Na semana passada a TVR anunciou que voltará a fabricar automóveis em 2017, e que logo de cara trará dois modelos totalmente inéditos. Tudo bem que não foi a primeira vez (nem segunda, terceira ou quarta…) que ouvimos esta promessa, mas com Gordon Murray e a Cosworth envolvidos, parece que agora vai.
Por isso, nada mais justo que selecionarmos alguns dos modelos da TVR que nos deixam mais felizes pela volta da companhia, não é mesmo? Então, sem mais delongas ou frescuras – como todo bom TVR, diga-se – aí vai a lista!
TVR Grantura
Eis o carro que começou tudo – quer dizer, quase isto. A TVR começou como uma pequena oficina que consertava e restaurava carros, picapes e caminhões em Blackpool. Seu fundador, Trevor Wilkinson, era um entusiasta dos automóveis que nasceu em 1923 largou os estudos aos 14 anos para aprender mecânica. Em 1946, abriu a Trevcar Motors, que no ano seguinte passou a se chamar TVR Engineering – e você não precisa ser nenhum gênio para sacar que a companhia foi batizada usando as letras do nome de seu fundador, não é?
O fato é que em 1949 Trevor e seu sócio Jack Pickard construíram um pequeno esportivo com chassi tubular, cockpit aberto e para-lamas destacados da carroceria, nos moldes do Lotus Seven, e o batizaram simplesmente como TVR One. Ao longo dos anos, seriam construídos o TVR Two e o TVR Three até que, em 1958, o primeiro carro “de verdade” da companhia foi apresentado: o Grantura.
O Grantura era um cupê com estrutura tubular do tipo “espinha dorsal” (como os Lotus), suspensão derivada do Fusca (sério!) e carroceria de fibra de vidro, estabelecendo o método de construção que seria empregado em virtualmente todos os TVR produzidos desde então. Seu motor, no início, era um Coventry Climax FWA de quatro cilindros e apenas 1.098 cm³ que, apesar do pequeno deslocamento, produzia respeitáveis 71 cv.
Cerca de 800 carros foram fabricados ao longo dos nove anos de vida do Grantura, que em sua terceira e final evolução tinha entre-eixos mais longo, uma entrada de ar maior na dianteira e um motor de 1,8 litro e 96 cv, sendo capaz de atingir os 179 km/h, o que definitivamente não era nada mau. Contudo, o carro que deu início à tradição de colocar motores grandes e potentes em carros leves e puristas foi outro.
TVR Griffith 400
Pequeno, leve, com dois lugares e um motor V8 debaixo do capô: não há melhor resumo para o Griffith do que este. Baseado no Grantura, porém mais encorpado, o Griffith 400 foi lançado em 1964 o primeiro TVR a empregar um motor V8 – nada menos que o small block Windsor de 289 pol³ (4,7 litros) do Ford Mustang.
A história por trás de seu surgimento é para lá de interessante. Jack Griffith era dono de uma rede de concessionárias nos EUA que vendia esportivos ingleses – em especial, o TVR Grantura e o AC Cobra. Como sabemos, o Cobra surgiu quando Carroll Shelby decidiu instalar o motor V8 Ford no roadster AC Ace. Você já deve ter sacado o que aconteceu depois, não é?
Não? OK, lá vai: diz a história que, durante um jantar com Carroll Shelby, Griffith disse que se colocasse o motor V8 do Cobra em um TVR Grantura, o carro ficaria melhor e rápido do que a criação de Shelby, pois era mais leve e usava um sistema de suspensão mais avançado (independente por braços triangulares sobrepostos nos quatro cantos).
Foto: jymp/Flickr
Griffith convenceu a TVR a ceder-lhe um Grantura sem motor e câmbio para que ele testasse sua ideia. Depois de adaptar o chassi a marteladas, Griffith conseguiu instalar o V8 289 no Grantura. O carro resultante era um verdadeiro foguete para a época, sendo capaz de chegar aos 100 km/h em 3,9 segundos com máxima de 240 km/h. Griffith batizou o carro resultante com seu sobrenome, e não demorou para que ele fosse começasse a ser produzido em série.
Apesar da fama de ser um carro arisco e difícil de controlar, o Griffith fez relativo sucesso, com cerca de 260 unidades produzidas até 1967. Seu sucesso só não foi maior porque a TVR passava por problemas financeiros e sua divisão americana, onde o Griffith era produzido, encerrou as atividades.
TVR V8S
Em 1981 a TVR foi comprada por um empresário chamado Peter Wheeler, ex-engenheiro químico que fez sua fortuna vendendo equipamentos para a indústria petroleira britânica. Depois de comprar um carro da TVR, ele decidiu comprar a companhia, e o primeiro grande ançamento da marca com o novo dono foi o S Series, de 1986. O carro foi anunciado no Salão do Automóvel de Birmingham em 1986 e começou a ser fabricado ainda naquele ano. As versões mais baratas usavam o motor V6 Cologne da Ford, de 2,8 litros e 160 cv ou 2,9 litros e 170 cv.
Contudo, a melhor versão era o V8S, que era movido por um V8 Rover de quatro litros com injeção eletrônica de combustível e 240 cv a 5.250 rpm e 37,3 mkgf de torque a 3.000 rpm– suficientes para chegar aos 100 km/h em 4,9 segundos. Para se ter uma ideia, isto tornava o V8S mais veloz que um dos supercarros mais importantes da época: a Ferrari Testarossa, que tinha um V12 de 4,9 litros e 395 cv e precisava de 5,3 segundos para chegar aos 100 km/h.
Dos pouco mais de 2.600 TVR S Series produzidos entre 1986 e 1994, 410 eram V8S. Além de ser a mais veloz, a versão também era a mais luxuosa, com couro e madeira no interior, além de vidros e retrovisores elétricos. Nada mau para um carro que tinha lanternas traseiras de Escort…
TVR 350i
Ao mesmo tempo em que o S Series se tornava um sucesso de vendas e melhorava consideravelmente a situação financeira da TVR, a fabricante apostava em um estilo totalmente diferente com o Tasmin, lançado em 1980. Inspirado pelos esportivos de motor central-traseiro, como o Lotus Esprit, o Tasmin tinha carroceria em formato de cunha, e deu origem a toda uma família de modelos que ficou conhecida como “Wedge Series”, sendo que wedge significa “cunha” em inglês.
O mais famoso deles foi o 350i lançado em 1983, já sob a supervisão de Peter Wheeler. Enquanto o Tasmin trazia diversos componentes de origem Ford (o motor era o V6 Cologne de 2,8 litros e 160 cv; a suspensão era do Ford Cortina; os freios, do Ford Granada e a transmissão, do Ford Sierra), o 350i adotou um V8 Rover de 3,5 litros e 190 cv, suficientes para chegar aos 100 km/h em 6,3 segundos com máxima de 209 km/h.
O 350i foi produzido até 1989, e uma versão atualizada de seu chassi “espinha dorsal” foi empregada no esportivo que inaugurou aquela que, para muita gente, foi a década de ouro da TVR: os anos 90.
TVR Griffith 500
Lançado em 1991, o Griffith era uma homenagem direta ao modelo de mesmo nome dos anos 60, mas sua filosofia era diferente. Se você tem boa memória, deve saber que o ano de 1989 marcou a chegada do Mazda MX-5 Miata, e o apelo purista do roadster leve e barato de tração traseira japonês contaminou os ingleses.
Contudo, o Griffith adicionava mais um elemento à equação: potência. Esta vinha de um V8 Rover com deslocamento ampliado para cinco litros e capacidade para entregar 345 cv, suficientes para levá-lo aos 100 km/h em apenas 4,1 segundos. A transmissão era manual de cinco marchas, sem exceções.
Foto: sinky911/Flickr
Seu estilo era extremamente elegante, com uma carroceria de fibra de vidro com linhas limpas, faróis cobertos por uma camada de acrílico, capô longo e traseira curta. A suspensão usava braços triangulares sobrepostos na dianteira e na traseira, com amortecedores pressurizados a gás e barras estabilizadoras.
Aliada à leveza e boa distribuição de massas, o resultado era um carro dinamicamente equilibrado e muito ágil, características que garantiram boas vendas e mais de 2.500 unidades produzidas até 2002.
TVR Chimaera
O Chimaera é o “irmão” do Griffith. Lançado em 1992, usava a mesma plataforma e o mesmo motor Rover, porém trazia um estilo mais clássico, inspirado nos roadsters dos anos 50, interior mais luxuoso e espaçoso e suspensão mais macia, mais apropriada à proposta de um grand tourer.
Que tal “um pouco” de magenta?
A lista de opcionais, bem grande para um TVR: direção assistida, ar-condicionado, alto-falantes traseiros, disqueteira para seis CDs, revestimento de couro, bancos aquecidos, volante de madeira, tapetes de lã e até emblemas dourados. No mais, o desempenho era praticamente o mesmo do Griffith.
TVR Cerbera
Apresentado em 1996, o Cerbera foi o terceiro modelo totalmente novo lançado na chamada “era Wheeler”, e o primeiro a ser um cupê, e não um roadster. Ele também foi o primeiro a não trazer um motor Rover debaixo do capô, e sim propulsores projetados pela própria TVR: o seis-em-linha Speed Six, de quatro litros, com comando duplo no cabeçote, 24 válvulas e 355 cv; e o V8 Speed Eight, que tinha um ângulo de 75° entre as bancadas de cilindros e, em sua versão mais potente, entregava 446 cv – suficientes para chegar aos 100 km/h em 3,9 segundos.
O Cerbera também foi o primeiro TVR da época a ter quatro lugares, na configuração 2+2. Seu interior era completamente diferente daquele encontrado nos outros dois carros e tinha como principal peculiaridade o volante de dois raios, desenhado assim porque havia instrumentos posicionados abaixo da coluna de direção.
Foi o Cerbera o carro que serviu de base para um dos TVR mais insanos já feitos, ainda que tenha sido apenas um protótipo.
TVR Speed 12
Em 1997, um ano depois do lançamento do Cerbera, a TVR decidiu usá-lo como base para um conceito de superesportivo que, por sua vez, seria o ponto de partida para um carro de competição para a categoria GT1 da FIA.
No início de seu desenvolvimento o carro chamava-se TVR Project 7/12, em referência ao deslocamento de 7,7 litros e aos 12 cilindros do motor. Este, em essência, era composto por dois seis-em-linha Speed Six unidos pelo virabrequim e, com cabeçotes retrabalhados, entregava “mais de 1.000 cv” – os números exatos de potência e torque jamais foram confirmados por testes oficiais – Peter Wheeler chegou a mencionar que um teste em dinamômetro registrou 1.000 cv, mas a máquina acabou quebrando.
A meta da TVR era superar o McLaren F1, e em diversas ocasiões a marca mencionou à imprensa que o objetivo era uma velocidade máxima de “mais de 386 km/h”. A versão de competição chegou a correr na categoria GT2 da FIA, porém a potência do motor foi limitada a 675 cv usando restritores de ar nos coletores de admissão.
O Speed 12 já tinha até preço – custaria £ 188 mil, o que faria dele o TVR mais caro da história – e a companhia havia recebido alguns depósitos adiantados, porém o projeto foi cancelado pelo próprio Peter Wheeler, que após testar um dos protótipos de pré-produção, declarou que o carro era potente demais e inutilizável em vias públicas (que o diga qualquer um que o tenha pilotado em Gran Turismo 2). Os depósitos foram devolvidos.
TVR Tuscan Speed Six
O Sagaris é um dos TVR mais estúpidos já feitos (já vamos chegar nele), mas e se você quiser um TVR que não vá tentar te matar tanto assim? Você procura um Tuscan. Ele foi o modelo mais duradouro da fase “moderna” da TVR, sendo vendido de 1999 a 2006 – o que também faz dele o único TVR projetado na “era Wheeler” que também foi vendido quando a companhia pertencia ao russo Nikolay Smolensky. Ah, e foi o Tuscan que serviu de base para o Sagaris.
O grande barato do Tuscan é que, por baixo da carroceria de visual elegante há um esportivo de desempenho quase idêntico ao do Sagaris, com o seis-em-linha de quatro litros sendo capaz de entregar 355 cv e, com eles, levar o carro até os 100 km/h em pouco mais de quatro segundos. A partir de 2003 a potência subiu para 400 cv, abaixando o 0-100 km/h para apenas 3,8 segundos.
TVR Sagaris
Eis o mais famoso dos TVR modernos: o Sagaris, conhecido como “o carro que quer te matar”. Como o Speed 12, ele foi produzido com as corridas de endurance em mente, porém não era extremo como ele – não da mesma forma. O motor era uma versão ainda mais apimentada do seis-em-linha Speed Six, deslocando quatro litros e entregando 385 cv, e o câmbio era manual, de cinco marchas.
Era potência o bastante para chegar aos 100 km/h em 3,7 segundos, com máxima de 289 km/h. Rápido, sem dúvida, mas não foi esta a única razão para a fama de assassino do Sagaris. Seu visual, com faróis que lembram olhos raivosos, entradas e saídas de ar por todos os lados e um excêntrico spoiler de acrílico transparente na traseira, também ajudou, mas havia outra coisa.
O Sagaris começou a ser desenvolvido em 2003 e a produção teve início em 2005. À época, a legislação europeia exigia que todos os carros tivessem freios ABS e airbags dianteiros, porém Peter Wheeler insistiu em não incorporá-los ao Sagaris. Segundo ele, tais dispositivos deixavam os motoristas confiantes demais e, portanto, mais propensos a pilotar de forma arriscada. O Sagaris também não oferecia qualquer tipo de assistência eletrônica, como controles eletrônicos de estabilidade e tração.
É perigoso? Pode até ser. Mas esperamos que os novos TVR continuem assim!