Você já pensou em largar tudo, absolutamente tudo para trás e começar uma vida nova viajando pelo mundo? É bem possível que sim, especialmente se for um jovem adulto nos dias de hoje – são tempos de crise, com um prognóstico sombrio pairando sobre a nossa sociedade. A ideia de aproveitar este momento para fugir de tudo e descobrir a si mesmo é tentadora. Talvez, de certa forma, o hábito de pegar o carro e dar umas escapulidas sem destino certo seja uma maneira de satisfazer estes anseios em pequenas doses. Ao menos é assim que eu vejo.
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Mas esta não é uma ideia nova – inúmeras pessoas já decidiram deixar a vida em sociedade para trás em busca de autodescobrimento, ou simplesmente pela aventura. E um dos casos mais famosos certamente é o de Chris McCandless, um jovem de família rica que tinha um bom emprego e possivelmente uma trajetória de sucesso pela frente, mas decidiu ir sozinho até o Alasca com quase nada na mochila para sobreviver além de algumas rações de emergência, roupas e uma espingarda.
A história de McCandless ficou famosa depois que o livro “Into the Wild”, biografia escrita por John Krakauer e publicada em 1996, e mais ainda depois que o filme homônimo, baseado no livro e dirigido por Sean Penn, estreou em 2007 (que tinha uma bela trilha sonora acústica interpretada por Eddie Vedder). McCandless, que também usava o pseudônimo Alexander Supertramp, tornou-se uma inspiração para muitos, que enxergam nele uma figura idealista e de espírito livre – quase um mártir, que deu a vida para mostrar ao mundo os problemas da sociedade moderna. Outros o enxergam como uma figura problemática, ingênua e irresponsável – ele tinha certa experiência com trilhas, mas nada tão arriscado e ambicioso. Sem equipamentos e suprimentos suficientes, talvez não seja exagero dizer que McCandless saiu com destino à morte certa.
Em abril de 1992, Chris McCandless deixou sua casa em Carthage, Dakota do Sul, sem avisar a ninguém, nem família e nem amigos, e partiu em direção ao oeste. Seu objetivo era era ir caminhando até o Estreito de Bering, na borda do Alasca, e ele saiu antes de pensar em como e quando voltaria para casa. Tragicamente, ele passou seus últimos dias sobrevivendo dos animais que caçava e das plantas que encontrava, morando em um ônibus – o Fairbanks City Transit System 142, que estava abandonado havia muitos anos naquele local. Depois de passar 113 dias vivendo no ônibus, Chris McCandless morreu de fome em agosto de 1992.
A última morada de McCandless, desde então, tornou-se um destino popular entre entusiastas da trilha e aventureiros – uma espécie de ponto de perigrinação. Os admiradores de Alex Supertramp buscavam entender melhor como funcionava a mente do homem, muitos deles procurando até mesmo passar pelas mesmas dificuldades de McCandles, como se fosse uma provação. Localizado em uma área remota e perigosa, o ônibus nunca foi vigiado e, tecnicamente, qualquer um poderia utilizá-lo como acampamento.
E era exatamente isto que as pessoas faziam – e acabavam se perdendo ou até mesmo morrendo. Por isso, na última quinta-feira (18), enfim as autoridades do Alasca usaram um helocóptero para remover o Fairbanks City 142. Ele era um ponto turístico perigoso.
Não é difícil encontrar o local onde o ônibus estava – basta ir ao Google e pesquisar por “bus 142” e o buscador já informa as coordenadas do “ônibus mágico”, que é como ele ficou conhecido. McCandless estava percorrendo a trilha chamada Stampede Trail quando encontrou o ônibus – um International Harvester K-5 fabricado em 1946. Feito sobre um chassi de caminhão e equipado com um seis-em-linha a gasolina, o ônibus era utilizado pela Yutan Construction Company, empresa da cidade de Fairbanks, para abrigar os trabalhadores que estavam construindo as estradas da região.
Por conta disto, o ônibus tinha camas e um forno a lenha em seu interior. Havia outros ônibus no local mas, quando as obras acabaram, o nº 142 ficou para trás porque estava com a transmissão quebrada – não valia a pena rebocá-lo ou consertá-lo.
Quase imediatamente o Fairbanks City 142 foi adotado por caçadores e aventureiros como abrigo. Muitos outros passaram por lá antes de McCandless, e muitos outros depois. O problema era que nem todos se saíram bem – especialmente nos últimos anos. Entre 2009 e 2017, 15 missões de busca e salvamento tiveram de ser realizadas. Mas isto acabou.
O ônibus foi retirado de Stampede Trail pela Guarda Nacional do Exército do Alasca no último 18 de junho, durante uma missão de treinamento – 28 anos depois da morte de McCandless. O ônibus 142 era, sem dúvida, um elemento extremamente simbólico da paisagem do Alasca. Um ônibus parado havia mais de meio século no mesmo lugar – e que, mesmo sem poder transportar pessoas, levou McCandless para seu último destino.
Embora trouxesse muitos visitantes ao Alasca, porém, o ônibus não era visto pelos habitantes locais com o mesmo carinho que pelos peregrinos. Quem vive na região não consegue compreender que levava tantos visitantes a “percorrer o mesmo caminho de um homem que morreu porque estava despreparado”, disse um soldado que trabalhava em missões de resgate a Diana Saverin, jornalista da revista americana Outside, em um artigo de 2013.
O último destino do ônibus 142 ainda é incerto, porém. O Departamento de Recursos Naturais do Alasca disse que considerou muito todas as possibilidades antes de optar por removê-lo, que por ora o “ônibus mágico” ficará guardado em um local seguro antes que decida-se o que será feito com ele.