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Car Culture

Isto não é uma Ferrari 250 GTO

Já discutimos algumas vezes a questão dos restomods – projetos que envolvem pegar um carro antigo e, além de restaurá-lo, realizar algumas modificações estéticas e mecânicas para torná-lo mais moderno em alguns aspectos. O problema é que “modificar” e “melhorar” não são sinônimos, e isto acaba tornando alguns projetos de restomod um tanto… indigestos, especialmente no que diz respeito ao visual. Alguns restomods tentam conciliar elementos modernos com linhas clássicas e isto tem altas chances de causar conflitos estéticos e, na melhor das hipóteses, deixar o carro bonito, mas datado. E mesmo toques discretos e bem executados podem deixar um carro antigo muito artificial ou “perfeito demais” – o que chamamos de over-restoring, algo muito comum nos carros dos anos 50 e anteriores.

Claro que, no fim do dia, preferências assim são totalmente pessoais – e há até quem curta a às vezes,ideia de um clássico modernizado e tolere alguns exageros. Mas, às vezes, a sensação de que o mercado está ficando saturado com este tipo de projeto é inevitável.

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Assim, ver um carro como esta Ferrari 250 GTO é certamente um alívio. Fora alguns pequenos detalhes, ela manteve as formas clássicas de um dos carros mais bonitos e valiosos do planeta. Só que há uma pegadinha: na verdade, esta não é uma 250 GTO legítima, embora tudo o que está abaixo desta carroceria seja legitimamente Ferrari.

Will Tomkins, o idealizador, construtor e proprietário deste carro, tinha nas mãos o problema que todos nós gostaríamos de ter: ele queria poder dirigir uma Ferrari 250 GTO como se deve, mas só tinha o motor de uma 575 Maranello, o chassi de uma 400i, e uma carroceria de alumínio – uma reprodução praticamente perfeita, construída artesanalmente, da 250 GTO. Vida difícil, esta…

Falando sério, porém, Will era o cara para este serviço: desde a década de 1980 ele dedica-se à restauração e modificação de carros clássicos com sua empresa, a Project Heaven. A diferença, no caso da 250 GTO, foi o caráter pessoal do projeto – tudo foi feito sob medida de acordo com seus próprios planos, sem a interferência de ninguém. O único objetivo de Will era criar um automóvel que pudesse ser conduzido como se deve, sem precisar se preocupar com uma etiqueta de dezenas de milhões de dólares (literalmente).

Mais valiosa que ouro: como as Ferrari 250 GTO se tornaram os carros mais caros do mundo

Tudo começou na década de 1990, quando Will comprou duas Ferrari 400i – uma das versões do gran turismo que a Ferrari vendeu do início dos anos 70 ao fim dos anos 80, com linhas retas e sóbrias e um V12 debaixo do capô. Inicialmente, a ideia era transformar os dois carros em um só. Então, ele encontrou a carroceria de alumínio à venda e mudou completamente de ideia.

Os componentes estruturais das duas 400i foram aproveitados para construir um chassi do tipo spaceframe feito sob medida para o projeto. A estrutura recebeu o conjunto de suspensão da 365 GT4, que também cedeu o primeiro motor utilizado por Will. Antes da instalação, a carroceria foi modificada para ficar cerca de 10 cm mais larga e caber perfeitamente no chassi – é por isso que, ao olhar a “250 GTO” você consegue identificar algo diferente, mas não entende exatamente o que é. Will diz que a ideia era justamente afastar do carro a noção de se tratar de uma réplica da GTO, e conferir a ele uma postura mais atual e agressiva sem estragar as proporções gerais. Deu certo.

O carro foi montado originalmente com o motor da 365, um V12 bem mais próximo daquele que a 250 GTO utilizava originalmente, com carburação Weber e duplo comando nos cabeçotes. E Will fez questão de dar ao interior de sua Ferrari o mesmo aspecto “inacabado” – na verdade, um trunfo pelo alívio de peso – sem carpete ou tapetes, sem revestimento nas portas, ou qualquer outra coisa que fosse desnecessária para uma experiência ao volante crua e sem filtros. Claro, o túnel de transmissão foi forrado com couro costurado, mas você precisa enfiar sua mão no buraco das portas para abri-las, e não tem qualquer tipo de mordomia como ar-condicionado, direção assistida, ou mesmo um simples rádio.

Estes aspectos do carro não mudaram ao longo dos anos, e já garantiram a Will a experiência completa de uma Ferrari clássica – tanto que ele ficou com o carro por 15 anos antes de sua grande atualização: a instalação do V12 da Ferrari 575M Maranello, junto com o transeixo de seis marchas. Foi preciso modificar completamente a estrutura para acomodar o motor e mudar o câmbio de lugar, mas o trabalho – sem restrições de orçamento, mas de tempo – compensou: Will conseguiu melhorar a distribuição de peso do carro para perfeitos 50/50 com o tanque cheio e ele próprio ao volante.

Originalmente, o motor de 5,7 litros e cinco válvulas por cilindro da 575M (eis a razão para seu nome) desenvolvia 515 cv, o que já representaria um belo acréscimo em relação à potência original da GTO. Este motor, em especial, foi preparado com um novo sistema de admissão com ITBs que espiam por baixo de uma bolha de acrílico no capô – esta bolha, aliás, foi mais uma das concessões que Will não teve problemas em fazer em sua 250 GTO. Com um novo sistema de escape e uma reprogramação na ECU, o motor agora entrega 610 cv. É mais que o dobro da potência de uma GTO legítima, mas o chassi modificado e a suspensão garantem que a Ferrari possa lidar muito bem com tanta força.

Will optou por um acerto dinâmico mais voltado à pista, pois procurava a mesma crueza dos carros da década de 1960 para seu projeto – assim, apesar de ser emplacada e legalizada, a Ferrari é apenas razoável em vias públicas: seu lugar é na pista, onde a suspensão dura, os bancos concha, os cintos de quatro pontos, o V12 de cárter seco e o transeixo de seis marchas podem trabalhar à toda.

O que é mais difícil é definir até que ponto este carro é um restomod. Para Will, a questão é relativamente simples: legalmente, trata-se de uma 400i com o motor de uma 575M Maranello e uma carroceria de alumínio inspirada pela 250 GTO. Mas ele prefere chamá-la de 575 Speciale, em referência às versões limitadas de algumas Ferrari. A própria fabricante não pode impedi-lo de chamar seu carro de Ferrari porque a maior parte dos componentes é genuína – ainda mais agora que o desenho da carroceria da GTO não é mais protegido por copyright.

Agora que o carro está com Will há mais de 20 anos, ele decidiu vendê-lo – quer £ 655.000, o que dá mais de R$ 4,8 milhões em conversão direta. Ainda assim, uma GTO legítima já passou dos £ 50 milhões. Dá para chamar de pechincha?