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Project Cars Project Cars #209

Putz! Hora de descer o carro da varanda do sétimo andar – a conclusão do Project Cars #209

Fala galera! Estou de volta para a 3º e última parte do PC #209, aquela do carro na varanda, ou simplesmente o do Putz! Pra quem não viu a segunda parte, volte para a casa 2 e quem ainda não viu nada, volte ao início e comece o jogo novamente. Resumindo, é a história de um carro no alto de um prédio!

2-Fiat Lingotto

Não! Não é isso!

Mesmo para quem está acompanhando o PC desde o início, ficou faltando um vídeo da época! Demorei a encontrar o vídeo e ainda tive que passar para o Youtube… Mas, voilá! Esta foi uma reportagem veiculada no MGTV na época. O carro ainda não estava pronto, mas a imprensa já estava sabendo e começou a dar cobertura. Foram diversas reportagens de diversos meios de comunicação da época.

Como foi descrito no último texto, o carro já estava pronto, mas ainda sim no sétimo andar do prédio (A repórter fala sexto andar, mas não considerou o andar térreo, o que completa 21 metros, ou o equivalente a sete andares). E voltamos à pergunta: como vai descer?

Bom, o segredo é que… ele nunca desceu! Meu pai deixou ele por lá e virou a atração do bairro. Andava pra frente e pra trás, e com um pouco mais de habilidade, você conseguia esterçar o volante e dar meia volta na área.

Nesse momento eu sei que você já rolou a página até o final pra conferir se estou falando a verdade!

Claro que é mentira! Então, se permanecer na varanda não era uma opção, meu pai teve que, finalmente, responder a tão repetida pergunta. Vamos por possibilidades:

Escadas: sem chances.

Elevador: foi cogitado, porém a carroceria deveria estar desmontada para que houvesse a possibilidade de descer e, depois seria montada lá embaixo. Mas a possibilidade foi descartada por diversos motivos (o carro era pequeno, mas nem tanto) e a carroceria foi unida, dando forma final ao carro ainda lá em cima.

Balão: sim, foi sugerido o uso de um balão (!!) para a retirada do carro! Mas foi logo descartado por motivos óbvios (eu acho).

Helicóptero: seria épico, mas os custos elevados e o alto grau de dificuldade tornaram a opção inviável.

Guindaste: possível, porém existiam vários empecilhos. Eram sete andares, que totalizavam uma altura de 21 metros, mais uma distância de cerca de cinco metros de obstáculos até a frente do prédio (havia uma bancada entre a área utilizada como fábrica e o parapeito frontal), além de um recuo do prédio em relação à rua.

No total seriam necessários 40 metros de lança para atender o objetivo. O que nos trazia para outro desafio: preço. Quanto custaria para alugar um guindaste com lança de 40 metros para retirar um carro de cima de um prédio residencial? Imaginem as janelas, a fachada e todos os procedimentos que deveriam ser tomados para não danificar o patrimônio dos vizinhos.

Apesar da dificuldade, esta parecia ser a solução mais viável (pra não dizer a única que restou). Sendo assim, meu pai procurou empresas que faziam este tipo de serviço para analisar os preços.  Logo de cara uma surpresa! Na primeira empresa visitada, chamada Líder, o dono, ao ser questionado sobre o preço, logo se prontificou a aceitar o desafio – challenge accepted! Ele topou utilizar o guindaste da empresa para o serviço, cobrando apenas o diesel do caminhão!

Notícia fantástica! Um dos maiores medos do meu pai já estava resolvido (pelo menos na teoria). Digo um dos maiores medos, não o último, afinal o carro ainda não havia andado na rua. Apesar de terem sidos realizados alguns testes com o carro andando dentro da varanda, aqueles poucos metros não eram o suficiente.

A tensão tinha data e hora marcada para terminar – ou para uma enorme frustração acontecer.  Dia 19/12/1991 (em plena quinta feira!) às 9 horas. A expectativa era tamanha que todos aguardavam o guindaste pela janela como crianças quando esperam os pais com um presente!

4-Guindaste chegando

Chegou!

Naquele momento já tinha toda a família, vizinhos, imprensa, pedreiros, porteiros, curiosos de todas as partes assistindo o gigante amarelo (coincidência?) manobrando na rua, e consequentemente fechando todo o transito da rua. Na ansiedade para realizar o sonho, meu pai se esqueceu de avisar ao departamento de transito que naquele momento ocorreria uma simples e corriqueira operação de retirada de um carro do alto de um prédio.

5-Guindaste manobrando

O gigante indo buscar o pequenino

Resultado? Nenhum carro passava. O ônibus do bairro passava pela minha rua. Passava. O caos estava instaurado. Apesar de ser uma rua de bairro, relativamente pouco movimentada, uma interdição causava um nó no trânsito e irritação dos motoristas.

“Sai da frente!”

“Passa por cima!”

“Olha pra cima! Tá passando!”

A irritação passava ao ficarem sabendo do que se tratava. Logo, os motoristas também paravam o carro para acompanhar a operação.

A subida da lança já foi regada a muita tensão. Alta tensão eu diria. Explico: na frente do prédio passavam vários cabos de alta tensão. Para driblá-los foi necessária muita habilidade por parte do operador do guindaste – mais uma vez, muito obrigado Líder! Ainda hoje eu não sei como eles conseguiram!

6-Guindaste subindo 7-Guindaste subindo 2

Momentos de alta tensão

Com a lança no lugar começou a operação para colocar o carro na “plataforma de içamento”. Apesar de leve, o carro precisou de ajuda de várias pessoas para ser colocado no lugar certo. Primos, amigos, cunhados, sobrinhos, filhos (ta bom… eu só olhei) colocaram o Putz! em alguns calços de madeira e o protegeram com panos e cobertores contra as cordas que o seguravam.

8-plataforma apartamento

Acertando os preparativos da descida

Chegou a hora. Os cabos começavam a subir com o carro, que a cada balanço aumentava o risco de queda e de infarto dos espectadores. O carro girou, balançou, quase virou. O nervosismo foi indescritível. Mas isso tudo o carro ainda estava a menos de um metro do chão do apartamento. Menos mal. Ali ainda dava para fazer acertos e estabilizar a descida.

9-Putz Vista e camera

Preparando para ganhar as ruas da cidade!

10-Leo e papai

Começando a descida com os cuidados do meu pai e do grande amigo Léo

11-Putz Vista e mãe

Bela foto do Putz! descendo, Belo Horizonte atrás e minha mãe tomando conta de tudo

12-Guindaste descendo

Lá vem ele!

Foram duas horas de “Putz! Putz… Putz grila!” Quando faltavam alguns metros a euforia já havia tomado conta! Todos comemoravam! Champanhe estourando em cima do herói (meu herói!). E eu pequenininho, sem entender direito porque todo mundo abraçava e parabenizava meu pai! Eu só estava achando legal ver o “meu carrinho de brincar” na rua agora!

13-Champanhe

O bom e velho banho de champanhe para os vencedores!

O sentimento de todos na rua era de euforia! Família, amigos, curiosos, conhecidos, imprensa, todos queriam ver, chegar perto, conhecer, tirar selfie. Não! Isso ainda não existia!

Mas o mais importante era o ver andando! Formou-se uma roda ao redor dele e era quase como se houvesse um coral de todos, mas em voz baixa: “Liga ele! Faz ele andar! Deixa eu dar uma volta!” As câmeras e repórteres estavam engatilhados para registrar o momento.

Imagino o que meu pai passou naquele momento. Um sonho de 20 anos atrás e mais 54 semanas de construção estava ali na rua. Pronto para rodar. Prestes a fazer história. Todo um trabalho, toda uma expectativa, toda aquela história dependia daquela girada de chave. Vai ligar? Vai andar?

Ligou. Andou. Com quatro lá dentro. Meu pai, minhas duas irmãs e eu! Subiu a ladeira da minha casa e logo voltou. Ele ainda não podia rodar livremente pelas ruas. Mas o importante foi que fez bonito para as câmeras e testemunhas oculares!

Como não podia ser diferente, foram veiculadas reportagens em diversos meios. Na TV, passou na Globo, Manchete e SBT. Jornais impressos também fizeram reportagens (Estado de Minas, Hoje em dia e O Globo)

14-Recorte jornal 1

15- Recortes de jornal 2

Recortes dos jornais da época

Para poder andar nas ruas da cidade, foi necessário tirar um certificado de veículo experimental. Como o carrinho tinha aparecido em várias reportagens, meu pai foi muito bem recebido no Detran-MG. Com o número de chassi da Vespa, o certificado foi facilmente emitido.

16-Putz na rua 1

Legenda: Dando uma das primeiras voltas pelas ruas!

18-Abastecendo

Ele não era muito de ir ao posto, mas quando ia, era sucesso!

19-Pit stop

Pit Stop! Ou melhor… Putz stop!

19b-Putz eu e Caio Pça Liberdade

Eu e meu grande amigo de infância, Caio

Após alguns pequenos ajustes para o carro rodar perfeitamente, meu pai o utilizou para tarefas do dia-a-dia, passeios, obrigações e só para dar umas voltas mesmo! O meu primeiro dia de aula, por exemplo, foi conduzido por ele! Um dia que toda criança teme, não gosta ou morre de medo, pra mim foi sensacional! Inesquecível! Como podia ser diferente?

20-Primeiro dia de aula

Meu primeiro dia de aula foi de Putz!

Segundo meu pai, o carro era confortável, prático e ótimo de dirigir! A média de consumo ficou em 20km/l dentro da cidade.

Eu gostei tanto do carro que meu pai resolveu fazer um pra mim! Uma miniatura. Mas uma miniatura que eu pudesse dirigir! Lembra daqueles carrinhos de pedal que existiam na época? Meu pai pegou a “mecânica” de um carrinho desses, criou chassi de metal e refez a carroceria com a fibra de vidro “excedente”! Era literalmente uma miniatura do Putz! que funcionava! O Putzinho! Como se não bastasse um carrinho para chamar atenção, agora tínhamos dois carrinhos! Ou melhor, um carrinho e um carrinhozinho! Meu pai costumava me levar à praça da liberdade, praça do Papa e outros pontos turísticos da cidade para “desfilarmos” os pequenos! Éramos a sensação!

Neste caso a “carroceria” e a mecânica ainda existem! Desmontados e em um estado não muito bom, mas esse eu não vou deixar morrer! Meu sobrinho, que acabou de nascer, vai brincar muito com ele! Disso eu vou cuidar!

Se fosse nos dias de hoje a tendência seria construir variações do modelo: Cross, Sport, Adventure, SUV compacto, quatro-portas… talvez seria bacana um modelo off-road, que seria o Putz Grila! Ou talvez um esportivo com um swap para um motor de R1, seria Putz!!! (com três ou mais exclamações). Mas da forma que ele foi fabricado era inviável a construção de mais modelos. O objetivo era andar com ele no dia-a-dia até quando fosse possível ou necessário uma intervenção mecânica maior.

Um dia essa necessidade chegou e meu pai acabou deixando ele estacionado na garagem de uma casa de campo da família, aguardando ter tempo para brincar com ele novamente. Mas os tempos já eram outros, e o tempo foi passando e passando. Até que um dia alguns vândalos (pra não dizer palavras indevidas) encontraram o carro debaixo da lona que o cobria e picharam, destruíram portas, janelas e outros componentes. Putz…

Era o início do fim. Meu pai acabou o desmontando novamente. Carroceria e chassi foram parar em lugares diferentes, e o tempo novamente passou, passou e não voltou mais. O carro nunca mais voltou a andar, nem a formar novamente aquela carroceria charmosa que desceu do sétimo andar. Os restos imortais (pelo menos nas nossas memórias) foram se deteriorando e hoje não existem mais.

Planos para ressuscitar o projeto não faltaram. Inclusive chegaram a existir esboços de um Putz 2000! Mas o projeto teria que ter algo inovador ou exclusivo para valer a pena desenvolvê-lo. A varanda já havia sido reformada e não era mais possível descer de lá (a não ser que o plano do helicóptero fosse realmente colocado em prática!).

Em 1998 foi lançada comercialmente a primeira geração do Smart, que viria a ter um relativo sucesso no Brasil somente na geração lançada em 2007. E ele tinha tudo que o meu pai sonhou em ter no Putz!: tamanho pequeno, simples, econômico, prático e bonito! Ou seja, mais uma vez, os sonhos do meu pai se tornaram realidade. Desta vez através das mãos de outra empresa, mas o carrinho estava lá!

25-Smart

Fala que não parece?

Segundo ele mesmo “o futuro dos carros pequenos ainda não chegou, acho um desperdício um carro de 1.200 kg andando 90% das vezes com uma pessoa só”. E eu compartilho com o pensamento dele. A necessidade da maioria das pessoas não passa de um carro para duas pessoas. Imagina a redução no consumo de combustível, redução do transito nas cidades, a redução da poluição e principalmente, imagina as cores das cidades com carros como ele na rua! Mas bem… rssa é outra história!

Cara, vocês imaginam o que é ser uma criança com o pai construindo um carro na varanda? As lembranças que tenho daquela época não são muitas, mas são fortes! Lembro do cheiro da fibra de vidro sendo preparada e do tanto que coçava quando eu encostava (mesmo meu pai falando mil vezes que não podia!). Lembro também do tanto que eu e meus amigos gostávamos quando meu pai nos “liberava para conhecer” o carro. Por “conhecer” subentende-se fuçar todos os cantos, fingir que dirigia, trocar de lugar, andar lá dentro e tudo mais que meu pai provavelmente não queria que fizéssemos!

O Putzinho me marcou muito também! Era muito bacana poder andar em uma miniatura do carro do pai, literalmente! Ele ainda foi repintado e utilizado por muito tempo depois! Já disse, esse tem um futuro: vai ser restaurado! E quem sabe não participa de um mini Project Cars!

Dava pra não ser engenheiro mecânico? Dava pra não gostar de carro? E contar essa história para todos os amigos e rir quando eles, incrédulos, ficavam imaginando se era realmente verdade? Pronto: agora contei a história, mostrei as fotos, e também vídeos! Era tudo verdade mesmo! E se você era um dos que duvidavam até agora… pode acreditar… eu tenho o pai mais foda do mundo!

Por Carlos Casadei, Project Cars #209

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Uma Mensagem do FlatOut!

Que história! Sim, apostamos que todos os leitores se colocaram no seu lugar e imaginaram como é ver um carro ser construído na varanda de casa pelo próprio pai, chegar na escola com esse carro e passear nos fins de semana com uma miniatura desse carro. Queremos também parabenizar seu pai Humberto pela inventividade e criatividade. Só alguém muito louco por carros e com muita vontade de construir seu próprio projeto poderia fazer isso na varanda do sétimo andar. Um gearhead de primeira! Parabéns!