? Elas usam o mesmo principio de resfriamento. A absorção de calor por vaporização. Sempre que a matéria muda de estado físico ela absorve calor para que tal fenômeno ocorra. Exemplo disso é uma panela de água fervente, a temperatura se mantém estável a 100°C até que toda a água ali existente evapore. Ou seja, mesmo adicionando mais calor através da chama a temperatura não se altera. Então se tivermos um processo onde a quantidade de calor é constante, quando a vaporização se iniciar a temperatura do processo irá cair.
Eu sei que é um pouco complicado com essas palavras. Então se imagine saindo de uma piscina num dia quente. Assim que você põe os pés fora d’água a sensação de menor temperatura começa. Isso é resultado da vaporização da água que está sobre a sua pele, que leva o calor embora. O suor também tem esse objetivo, evaporar água para reduzir a temperatura do corpo.
Mas á água possui um calor latente de vaporização bastante alto (2256 kJ/kg) e em determinadas situação a sua vaporização é mais difícil. Por isso é adicionado um álcool (Etanol ou Metanol) formando uma mistura que se vaporiza mais facilmente. Vamos supor que nossa mistura tenha a proporção 50/50 e o Etanol (846 kJ/kg) foi o álcool escolhido, então 1 kg de mistura terá um calor latente de vaporização de 1551 kJ/kg. A proporção máxima de água recomendada para essa mistura é de 80% de água e 20% de Etanol. Daí é só calcular para descobrir o novo calor latente.
Esse tipo de sistema normalmente é usado de forma suplementar, quando já temos um intercooler, mas por razões de espaço físico ou lag não se pode utilizar um trocador ainda maior para refrigeração. Então a injeção de água fica responsável pela refrigeração extra numa faixa de maior carga térmica.
Observem o vídeo acima, logo no início o autor informa a proporção utilizada, 70/30 para Metanol e água respectivamente. No centro do vídeo a coluna A no melhor estilo V&F traz uma série de indicadores. Iniciando por baixo temos um manômetro, que indica a pressão de admissão, acima dele um termômetro, que indica a temperatura de descarga do compressor e a temperatura de admissão do motor (após o intercooler). E finalmente mais acima o indicador de operação do sistema de injeção de água.
Vejam que na maior parte do tempo esse “relógio” (sinceramente não gosto de chama-lo assim, acho que pelo costume de indústria) fica inativo, mas aos 2:10 o motorista afunda o pedal direito e o sistema passa a operar, baixando a temperatura de admissão de 272°F (133°C) para 93°F (34°C). Notem que aos 2:08, quando somente o intercooler refrigerava o sistema, a temperatura de descarga era de 182°F (83°C) e a de admissão do motor era de 103°F (39,5°C).
Este outro vídeo mostra o mesmo sistema de injeção de água, agora instalado na admissão de um supercharger que alimenta um Top Diesel Dragster. Esse tipo de instalação é mais comum em motores de competição. Assim como a injeção na admissão dos turbos. Não é o tipo de configuração recomendada para o dia a dia devido a erosão que as gotículas de água causam aos rotores. Imagine o rotor de um turbo girando a 105 mil rpm e ele é atingido por gotas minúsculas de água. Com essa velocidade angular, o impacto de qualquer material gera erosão. No caso de um supercharger, mesmo com menor velocidade há erosão a camada cerâmica que reveste os fusos. Então galera, para uso civil o melhor mesmo é instalar a injeção após o compressor e assim preservar o seu suado bolso.
A BMW adotou a injeção de água em seus motores S55B30. O principal objetivo foi manter o conjunto de refrigeração do ar compacto, mesmo para uma potência elevada. Além disso, os vapores de água e Metanol permitem uma queima mais controlada, então o ponto de ignição pode se aproximar ainda mais do valor ideal. Permitindo maiores ganhos de potência e menor consumo de combustível.
Calculando a injeção de mistura
Como saber a quantidade de mistura água / Etanol deve ser injetada no caso no nosso motor teórico? Bom, vamos partir da temperatura de descarga do intercooler que havíamos determinado que na pior condição seria de 50°C. Com a minha mistura eu quero levar a temperatura de admissão do motor para um patamar abaixo da temperatura de admissão do turbo (40°C). Eu quero que o ar chegue ao motor com 35°C de temperatura. Sim meu amigo, usando um sistema combinado você pode ter uma temperatura final mais baixa que a temperatura de admissão. Não é feitiçaria, é pura engenharia!
Usaremos a fórmula de troca de calor para determinarmos a quantidade de calor que a mistura deve absorver para que a temperatura caia ao valor que determinamos. E a partir dessa quantidade de energia vamos poder descobrir a quantidade de massa que deve ser injetada na corrente de ar. Então:
Ok, temos 2,25 quilowatts (ou 2,25 kJ/s) para vaporizarmos a mistura. Se nossa proporção 50/50 tem um calor latente de vaporização de 1551 kJ/kg basta dividirmos os valores para encontrarmos a massa que deve ser injetada.
Então precisamos de apenas 1,45 gramas por segundo para que a temperatura chegue ao valor desejado. Agora precisamos saber a vazão volumétrica para determinarmos qual bico injetor atenderá a nossa demanda. Para isso basta sabermos a densidade da nossa mistura. Se a densidade da água é 1000 kg/m³ e o Etanol 789 kg/m³ então a mistura terá densidade de 894,5 kg/m³. Dividindo a vazão mássica pela densidade temos 0,000001624 metros cúbicos por segundo ou 97 mililitros por minuto. Há um bico comercial com vazão de aproximadamente 101 ml/min, só um pouco acima do que precisamos.
E o mais legal da injeção de água é que ele também pode ser usado em motores naturalmente aspirados, para que a temperatura de admissão fique abaixo da temperatura ambiente, gerando mais ganhos. Além disso, a pressão de vapor dentro do cilindro ajuda a gerar um pentelhésimo a mais de torque. Bom, chega de falar, vejam, ouçam e se deliciem com o V8 dessa M3 que usa standoff injectors para a injeção de água.
Bem amigos, terminamos por aqui esse papo. Espero que ele possa ajudar vocês em suas futuras escolhas. E no nosso próximo encontro vamos falar sobre o “miolo” dos motores. Blocos, pistões, bielas. Configurações, balanceamento harmônico, variações de arranjo e muito mais. Até a próxima!