“Eu duvido que outro carro vá chegar perto do que o T.50s proporciona”. Foi com estas palavras que Gordon Murray encerrou o vídeo de apresentação daquela que ele próprio considera sua obra prima: o GMA T.50s Niki Lauda. Sim, este é o nome completo do carro, oficialmente. Revelado hoje, o T.50s promete ser o superesportivo carro mais puro e envolvente já feito – e seu criador promete que nada conseguirá superá-lo nisto.
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Assim como no T.50, Gordon Murray aplicou ao T.50s conceitos e elementos aperfeiçoados cuidadosamente ao longo de décadas. Mas, sem as amarras impostas aos carros de rua, o T.50s consegue ser ainda mais impressionante – e não apenas pela aparência.
A aparência, claro, é matadora. Não é bajulação, não: é impossível não encarar o GMA T.50s Niki Lauda como uma resposta concreta aos hipercarros carregados com elementos aerodinâmicos e proporções, digamos, pitorescas – o McLaren Senna, que assumidamente abriu mão das proporções harmônicas e das formas agradáveis em nome da eficácia aerodinâmica, é o primeiro que vêm à mente. Aliás, o nome do T.50s Niki Lauda parece até provocação.
Olhando para o T.50s, é mais que evidente sua ligação com o T.50 de rua e, consequentemente, com o McLaren F1 – o perfil do clássico se faz presente. O monocoque de fibra de carbono é, em essência, o mesmo do T.50 “normal”, assim como faróis e outros elementos. Contudo, obviamente também há várias mudanças grandes e importantes. O para-choque dianteiro é outro, com canards nas laterais e um generoso spoiler frontal. No capô há três dutos NACA – um no meio, para ventilar o habitáculo, ladeado por outros dois que levam ar fresco aos freios.
A tomada de ar no teto é maior e mais pronunciada, alojada em uma espécie de “periscópio”, as laterais receberam enormes entradas de ar e uma barbatana ao estilo dos protótipos LMP foi incorporada ao teto para aumentar a estabilidade nas curvas e eventuais derrapagens controladas.
A porção traseira, porém, é o que mais chama a atenção, com um gigantesco difusor duplo e para-lamas redesenhados, com um contorno mais elevado que, de forma bem sacada, lembram o desenho do Alfa Romeo Disco Volante (na versão moderna, feita pela Carrozzeria Touring com base no 8C Competizione), incluindo a posição das lanternas.
Este charme italiano em um carro de engenharia tão voltada à performance é uma agradável surpresa, e só acrescenta à estética harmônica e limpa do T.50s Niki Lauda. Uma estética que não é quebrada nem mesmo pela “turbina” na traseira – que, novamente, é o grande trunfo do carro. Inspirada pelo Brabham BT46B, que venceu a única corrida de que participou com Niki Lauda ao volante (o Grande Prêmio da Suécia de 1978), ela ajudou a batizar o carro, que até tem um belo emblema que diz “fancar” na traseira.
Ela funciona da mesma forma que no T.50: alimentada pelo sistema elétrico de 48V do carro, ela auxilia o difusor na parte inferior a reduzir a pressão aerodinâmica que passa sob o carro e, consequentemente, aumentar a diferença de pressão entre o fluxo de ar sobre o carro e sob ele – gerando mais downforce. A diferença é que, enquanto no T.50 a turbina de 400 mm trabalha com velocidade variável para oferecer diferentes níveis de assistência aerodinâmica, no T.50s ela funciona na capacidade máxima o tempo todo. O carro também tem uma nova asa traseira em formato de “delta” que foi inspirada pela asa dianteira do Brabham BT52, também projetado por Murray, que competiu em 1983.
Com isto, o pico de downforce produzida pelo T.50s é de 1.500 kg a 280 km/h. Em um carro que pesa parcos 852 kg, isto significa, em tese, que o T.50s é capaz de rodar de cabeça para baixo no teto de um túnel. Murray garante que, a 240 km/h em uma curva, o T.50s é capaz de ir de gerar 2,5G de aceleração lateral, e até 3,5G nas frenagens.
Com os novos elementos aerodinâmicos, o GMA T.50s Niki Lauda é mais longo, mais largo e mais alto que o T.50 de rua – são 4,42 m de comprimento, 1,92 m de largura e 1,17 m de altura (um aumento de 7 cm, 5 cm e 1 cm, respectivamente).
Para perder 134 kg em relação ao T.50 de rua (que pesa 986 kg), o GMA recebeu um novo monocoque de fibra de carbono e honeycomb de alumínio, novos painéis de fibra de carbono na carroceria e vidros mais finos, além do costumeiro alívio no interior. Este, na verdade, é um belo exemplo de minimalismo feito do jeito certo: apenas o essencial para se andar rápido, mas feito de forma muito bem planejada: há o banco concha central, volante e painel digital no meio, um console com chaves e botões do lado direito e fibra de carbono por toda a parte. Opcionalmente, é possível incluir um banco do carona, instalado à esquerda do piloto.
Os 852 kg do T.50s Niki Lauda (não importa quantas vezes se repita, continua absurdo) são empurrados por um V12 aspirado de 3,9 litros que, evidentemente, é baseado no motor Cosworth usado pela versão de rua, porém em uma versão mais leve e potente. São 16 kg a menos só no motor (162 kg contra 178 kg), e Murray chegou a eliminar o comando de válvulas variável para reduzir o peso e a altura do motor (abaixando seu centro de gravidade) – uma concessão que, segundo ele, valeu a pena, pois só prejudica um pouco a entrega de torque do motor entre 4.000 e 5.000 rpm, e a mágica está em rotações bem mais altas.
A potência, porém, não é segredo: são 711 cv a 11.500 rpm e 49,5 kgfm de torque a 9.000 rpm, com redline em absurdos 12.100 rpm. São 182 cv por litro, potência específica que Murray frisa ser maior que a do Cosworth DFV usado na Fórmula 1. Detalhe: esta é a potência produzida pelo motor: somando-se o sistema ram air de indução, a força máxima chega aos 725 cv.
Diferentemente do T.50 de rua, o V12 é ligado a uma caixa sequencial Xtrac de seis marchas. O câmbio foi feito sob medida para caber exatamente nas demandas de packaging e peso do T.50s, pesa 5 kg a menos que o câmbio manual do T.50 de rua, e seu escalonamento foi escolhido para otimizar o desempenho na pista ao mesmo tempo em que entrega o máximo de envolvimento e prazer ao volante (palavras do próprio Murray, novamente), com velocidade máxima por volta dos 320 a 330 km/h. O zero a 100 km/h não foi divulgado, assim como aconteceu com o T.50. Murray não está preocupado com isto. A GMA revela, porém, que um conjunto de engrenagens com relações mais próximas será oferecido para quem for acelerar em circuitos mais curtos, o que também deve beneficiar a aceleração.
Mais importante é como o carro se comporta em curvas. O setup de suspensão é o mesmo do T.50 de rua, que por sua vez segue a cartilha de todo bom superesportivo – duplo wishbone nos quatro cantos, porém com molas, amortecedores e barras estabilizadoras redesenhados e acertados para uso em pista. O carro ficou 8 cm mais baixo na dianteira e 11 cm mais baixo atrás no ajuste mais agressivo.
Os freios Brembo são exatamente os mesmos do T.50, com discos de carbono-cerâmica de 370×34 mm na frente e 340×34 mm atrás, mordidos por pinças de seis pistões e quatro pistões, respectivamente. As rodas de 18×11 polegadas na dianteira e 18×12 polegadas na traseira calçam pneus slick da Michelin. Falando nisso, os pneus também foram um fator limitante no downforce produzido: segundo Gordon Murray, em testes o T.50s chegou a gerar 1.900 kg de downforce, mas a Michelin não conseguiu fornecer pneus nas medidas exigidas que suportassem um número tão alto – então, foi preciso “piorar” um pouco a aerodinâmica.
Serão feitos 25 exemplares do GMA T.50s Niki Lauda, cada um custando US$ 4,5 milhões sem impostos, ou R$ 24,5 milhões em conversão direta. Cada um deles terá total suporte da Gordon Murray Automotive na pista – o chamado Trackspeed Package, que inclui uma equipe de engenharia, ferramentas e todo equipamento necessário para as paradas nos boxes, incluindo reabastecimento.
É evidente que Gordon Murray não impôs qualquer limite a si mesmo na hora de criar o T.50 e o T.50s. De outra forma, ele não teria criado um superesportivo tão leve, naturalmente aspirado, desprovido de qualquer assistência elétrica ou híbrida, e que ainda é tão bonito. É até difícil colocar em palavras o quanto este carro nos deixa felizes – assim, simplesmente. Existem vários superesportivos mais potentes e mais velozes, mas nenhum deles tem a mesma pureza, tanto do ponto de vista técnico quanto filosófico e estético. Exatamente como era no McLaren F1 e em suas versões de competição.
Gordon Murray conseguiu de novo. Ele fez o sucessor definitivo para o McLaren F1 duas vezes, de uma maneira que a McLaren jamais faria – seguindo a mesma receita básica e melhorando seus defeitos. Não duvidamos por um segundo sequer de que Murray está certo: ele não será superado por muito, muito tempo. Talvez nunca seja.