Bancos podem ser um problema irremediável ou uma solução rápida. Serve para dinheiro e para carros. Se você já assistiu ao Clubsport do Envemo Super 90 já viu o MAO falando sobre como os bancos mudam completamente o carro. Se você acha a posição de um determinado modelo meio estranha, preste atenção aos bancos, não tanto ao volante, alavanca de câmbio e pedais.
Na semana passada eu estava com um Honda Fit de segunda geração e não achava de jeito algum uma posição que me deixasse menos sexagenário. Mexi no volante, no encosto do banco, recuei o assento até acabar o trilho, e assei as pontas dos dedos tentando girar a roda de ajuste de altura do banco além do que deveria. Não tinha jeito, o banco ainda era alto para o meu gosto. Uma ergonomia esquisita que me faria pensar duas vezes na hora de comprar um carro.
Bancos são a principal peça da interface homem-máquina. A gente pensa muito na comunicatividade da direção e no posicionamento dos pedais, mas o volante irá cumprir sua função primária, que é apontar a dianteira do carro para onde você precisa. Às nuances, a gente se adapta. Walther Röhrl certa vez disse que não pensava muito sobre a direção do seu Audi Quattro. “Eu só entrava e pilotava”, disse ao ser questionado sobre a comunicatividade do sistema. Mas os bancos, eles não servem apenas para o piloto ter onde sentar. Os bancos são o elemento de integração do nosso corpo ao corpo da máquina. É onde a simbiose acontece. Não tem como usar o banco de um jeito diferente, como você faz com os comandos do carro. Ele é daquele jeito e pronto. Ou você muda as características dele, ou ele será sempre o que é.
Só que… esse papo se refere muito à função prática dos bancos — ou seja: sua funcionalidade, seu uso. E eles têm uma função secundária na cabine dos carros, que é a função estética, ou seja: o banco como elemento de embelezamento do carro.
Na verdade, indo mais além, eles têm até uma função simbólica. Quer um exemplo? Os bancos pied de poule do Porsche 911 Sport Classic. O revestimento padronizado preto-e-branco tem sua função estética, que é ser um banco bonito, mas também tem sua função simbólica, que é fazer uma ligação histórica com o 911 dos anos 1970 e 1980, que usava esse padrão nos seus bancos.
Quando se reúne estas três funções de forma primorosa, você tem um clássico em forma de… banco. E para provar que os bancos são importantes na relação homem-máquina também de forma afetiva, aqui vai uma lista com os bancos esportivos mais bonitos e marcantes da história. Como os bancos…
… Recaro dos esportivos nacionais
As versões esportivas vendidas no Brasil nos anos 1980 tinham o charme hoje perdido de serem baseadas em carros bem mais comuns, então as fabricantes não faziam cerimônia em mudar diversos elementos-chave dentro e fora dos automóveis. Faróis extras, para-choques de desenho diferente, rodas, acessórios aerodinâmicos, volantes e, claro, os bancos Recaro.
A Recaro forneceu os bancos para os VW Passat GTS, Gol GT, GTI e GTS; Gol TSi, Voyage Super e Voyage Sport, Santana Sport, Monza S/R, Chevrolet Kadett GS e GSi; Ford Escort XR3, Santana Sport e também foi oferecido como opcional em versões de outros modelos, como o Voyage, a Parati e o Santana.
Com apoios laterais generosos para tronco e pernas, incluindo por vezes ajustes lombares e no comprimento do assento, os bancos esportivos Recaro de fato melhoravam muito a ergonomia de condução, mas seu visual diferenciado é quem os colocou na história — e na memória do público.
Os bancos “neoclássicos” do Ford GT
Em um futuro não muito distante vamos dar o devido valor ao Ford GT. O superesportivo era uma homenagem ao GT40, o carro de corrida anglo-americano que dominou as 24 Horas de Le Mans entre 1966 e 1969 e colocou a Ford de uma vez por todas na elite do automobilismo.
O carro de rua dos anos 2000 era praticamente um fac-símile do original dos anos 60, discretamente modernizado nos detalhes, mas com a essência do clássico praticamente intocada. E com um V8 supercharged de 5,4 litros e 558 cv acoplado a uma caixa manual de seis marchas. Sem tecnologia híbrida, sem turbos, sem aletas atrás do volante (e com hastes de seta do Ford Focus Mk1!). Um dos últimos de sua espécie.
Os bancos só arrematam o pacote. O interior do Ford GT também é uma releitura fiel do interior original do GT40, no formato do painel, na disposição dos instrumentos e das proporções, e nos bancos revestidos de couro preto, com elementos circulares que remetem aos ilhoses que eram usados para a ventilação dos bancos originais do GT40.
O xadrez alemão dos Mercedes SL de corrida
O Mercedes-Benz 300SL Gullwing, o famoso “asa-de-gaivota”, é considerado um dos primeiros supercarros da história. Apesar de ser um grand tourer com motor dianteiro (ou praticamente central-dianteiro, visto que boa parte ficava atrás do eixo), este motor era um seis-em-linha de três litros com comando no cabeçote, injeção direta de combustível e 246 cv capaz de levar o cupê até os 260 km/h – o Gullwing era o carro produzido em série mais veloz do mundo. Em 1954!
Seus bancos eram típicos dos esportivos e carros de corrida da época: pequenos buckets com apoio lateral até generosos e encostos baixos. O diferencial, em seu caso, era o elegantíssimo revestimento xadrez, uma das marcas registradas dos automóveis de competição da Mercedes na época.
Eles foram tão marcantes que até meados dos anos 1990 a Mercedes usava padrões xadrez em versões esportivas de seus sedãs de tiozinho. Infelizmente isso é algo que se perdeu com a glamourização dos esportivos, que exige nada menos que couro de vacas acariciadas desde o nascimento por fadas irlandesas.
A evolução dos bancos do M3 Evolution
Depois de quase 30 anos desde seu lançamento, o E36 disputa com o E46 o título de “a melhor geração do BMW M3”. Os argumentos a favor do modelo noventista são baseados no fato de ela ser a primeira a juntar a natureza orgânica do E30 com um seis-em-linha naturalmente aspirado, dando ao carro mais fôlego em circuitos longos e nas Autobahnen alemãs.
Na melhor versão, a vendida na Europa, o M3 E36 encerrou sua carreira com o motor S50B32 um seis-cilindros de 3,2 litros com comando duplo variável no cabeçote e 325 cv, sendo capaz de chegar até os 100 km/h em 5,5 segundos, com máxima de 250 km/h.
Os bancos adotados pela BMW no M3 E36 refletiam a maior sofisticação do modelo. O E30 tinha bancos esportivos bem simples nos primeiros anos, ganhando bancos do tipo concha rebativeis no modelo Sport Evo, de 1989.
No M3 E36 comum, os bancos de série ganharam mais apoio lateral, enquanto os bancos de edições especiais como o M3 GT, também oferecidos como opcionais, ganharam um desenho mais robusto e, ao mesmo tempo em que ficaram mais confortáveis, também ganharam em ergonomia e apoio lateral. E ainda havia o pequeno detalhe das listras nas cores da Motorsport na porção central.
Os bancos Recaro vermelhos do Type R EK9
O “Santo Graal” de muitos hondeiros é, sem dúvida, a primeira geração do Honda Civic Type R, a EK9, fabricada entre 1997 e 2000. Seu maior trunfo era, sem dúvida, a versão mais nervosa do motor B16: se no Civic VTi o 1.6 com comando duplo variável V-TEC entregava 160 cv (100 cv/litro), no Type R eram 185 cv, ou 115 cv/litro. O monstrinho de 1.090 kg ia de zero a 100 km/h em 6,8 segundos.
Apesar de ser um carro feito para ser leve, dispensando maiores itens de conforto no interior (ainda que a versão Rx tivesse CD-player, retrovisores retráteis, vidros elétricos e ar-condicionado automático), o Civic Type R não dispensava recursos estéticos: além da exclusiva em branco Championship White, ele tinha bancos Recaro SR rebatíveis revestidos com tecido vermelho. Eles ofereceriam excelente apoio do mesmo jeito se fossem pretos, claro, mas tinham de ser vermelhos.
Os contrastes dos bancos do McLaren F1
Ele é um dos poucos esportivos de três lugares já feitos, e foi concebido assim porque seu criador, Gordon Murray, chegou à conclusão de que havia espaço para três pessoas na cabine de um supercarro de motor central-traseiro. Além disso, a ergonomia pra o motorista sentado no meio era muito melhor, com pedais, banco e volante perfeitamente alinhados e um campo de visão muito mais amplo.
Os dois bancos para os passageiros são esculpidos na estrutura e, por isso, têm espaço de sobra para as pernas. Já o banco do meio, do motorista, é feito de fibra de carbono e tem um encosto muito fino. É um tributo à leveza e ao foco na condução. Ele não tem ajustes para o encosto, apenas o trilho que ajuste sua distância em relação ao volante e pedais – e só.
A obra de arte dos Alfa 105 Prima Serie
O Alfa Romeo Giulia cupê dos anos 1960 e 1970 é tido como um dos carros essenciais em uma garagem entusiasta. Além do visual harmônico e muito bonito, são carros leves, bem acertados e com potência na medida certa – cortesia dos quatro-cilindros “bialbero” (com comando duplo no cabeçote) da Alfa Romeo.
Mas eles também tinham excelente ergonomia: volante grande, pedais perfeitamente posicionados e ótimos bancos. Especialmente as versões 1750 GT Veloce e 1500 GTA, que tinham encostos vazados e apoios de cabeça presos pelos dois lados nos gomos laterais. Quando abaixados ficavam “escondidos”, dando a impressão que se tratavam de bancos sem apoio de cabeça. E eles são tudo isso sem abrir mão da beleza, o que é uma tradição do design italiano.
Ou será que a tradição vem de coisas como esses bancos? Enfim… você entendeu.
A perfeita simplicidade dos bancos do Lancia Stratos HF
O Lancia Stratos é um dos poucos carros que são unanimidade entre entusiastas de todas as idades, origens, crenças, idades e gêneros. Se você dizer que conhece alguém que não gosta do Stratos, sabemos que é mentira. E se disser que é você que não gosta, sabemos que está só querendo ser o diferentão. Quem não gosta de um esportivo de dois lugares com carroceria em forma de cunha e um V6 de origem Ferrari atrás dos bancos?
Aliás, os bancos do Stratos são perfeitos: conchas altos, com encosto integrado e revestimento de couro ou camuça com padrão simples, em gomos horizontais. Menos é mais, às vezes.
O xadrez da Volkswagen
Os bancos do Golf GTI de sétima geração ilustram bem este item, mas não nos referimos apenas a ele. Desde a primeira geração, o pioneiro dos hot hatches traz o padrão tartan vermelho sobre fundo preto em quase todas as suas encarnações. A estampa, com xadrez vermelho sobre um fundo preto, foi desenhado pela pintora de porcelanas Gunhild Liljequist.
Quer dizer, ela foi pintora de porcelanas antes de se tornar a primeira mulher a trabalhar no departamento de design da Volkswagen. Liljequist foi contratada em 1964 pela Volks e ficou lá até 1991. Ela se inspirou nos tecidos xadrez que viu enquanto viajava no Reino Unido.