Se você fizer uma rápida pesquisa pelos nomes dos três grandes hipercarros da atualidade — a Ferrari LaFerrari, o Porsche 918 Spyder e o McLaren P1, não vai encontrar nenhum comparativo entre os três na mesma pista, na mesma hora. Você vai até achar uma enquete que fizemos e alguns pegas em dupla (P1 e 918 Spyder se enfrentaram não uma, mas duas vezes). No entanto, nenhuma disputa tripla. Isto porque ninguém ainda realizou uma. Bem, até agora.
O extinto Top Gear (sim, porque o Top Gear que conhecemos não existe mais) prometeu, mas acabou antes de cumprir — e agora teremos que esperar o novo programa para ver o trio de apresentadores com o trio de hipercarros. Chris Harris está planejando fazer seu próprio embate, mas até agora só publicou um (belo) teaser — esse aí embaixo.
No entanto, os primeiros a transformar em realidade o sonho de milhões de entusiastas — colocar a Santíssima Trindade dos hipercarros para brigar pelo melhor tempo no mesmo circuito — foram os caras do The Supercar Driver, ou SCD, clube independente de superesportivos sediado nos EUA que realiza encontros e eventos como arrancadas em pistas de pouso, a fim de que seus membros possam curtir de verdade os automóveis ridiculamente caros e velozes que podem ter. Nós já falamos deles aqui, uma vez.
Falando em Santíssima Trindade, também falamos no FlatOut obre Paul Bailey, o cara que originou o termo. Isto porque ele foi a primeira pessoa no planeta a conseguir comprar uma LaFerrari, um McLaren P1 e um Porsche 918 Spyder. Nós até já mostramos aqui o vídeo feito quando ele foi buscar o braço alemão do trio.
Uma das dificuldades que a imprensa especializada encontra para fazer um comparativo deste calibre (e um dos motivos para que os dois duelos até agora tenham sido entre o McLaren P1 e o Porsche 918) é a burocracia que a Ferrari impõe para ceder carros à imprensa. Quando o fazem, existe a chance de que o carro tenha passado por um pequeno “tapa” antes de pegar a pista.
Por isso, mais vale ter bons contatos entre a comunidade dos donos de superesportivos. Para a sorte dos caras do The Supercar Driver, Paul é um dos membros mais ativos do clube, sempre envolvido na organização dos eventos e presente com um ou mais dos preciosos itens de sua coleção. Naturalmente, ele não se incomodou em ceder sua Santíssima Trindade para que o SCD pudesse fazer o aguardado comparativo.
Agora, por mais que Paul seja um entusiasta de mão cheia e até saiba se virar com mais de 800 cv (no mínimo) à disposição de seu pé direito, ele não é piloto profissional. Assim, ele não seria capaz de levar os três ao limite em um dos principais circuitos do Reino Unido: Silverstone.
Para esta missão, eles chamaram Mat Jackson, que desde 2001 é piloto no Campeonato Britânico de Carros de Turismo (British Touring Car Championship, ou BTCC). Ainda que sua especialidade sejam os carros mais compactos — em sua categoria, ele já competiu com Ford Focus ST e BMW Série 3 —, Jackson é um dos principais nomes, conseguindo sempre resultados expressivos ainda que não tenha conquistado um título.
Além disso, tendo participado no desenvolvimento do McLaren 12C como como piloto de testes, Jackson certamente sabe se virar em um hipercarro de alto nível, não?
O vídeo é bem direto — a primeira parte mostra brevemente os carros se preparando para a pista, e logo na sequência as três hot laps são exibidas — primeiro, com o P1, depois com a LaFerrari e, por último, com o Porsche 918 Spyder. Sem comentários ou música, apenas com a trilha sonora mecânica de fundo. É uma boa chance de apreciar cada uma das obras primas de engenharia que é cada um dos motores dos três hipercarros. É uma hora boa para lembrarmos as especificações técnicas de cada um deles, não?
Pela ordem de entrada na pista: o McLaren P1 é movido por um V8 biturbo, o M838T bem semelhante ao encontrado em outros modelos “mais comportados” da companhia britânica, deslocando 3,8 litros. No entanto, ele foi preparado para entregar 737 cv e recebeu uma atenção extra no que diz ao arrefecimento e à lubrificação, além de componentes internos mais resistentes.
O bloco também foi modificado para receber o motor elétrico — este, responsável por completar os 916 cv, que aparecem a 7.500 rpm. O torque máximo é de 91,8 mkgf a 4.000 rpm. A força é levada para as rodas traseiras por uma caixa de dupla embreagem e sete marchas — e é capaz de fazer o McLaren P1 acelerar até os 100 km/h em 2,8 segundos, com máxima de 350 km/h.
A LaFerrari, que foi a segunda a entrar na pista, é o carro mais potente dos três — seu V12 aspirado, que é impressionante por si só, tem 6,3 litros e entrega 800 cv. Com a ajuda do motor elétrico, são 963 cv a impressionantes 9.000 rpm e 98,6 mkgf de torque a 6.750 rpm.
Assim como no P1, a transmissão tem duas embreagens e sete marchas, e leva a força para as rodas traseiras. A LaFerrari é capaz de chegar aos 100 km/h em “menos de três segundos”, de acordo com a Ferrari, com máxima de 350 km/h.
Por fim, temos o Porsche 918 Spyder. Visualmente, ele é o que tem o visual e proporções menos ousadas, ainda que isto definitivamente não signifique que ele é menos impressionante do que os três. Seu motor é um V8 aspirado de 4,6 litros que entrega, sozinho, 615 cv. Com a ajuda de dois motores elétricos, no entanto (um para cada eixo), a potência total é de 887 cv a 8.500 rpm. Se ele é o menos potente, no entanto, seu torque deixa os dois rivais no chinelo: são 130 mkgf a relativamente baixas 4.000 rpm.
A transmissão, como no P1 e na LaFerrari, é de dupla embreagem e sete marchas, levando a força do motor para as rodas traseiras, enquanto o eixo dianteiro é movido por seu próprio motor elétrico.
Os três carros deram um espetáculo no traçado curto do circuito nacional de Silverstone. A pista em formato de triângulo 2,63 km de extensão, e traz três longas retas interligadas por algumas curvas de alta e outras mais técnicas. E como os três se saíram? Muito próximos, devemos dizer — todos viraram tempos na casa dos 58 segundos.
Os comentários de Jackson a respeito dos três carros foram breves, porém pertinentes. O McLaren P1 se mostrou o carro mais agressivo nas curvas — tendência que já foi observada por Chris Harris em seu teste com o hipercarro —, graças à tração traseira e à agressividade do acerto de suspensão no modo Race, que deixa os amortecedores seis vezes mais rígidos e posiciona os elementos aerodinâmicos do carro para gerar até 590 kg de downforce em alta velocidade.
A LaFerrari, no entanto, mostrou ser o carro mais preciso, e o que melhor atacava as curvas em alta velocidade — a dianteira apontava com muita decisão, e era muito fácil levar o carro para onde quer que se quisesse ir.
Com o Porsche 918 Spyder, a impressão de Jack foi a de um carro “preguiçoso” na hora de mudar de direção, certamente por causa da tração integral — carros que também são movidos pelas rodas da frente acabam experimentando um inevitável subesterço nas entradas de curva. O entre-eixos, que é o maior entre os três (2,73 metros, contra 2,65 m da LaFerrari e 2,67 m do P1) certamente também influenciou: como já mencionamos aqui no FlatOut algumas vezes, com menor entre-eixos um carro está menos sujeito à inércia polar nas curvas, e consegue mudar de direção mais rápido.
Dito isto, Jackson fez questão de afirmar algumas vezes que o desempenho dos carros foi muito próximo, e que as diferenças não são vistas no cronômetro, mas sim no braço. Além disso, ainda que os carros tenham ficado o dia todo na pista em momentos diferentes — o que significa que as variações na temperatura da pista, por exemplo, também poderiam interferir na performance dos hipercarros —, a equipe do SCD fez o possível para igualar as condições durante a vez de cada um deles.
Assim, todos tiveram direito a seis voltas para reconhecimento do circuito e aquecimento dos pneus, e mais três voltas cronometradas, com a melhor delas sendo considerada no resultado.
E qual foi este resultado, então? Pois bem: 00:58,24 para o McLaren P1; 00:58,47 para o Porsche 918 Spyder; e 00:58,58 para a LaFerrari. Ou seja: uma diferença de apenas 0,34 segundos do mais veloz para o… menos veloz. Porque, bem, todos são absurdamente velozes.
Agora, se você não está contente com o resultado, pode ter certeza de que haverá pelo menos duas chances para que os derrotados se redimam: como já dissemos, em breve Chris Harris fará seu próprio comparativo, bem como o trio Clarkson, Hammond e May. Finalmente a dúvida poderá ser sanada de uma vez: qual dos três grandes hiperesportivos desta geração é o mais rápido?