Desde que a McLaren voltou a fazer carros de rua – em 2011, com o MP4-12C – todos eles têm um elemento em comum: o motor V8 biturbo. A unidade de 3,8 litros do 12C foi aproveitada em diversos modelos, do 650S ao P1, e em 2017 foi substituída por um motor de quatro litros – o motor do 720S, do Senna e do McLaren GT.
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Agora, em 2021, isto mudou: foi apresentado nesta semana o McLaren Artura, primeiro modelo da marca a empregar um motor V6 biturbo – que, não bastasse, também é um híbrido plug-in. O já citado McLaren P1, lançado em 2013, também era um híbrido plug-in, claro, mas estava em outro patamar: era um hipercarro híbrido que custava mais de US$ 1 milhão na época do lançamento e tinha produção limitadíssima, de apenas 375 exemplares. O Artura custa uma fração do preço, será produzido em série, e tem desempenho muito próximo do P1 mesmo com 200 cv a menos. It’s evolution, baby – oito anos de evolução.
O McLaren Artura vem para sinalizar o futuro da McLaren, que até agora não parece muito disposta a abrir mão da combustão interna – não agora. Em setembro do ano passado, Mike Fleet – CEO da McLaren desde 2013 – disse que os supercarros ainda não estão prontos para migrar completamente para a eletricidade. Flewitt acredita que o processo pode ocorrer gradualmente, mas em um prazo de dez anos ou mais.
É bastante tempo – será toda uma era de McLaren híbridos. E o Artura é o primeiro representante desta nova era.
Como tal, ele é o primeiro McLaren totalmente novo – até agora todos os carros feitos pela empresa eram derivados da mesma plataforma e a mesma arquitetura básica (embora o monocoque de fibra de carbono tenha tido sua parcela de evoluções. O Artura, por sua vez, é construído sobre a plataforma MCLA (McLaren Carbon Lightweight Architecture), que promete ser mais rígida e mais leve que a anterior, e já foi criada com o powertrain híbrido em mente.
Como resultado, o McLaren Artura pesa 1.498 kg em ordem de marcha – nada diferente de qualquer superesportivo não-híbrido (o novo 911 GT3, por exemplo, pesa seus 1.440 kg), mesmo com os componentes de alumínio da carroceria – o metal compõe quase tudo o que se vê por fora, enquanto o compósito é reservado ao “miolo” estrutural. Isto não é novidade, mas o fato de a estrutura abrigar as estruturas de deformação programada duas células de proteção (uma para os ocupantes e outra para a bateria logo atrás deles), sim. E, mesmo com tudo isto, os engenheiros da McLaren conseguiram ficar abaixo do limite de 1.500 kg proposto no início do trabalho de desenvolvimento.
Isto se deve, em parte, ao baixo peso do conjunto híbrido: apenas 130 kg, sendo 88 kg das baterias, 15 kg do motor elétrico e o restante correspondente aos componentes agregados. Mas o próprio motor V6 de três litros também faz sua parte. Com dois cilindros a menos, ele também é mais 40 kg mais leve. E mais compacto: os turbos agora são alojados no vão entre as bancadas de cilindros (configuração hot-vee), que são separadas por um ângulo de 120° e, com isto, o V6 é 220 mm mais estreito que o V8 – mesmo que este tivesse um ângulo mais fechado, de 90°. Desta forma, o V6 fica posicionado mais baixo no monocoque, o que ajuda a deixar o centro de gravidade mais perto do chão.
O motor V6 entrega 585 cv e 59,6 kgfm de torque, mas não trabalha sozinho: o restante da força é gerada pelo motor elétrico de 95 cv ee 22,9 kgfm – chega-se, assim, a 680 cv e 73,4 kgfm de torque. O motor elétrico fica alojado junto à transmissão de dupla embreagem e oito marchas. Um detalhe curioso é que este câmbio não possui marcha à ré: para manobrar, o Artura utiliza exclusivamente o motor elétrico – ele simplesmente gira ao contrário para que o carro ande para trás. Falando nisso, a autonomia no modo elétrico é de 30 km com uma carga – o bastante para ir e voltar do trabalho, caso alguém decida colocar seu Artura no trânsito, com velocidade máxima de 130 km/h.
A bateria de 7,4 kWh leva 2h30 para chegar a 80% da capacidade com um cabo comum, mas também é possível carregá-la usando o próprio motor a combustão ao selecionar o modo adequado.
Tudo isto soa de acordo com o que se espera de um superesportivo híbrido em 2021. Mas, como primogênito de um novo tempo, o McLaren Artura também precisa demonstrar que anda como um supercarro. De fato, ele consegue ir de zero a 100 km/h em três segundos cravados – apenas 0,2s mais lento que o McLaren P1. O quarto-de-milha é cumprido em 10,7 segundos, e a velocidade máxima fica em 330 km/h (o P1 chega aos 350 km/h).
Mas nem só de aceleração em linha reta se vive. Assim, pela primeira vez, a McLaren emprega um diferencial com autoblocante eletrônico no eixo traseiro multilink para garantir que cada uma das rodas receba a quantidade exata de força necessária a todo momento – mas também permitir derrapagens controladas, caso desejado. A suspensão, aliás, é totalmente nova, com amortecedores adaptativos, braços triangulares inferiores segmentados e, agora, ajuste de convergência. Com isto, é possível realizar acertos mais finos no sistema de suspensão, e ganha-se em precisão e feedback. Falando nisto, McLaren manteve a direção hidráulica em vez de adotar assistência elétrica, também em nome do feedback.
As rodas têm 19 polegadas na dianteira e 20 polegadas na traseira, e são equipadas com pneus Pirelli P Zero com tecnologia Cyber Tyre (medidas 235/35 na frente e 295/35 atrás). Equipados com chips e sensores, estes pneus comunicam-se diretamente e em tempo real com as assistências eletrônicas do Artura, alertando os sistemas sobre as condições de rodagem, como temperatura e aderância. Então, o carro se ajusta de acordo. Sob as rodas, o novo McLaren abriga freios de carbono-cerâmica com discos de 390 mm na dianteira e 380 mm na traseira, mordidos por pinças de seis e quatro pistões, respectivamente.
Em proporções e dimensões, o McLaren Artura não se afasta muito dos outros McLaren. Tem 4,54 m de comprimento, 1,91 m de largura, 1,19 m de altura e entre-eixos de 2,64 m (3 cm a menos que o 720S). Em visual, a McLaren optou por não se afastar muito do que se oferece no momento – o carro nem parece totalmente novo por baixo da carroceria, que traz elementos inspirados pelo McLaren 720S (nos faróis) e no McLaren GT (o desenho das lanternas traseiras). Contudo, olhando com atenção, percebe-se que a cabine é ainda mais avançada em direção ao eixo dianteiro, e que a linha do teto em direção a traseira é traçada de forma mais suave.
O McLaren Artura abre mão de elementos aerodinâmicos agressivos e opta por superfícies limpas e linhas suaves, mas não menos eficazes. Rob Melville, diretor de design da McLaren, chamou seu trabalho de “escultura técnica” – uma forma de dizer que o visual e a funcionalidade receberam igual atenção. Diversos elementos espalhados pelo carro ajudam a moldar o fluxo de ar a seu redor – os respiros nos para-lamas dianteiros, à la Porsche RS, as cavidades ocultas nas portas para canalizar o ar em direção aos arcobotantes ao lado do vidro traseiro, e as entradas de ar nas laterais, que receberam um desenho mais discreto e orgânico sem perder a eficácia.
Um detalhe interessante: nenhum destes elementos é ativo. Todas as peças foram feitas para entregar eficácia máxima a qualquer momento, em qualquer situação – como o conjunto traseiro composto pelo spoiler integrado e pelo difusor no para-choque, capazes de gerar 50 kg de downforce em alta velocidade.
Curiosamente, é por dentro que o Artura se afasta mais dos outros McLaren. O estilo do painel é elegante e limpo, com saídas de ar centralizadas e uma tela flutuante vertical abaixo delas. A tela de oito polegadas pode ser sincronizada com smartphones através dos sistemas Apple CarPlay e Android Auto, e também traz GPS com rastreador e um sistema de telemetria inteligente.
A princípio, talvez o McLaren Artura pareça… conservador demais para a importância que ele tem. Dá para entender – seu visual não traz nada muito radical se comparado aos McLaren que já rodam por aí, o combo “V6 + turbos + motor elétrico” não é algo exatamente revolucionário, e todas as maiores novidades só podem ser realmente aproveitadas por quem tiver a oportunidade de dirigir um deles.
Contudo, é preciso lembrar que o Artura é só o primeiro. Tal como o McLaren 12C há dez anos, ele será a pedra fundamental de uma nova linha de modelos que deve se estender por outros dez anos, pelo menos. Há de se deixar espaço para melhorias, não é mesmo?