A República Democrática Popular da Coreia, também conhecida como Coreia do Norte, é um país curioso. Para começar, o governo não é uma democracia, mas uma ditadura sob o comando de Kim Jong-Un, filho de Kim Jong-Il e tão excêntrico quanto seu pai, e o país vive isolado, alheio a diversos aspectos do mundo moderno — incluindo coisas básicas como canais de TV aberta, internet e, claro, carros.
Quase não há automóveis nas ruas da cidade. Mesmo o tráfego na capital Pyongyang é bastante tranquilo, e engarrafamentos são acontecimento raro — o que não impede o glorioso líder Kim Jung-Un de exigir que o fluxo dos carros seja fiscalizado por guardas de trânsito femininas, jovens e impecavelmente arrumadas, todos os dias das 6 da manhã às 10 da noite (quando, provavelmente, não há mais nenhum automóvel circulando nas ruas.
Mas o que se dirige na Coréia do Norte, afinal?
Se você trabalha para o governo, é até provável que consiga comprar um carro importado moderno, em sintonia com o que é vendido no resto do planeta. No entanto, se você for só um cara normal, é mais provável que ande a pé e use o transporte público — são poucos os que conseguem juntar dinheiro o suficiente para comprar um dos modelos oferecidos pela Pyeonghwa Motors, única fabricante de automóveis da Coreia do Norte. Seu nome significa “paz” em coreano.
Agora, o fato de a Pyeonghwa Motors ser uma fabricante de automóveis não significa que a empresa, de fato, fabrique automóveis. Quer dizer, eles fabricam, oferecendo um portfólio com alguns modelos diferentes. A capacidade de produção é relativamente grande para um país como a Coreia do Norte — dependendo da fonte procurada, fala-se em algo entre 10 mil e 50 mil carros por ano. No entanto, na prática, faz mais de uma década que o número de carros fabricados anualmente fica na casa das centenas. No máximo, um pouco mais de mil.
Na verdade, a Pyeonghwa Motors da Coreia do Norte é uma joint venture entre a Ryonbong General Corporation, uma companhia de mineração local; e a matriz da Pyeonghwa Motors, na Coreia do Sul. Esta, empresa, por sua vez, pertence Sun Myung Moon, líder da Igreja da Unificação e um dos principais defensores do fim da separação entre as duas Coreias. Que bagunça, não ?
O fato é que a Pyeonghwa Motors foi estabelecida na Coreia do Norte em 1999, começando a fabricar carros em 2002. E você não vai acreditar quando souber qual era o carro:
Sim, o Fiat Siena de primeira geração, cuja licença foi concedida pela Fiat. A produção era no regime CKD (os componentes eram fabricados pela Fiat e enviados para a Coreia do Norte, onde eram montados), e o carro foi rebatizado como “Hwiparam”. Ele é produzido até hoje ao lado dos modelos Hwiparam II e III, ambos baseados em sedãs da chinesa Brilliance.
Há também carros que trazem uma semelhança muito suspeita com modelos da Volkswagen, como Santana chinês (um sedã com porte entre o nosso Voyage e o Jetta) e o Passat.
Também existe a linha de utilitários Ppoggugi, com os modelos I, II e III. O primeiro é um Fiat Doblò de primeira geração, enquanto os outros dois são baseados em um SUV e em uma picape da chinesa Shuanghuang.
O modelo topo de linha é o Pyeonghwa Junma, baseado no SsangYong Chairman de primeira geração. O detalhe é que o próprio Chairman tem origem em outro carro — a SsangYong o desenvolveu em 1997 sobre a plataforma do Mercedes-Benz W124, precursor do Classe E produzido entre 1984 e 1995. Isto significa que o carro mais luxuoso fabricado na Coreia do Norte é um projeto de 31 anos de idade.
O costume de usar projetos de outras fabricantes, no entanto, vem de muito antes da fundação da Pyeonghwa. Os carros mais antigos que rodam pela Coreia do Norte são cópias de carros russos, como o Gaz Volga, e o Mercedes-Benz 190E.
Este foi produzido por uma divisão automotiva estatal coreana entre 1988 e 1989, depois que o governo comprou alguns Mercedes a fim de copiar o projeto e os componentes. Alguns destes carros são rodam até hoje, como táxis.
Esta prática só foi possível porque a indústria automotiva norte-coreana é tão isolada quanto o país: a Pyeonghwa Motors não é afiliada à Organização Internacional dos Construtores de Automóveis (a federação sediada na França que coordena as comunicações entre as fabricantes de carros e organiza os principais salões mundiais). É como se a companhia não existisse para o resto do mundo. Pela mesma razão é impossível obter dados concretos a respeito de vendas ou números de produção.
De qualquer forma, a população simplesmente aprendeu a viver sem carros, e seus líderes também parecem não se importar — eles preferem os carros importados. Kimg Jong-Il, por exemplo, andava por aí em um Mercedes-Benz S600 Grosser…