Até agora, dezessete carros diferentes passaram por nossa série sobre as Lendas do WRC — todos os que deram a suas fabricantes ao menos um título no campeonato de construtores. Agora, chegamos ao último deles: o atual ocupante do trono, que deu aos alemães motivos para festejar depois de 29 anos.
Estamos nos referindo ao ano de 1984, quando o Audi Quattro venceu seu segundo e último título no mundial de construtores, com o lendário Walter Röhrl ao volante do carro que mudou para sempre a história da competição ao introduzir o sistema de tração integral quattro.
Acontece que, como todos sabem, tudo o que sobe precisa descer. Logo depois do auge, o Quattro passou por uma reformulação para torná-lo mais competitivo porém não obteve êxito, sendo superado Peugeot 205 T16 em 1985. Desde então, nenhum outro alemão levantou a taça de campeão do WRC, fosse piloto ou equipe.
Isto só foi mudar em 2013, quando a Volkswagen conquistou o primeiro título de construtores da história do WRC com a ajuda fundamental do francês Sébastien… Ogier. Loeb só competiu, ainda pela Citroën, em quatro etapas naquele ano — seu último antes de migrar para os carros de turismo. Enquanto isso seu xará, que foi colega de equipe por um ano na equipe francesa, revelou-se a nova promessa dos ralis.
Mas antes, vamos falar do carro que ele usou. Em 2011, a Volkswagen começou a desenvolver o Polo R WRC, seu primeiro carro de rali desde 1991, quando o Golf GTI participou pela última vez do Mundial. Nem todo mundo lembra (quem mais lembra são os Volksmaníacos), mas o Golf competiu entre 1978 e 1991, (pulando alguns anos) sendo que no primeiro ano a carroceria ainda era da primeira geração.
Seu desempenho não foi exatamente expressivo: em dez anos de competição, o Golf não venceu nenhuma vez e seu melhor resultado foi um terceiro lugar no campeonato em 1986, já com o Golf GTI 16v da segunda geração.
Contudo, apesar de não vencer, o Golf de rali conseguiu até dar origem a um raro e cobiçado especial de homologação: o Golf Rallye, movido por um motor de 1,8 litro que, equipado com um compressor mecânico, entregava 161 cv.
Cinco mil unidades foram fabricadas pra fins de homologação do Grupo A, todas facilmente identificáveis pela dianteira que usava os faróis do cupê Corrado, pelos para-lamas alargados e pelos para-choques na cor da carroceria. Leia toda a sua história aqui!
De qualquer forma, com mudança nas regras do Mundial de Rali em 2011, a VW decidiu que era hora de voltar à mais alta categoria do rali mundial. Não era, porém, uma novata — ao menos não totalmente: a Skoda, braço do Leste Europeu da VW, competia no WRC desde 1999 com o Fabia.
Se a escolha natural seria o Golf para um retorno ao WRC, isto não era possível: ele se tornou um carro grande demais para disputar estágios de rali. O modelo que tinha o porte ideal era o Polo, que na Europa ocupa um posto logo abaixo do Golf. Ele está em sua quinta geração, que é baseada na plataforma PQ25 — a mesma do Audi A1 que, não por acaso, tem tração integral nas versões mais potentes.
O protótipo do Polo R WRC foi apresentado em 2011 e, a exemplo dos rivais (como o Citroën DS3), usava o monobloco do modelo de produção, porém com diversas alterações — algumas permitidas, outras exigidas — pelo regulamento. Como você já sabe, as novas regras introduzidas em 2011 estipulavam que o motor dos carros do WRC deveria deslocar até 1.600 cm³, entregar até 300 cv e ter injeção direta de combustível.
A VW não é nenhuma principiante com motores turbos de tamanho reduzido e alto rendimento, então não foi difícil transformar um de seus motores usados nas ruas em um monstro de competição. Partindo do motor 2.0 turbo usado no Audi S3 e no Golf GTI Mk5, os engenheiros da Volkswagen Motorsport trocaram anéis, pistões, bielas e outros componentes internos — reforçados, claro — para reduzir o deslocamento de 1.984 para 1.600 cm³. Com um turbocompressor e um intercooler ajudando o motor a respirar melhor, vieram 300 cv a 6.200 rpm e 43,3 mkgf de torque a 5.000 rpm.
O motor foi acoplado a uma caixa sequencial de seis marchas da Sadev com embreagem da ZF, e leva a força para as quatro rodas através de um sistema de tração integral permanente com distribuição de torque de 50/50 entre os eixos e diferenciais de deslizamento limitado, na dianteira e na traseira.
A carroceria recebeu, como de costume, componentes aerodinâmicos de baixo peso e para-lamas alargados, todos concebidos depois de inúmeros testes em túneis de vento para determinar um conjunto com equilíbrio perfeito entre downforce e aerodinâmica — incluindo, obviamente, a obrigatória asa traseira de fibra de carbono. O resultado foi um carro de apenas 1.200 kg capaz de chegar aos 100 km/h em 3,9 segundos. A suspensão, como se tornou tendência, usa um sistema independente McPherson com amortecedores ajustáveis nas quatro rodas.
Se a receita não era muito diferente da concorrência, é bem provável que os 17 meses de desenvolvimento entre o protótipo e o carro que estreou em 2013 tenham sido o segredo. O talento de Sébastien Ogier, que quebrou seu contrato em 2011 para entrar para a VW Motorsport e pilotar um Skoda Fabia até 2012, também foi essencial, obviamente.
Dissemos isto porque o Polo R WRC venceu dez das 13 etapas logo em sua temporada de estreia — e nove delas foram conquistadas por Ogier. A décima ficou com o finlandês Jari-Matti Latvala.
Sébastien Ogier, Monte Carlo, 2014
Subindo ao pódio juntos frequentemente, Ogier e Latvala acabaram com a alegria da Citroën, que viu sua sequência de cinco títulos no mundial de construtores de forma bem amarga.
A temporada seguinte — também conhecida como a do ano passado — viu o Polo dominar os rivais mais uma vez. Em um verdadeiro massacre, a VW só não venceu uma das treze etapas. E, desta vez, Latvala teve mais destaque ao vencer quatro vezes. O francês e o finlandês foram, respectivamente, campeão e vice, e a Volkswagen levou seu segundo título de construtores com 447 pontos contra 210 da segunda colocada, a Citroën.
Para 2015, a situação promete se repetir caso o desempenho a VW mantenha o desempenho apresentado nas duas primeiras etapas. Em Monte Carlo, Sébastien Ogier, Jari-Matt Latvala e o norueguês Andreas Mikkelsen deram a VW o pódio todo. Já na Suécia, Ogier foi o primeiro e Mikkelsen, o terceiro. Entre eles, na segunda posição, o belga Thierry Neuville ao volante de um Hyundai i20 WRC. Mas ainda é cedo para fazer qualquer previsão para o fim da temporada.
Agora, dissemos que este seria o último post da série — só que existem alguns outros carros que, mesmo sem vencer títulos, também atingiram o status de lenda. Assim, decidimos continuar a série falando deles. Até lá!