Quão idiota é o MAO? Let me count the ways…
Em minha defesa ando cheio de coisas aleatórias para resolver e até domingo estava com um resfriado chato de resolver, daqueles compridos que só servem para acabar com o bom humor da gente. Tá, não justifica nada, mas achei que deveria dizer algo em minha defesa antes de continuar.
Olhei por cima onde era o evento da VW que deveria participar ontem, e vi que iniciaria em um Hotel na Barra Funda, em SP. Ok, acordo bem cedo para não pegar trânsito e boa. E esqueci do assunto. De madrugada do dia seguinte acordei, joguei a mochila no Virtus e piquei a mula para São Paulo. Estava tudo no material enviado, mas o fato é que o mané foi para São Paulo inadvertido que:
- O que começava lá em São Paulo era o translado,
- O evento era em Itu, coisa de 30 km de minha casa.
- Terça-feira é dia de rodízio do Virtus.
- Eu sou um idiota
Eu escapei do rodízio por estar escapando do trânsito: saí realmente cedo e cheguei no Hotel as 7h em ponto. Mas como das 7 às 10h não podia sair de novo sob pena de multa, tive que fazer o roteiro completo, pegando um carro da VW e indo a Itu, fazendo os test-drive e tudo mais, e voltando.
Eu podia ter saído de casa as 9:30h, e fazer um passeio tranquilo com o Chevette azul até o local do evento, um clube de Golfe, e estar de volta em casa em coisa de 2-3 horas, no total, translado incluso. Mas não, o mané tem que ir até SP e de volta não uma, mas DUAS vezes, e ainda por cima esperar hora de rodízio. No fim consegui acabar cedo as avaliações em Itu e chegar cedo de volta; saí de SP (pela segunda vez no mesmo dia) ainda antes de começar a parte da tarde do rodízio paulistano. Mas foi um dia, vamos dizer assim… interessante.
E no fim foi bom. Não para mim, claro; mas, espero, para vocês, queridos leitores, que teimam em escutar este idiota aqui. O meu humilde carro da família, um Virtus MSI 1.6 aspirado, manual e básico ano/modelo 2019 me proveu uma interessante e inesperada perspectiva na volta, depois de andar em alguns VW novinhos, ano/modelo 2024.
Quase uma epifania, na verdade. Explico no final, mas antes, tenho que cumprir com vocês a função que fui realizar nesta viagem maluca e destrambelhada: avaliar alguns VW ano/modelo 2024. O Taos que me levou e trouxe de SP, e os novos ID Buzz e Tiguan lançados no evento. É necessário como contexto para a tal epifania do mané em questão, mas pode ser tratado em duas partes: se você quiser pular a introdução e o final, estará informado sobre os carros e boa. Se é só o que procura aqui, suficiente.
Mas claro: se você chegou até aqui não pode pular a introdução: tarde demais. Bom, eu avisei que era um idiota; você continuou a ler sob sua conta e risco.
VW ID Buzz
Bom, vamos começar com o veículo mais diferente do dia, a “nova Kombi” 100% elétrica, o VW ID Buzz. Já havia sido anunciada a sua chegada, mas o dia de ontem foi a primeira vez que os jornalistas puderam ter contato e andar com ele aqui em terra brasilis. Andamos pouco: meia hora cada um, em trecho urbano na histórica cidade de Itu, onde tudo é famosamente grande. Apesar de ser pouco, é suficiente: não acredito que exista muito mais a se aprender dele além disso, e uma olhada com paciência no carro estático também disponível.
Falta só uso carregando gente e coisas, a praticidade no dia a dia, e comportamento em limite; e quem quer saber o comportamento no limite de onibusinho elétrico de luxo? Se você respondeu “eu!”, te conto mesmo sem ter experimentado eu mesmo, ou ouvido opiniões de outrem: limite alto dado pelo peso e pneus gigantes, subesterço seguro depois. Posso ser um idiota, mas já vivi muito tempo nessa indústria para saber exatamente o que fizeram ali nesse sentido.
Primeiro, vamos falar no elefante na sala: o preço. Você vai achar estranho, mas tenho que reportar: não há preço. O carro só poderá ser obtido para uso por meio de assinatura: o serviço VW Sign&Drive. É um aluguel: o carro permanece de outro, você usa como seu, no final do contrato ele é recolhido. Não, não tem opção de compra no final; dono de ID Buzz no Brasil só a VW. Ou quem trouxe de forma independente; já vieram algumas assim. Ouvi que esses pagaram de 699 a 800 mil reais pelo privilégio.
A assinatura também é caríssima: a mais barata, contrato de 48 meses e rodando no máximo 1500 km/mês, é de R$ 12.990 por mês. A mais cara, 24 meses e 3100 km de “franquia” por mês, pede para você pagar R$ 17.890 por mês. Eu disse que compraria 24 Kombis velhas pelo valor desse contrato, uma cada mês, mas estranhamente ninguém riu. A VW vai trazer somente 70 carros, inicialmente.
Então é assim: não dá para comparar com nada, não dá para encarar como um produto normal com competidores. Seu preço, o fato de que é só aluguel, e sua natureza, é, vamos dizer assim… diferente. Tudo isso impede que se possa fazer qualquer avaliação neste sentido. É um daqueles carros para quem pode ter tudo, em duplicata, e vai pegar isso também. Difícil de avaliar mercadologicamente.
Então falemos do carro. É uma van grande e espaçosa, para cinco passageiros. A cabine não é tão avançada como uma Kombi, claro; só o para-brisa é avançado, como é numa C4 Picasso, por exemplo. Eu tive uma C4 Picasso: do posto do motorista lembra muito, da posição de dirigir ao “câmbio” que parece alavanca de seta de pisca; da janelinha entre parabrisa e porta; até a falta de console central e os apoia-braços e saídas de ventilação nas colunas. O desenho do interior é diferente, e o carro é mais silencioso e um pouco mais potente, mas é bem parecido.
O que é estranho, por ser 100% elétrico, e de tração traseira! O carro é mais comprido que um C4 Picasso aos 4712 mm (o Citroën tinha 4470, ou 4590 na versão “Grand”) e tem grande entre-eixos aos quase 3 metros. Mas por dentro, apenas o porta-malas gigante parece realmente diferente. O carro além de enorme é elétrico: por isso, o peso de 2470 kg não espanta.
Mas se move muito bem pelo seu tamanho, claro: tem 31,6 mkgf desde zero rpm, e dá bem saudáveis 204 cv. Motor traseiro, tração traseira, e bateria em toda extensão do assoalho. O 0-100 km/h, segundo a VW, é de 10,2 segundos; parece mais vivo que outros VW como o Tiguan que andamos no mesmo dia, que faz a prova em 9 segundos cravados; efeito do torque desde zero rpm, claro. A velocidade máxima é limitada em 145 km/h, o que é totalmente compreensível: alta velocidade consome bateria; carro enorme, pesado, e muito isolado do exterior é acidente esperando acontecer por falta de percepção de velocidade. Mas para mim, seria um deal-breaker.
O carro parece ótimo como toda van: duas portas elétricas de correr na lateral, lugar com folga para 5 pessoas e muita carga (o porta-malas é enorme), tomadas usb e lugar para celular em toda porta. O acabamento é obviamente VW, que não é ruim num Polo, mas levanta sobrancelha em um que custaria oito polos se fosse vendido. Não há, por exemplo, teto solar de vidro nos carros “brasileiros”, algo onipresente em carro de luxo hoje. As cores alegres e claras do interior, porém, e uma faixa de legítima imitação de madeira clara no painel, alegram o ambiente um pouco, e escondem essas origens um cadiquinho. É agradável.
Também isolado totalmente do exterior como uma câmera de privação sensorial. O motor não faz barulho, e o exterior fica lá do lado de fora mesmo. Nem em Rolls-Royce vi tanto isolamento do exterior e controle que parece remoto, como se de repente estivesse num jogo virtual, mas com força G. Um carro de luxo, mesmo que a suspensão seja mais para o lado firme.
No painel aparecia o range, autonomia: 395 km. Mais do que suficiente; se você tem lugar para recarregar em casa, dá para usar bem. Não tão despreocupadamente como um a gasolina, mas sabemos que os elétricos vem com este fardo; não vale a pena discutir. Freios regenerativos ajudam a recarregar, mas são estranhos; parece freio quando tira o pé. Talvez dê para se acostumar, mas sei não. Melhor deixar desligado; sem ele anda como um carro automático normal, apenas extra-silencioso.
É uma agradável van full-size, e não existem mais elas no mercado, até a volta da Kia Carnival, pelo menos. Vale a pena pelo preço? A gente combinou que não ia falar disso né? A resposta parece óbvia; mas não importa. O carro está aqui para iniciar a VW nos elétricos: é mais um símbolo que um produto. Agora que é estranho não poder ser comprado de forma alguma, é.
Taos e Tiguan
Como hoje estamos sendo totalmente honestos uns com os outros, vou confessar algo que deveria ser inconfessável: achei o Taos e o Tiguan absolutamente iguais. Sim, há mais espaço interno no Tiguan. Mas pouco. De resto, iguais. Mesmo painel, console, volante, infotanment, teto solar câmbio, comportamento do motor, desempenho. Sinceramente, não entendi.
Sim, eu sei que são carros diferentes, com motores diferentes e câmbios diferentes e suspensões diferentes e plataformas diferentes, o Tiguan sendo o maior e mais caro deles. Mas de verdade? Mesma coisa.
O Taos tem um motor 1,4 litros turbo acoplado à um câmbio automático de seis velocidades, o 250 TSI com 150 cv. O carro pesa 1420 kg e faz 0-100 km/h em 9,4 segundos, a caminho de uma máxima de 194 km/h.
O Novo Tiguan R-line 300 TSI vem agora com um quatro em linha turbo de dois litros e 186 cv entre 4500 e 5000 rpm; o torque é de exatos 300 Nm como diz o nome, 30,6 mkgf, disponível de 1550 a 4000 rpm. O câmbio agora é automático de oito marchas, não mais DCT. A VW diz que as mudanças deixaram o carro bem mais econômico em combustível; este é o motivo delas, segundo a empresa.
Mas, como o carro pesa 1794 kg, fizeram também o desempenho próximo do Taos: 0-100 km/h em 9 segundos cravados, e 215 km/h. Não consigo nem começar a tentar fazer vocês entenderem como esses dois carros são parecidos andando.
Os bancos do Tiguan são obviamente mais complexos, pesados e caros, mas não fazem muita diferença ao dirigir: ambos são confortáveis e com bom suporte lateral. A suspensão traseira do Tiguan é muito mais sofisticada tecnicamente, multilink, mas estaria mentindo se dissesse que percebi diferença. De resto, com porte igual, painel igual, e desempenho igual subjetivamente, com motores quatro em linha turbo e câmbios automáticos que se comportam de forma muito parecida, são um enigma para mim. Para que dois deles? Dá para perceber que o Taos é o mais barato em detalhes apenas; funcionalmente são iguais.
E como são dirigindo? Iguais também. Como o ID Buzz, completamente isolados, grandes demais para seu exterior, confortáveis e tranquilos, com boa potência e suspensão segura, se pouco comunicativa. Como também são a maioria dos SUVs de porte semelhante do mercado. Um mercado onde no frigir dos ovos, estão ficando todos cada vez mais semelhantes. Apenas detalhes separam um carro do outro. A não ser entre VW; entre eles parece haver zero diferença.
A volta
Pois bem, deixei o Taos que usei de transporte durante o dia com a eficiente, simpática e profissional equipe da VW no hotel em São Paulo com 45 min para o início do horário do rodízio; entrei no meu Virtus e fui embora o mais rápido que pude. Quando entrei na estrada, diminuí o ritmo, e me acalmei; tudo deu certo.
Não me entenda mal a respeito do que falarei em seguida. Eu gosto muito do meu Virtus, mas como um meio de transporte familiar confiável. Comprei ele zero km em 2019 por ser o único na faixa de preço que podia pagar com espaço para dois adolescentes de mais de 1,8 m de altura atrás. Por sinal, paguei 62 mil reais nele, metade em 24 vezes sem juros, já que estamos sendo honestos.
Sim, tem um motor e câmbio bem legais, e peso baixo pelo seu tamanho, mas não muito mais que isso. Comparado com minha ferramenta de prazer ao volante preferida, é um sedãzão rápido e manual, mas isolado, tranquilo, e com a direção morta demais.
Mas aí é que está. Depois deste dia com os novos VW, este, um carro com apenas 4 anos de idade poderia muito bem ser de 20 anos atrás. E não digo só a parte óbvia, a do motor aspirado e o câmbio manual. Não mesmo.
Primeiro o que nem em sonho imaginaria ser possível piorar: a tela de infotainment e o painel digital dos novos, comparados aos do meu carro. Pois é: a tela central é maior e de maior resolução. Mas é muito pior de operar: até o volume requer tocar um botão e arrastar uma barra na tela sensível ao toque; no meu é um botão rotativo, que ainda tem função óbvia e intuitiva de liga-desliga. Nada é intuitivo no novo, e não tem lá mais funções que o meu sistema “velho”, fora espelhamento sem fio. Caras, eu ando com um VW a 4 anos; se comprasse um novo com essa tela esperando apenas mais do que já tinha, e recebesse aquilo… O painel digital, e os controles de ar-condicionado, também são contra-intuitivos e mais difíceis de ler e usar. Incrível. Como pode?
Mas isso é uma bobagem, um detalhe, perto do mais incrível. Os três carros novos que andei ontem são extremamente parecidos em uma coisa: na forma como a direção, e toda a experiência de condução, é remota. Remota. Esta é a palavra.
Ao entrar no meu carro e andar, imediatamente a direção parecia mais fina e leve, e de resposta muito melhor e vibrações e feedback diversos, ausentes dos carros novos. Leve! Se não é comunicativa, que seja leve né? A dos modernos me lembrou o Virtus GTS, que odiei: pesada à toa.
O banco é tão confortável quanto os dos novos, mas você sente o que o carro faz por eles; há um pouco de ruído e vibração; os pedais têm resposta e feedback, bem menos remotos; o exterior de repente manda mensagens do que acontece lá fora. O tempo todo coisas te dizem que você está dirigindo, que tem que prestar atenção, e agir de acordo.
O motor parece algo vivo, que responde ao meu humor; grita quando quero andar, calminho quando quero paz; o comando do câmbio e embreagem positivos como só essas coisas podem ser. E ainda no ar-condicionado, tranquilo e ouvindo minhas músicas na tela espelhada do celular.
O desempenho, incrível, também parece o mesmo do posto do motorista, embora conseguido de forma muito mais positiva, controlada, linear, e gostosa. Objetivamente, meu carro tem espaço interno muito parecido com o Taos e o Tiguan, mas pesa só 1134 kg. Por isso, com apenas 117 cv, faz o 0-100 km/h em 9,8 segundos. E regularmente retorna 16 km/l na estrada, andando tranquilo. Simplicidade ainda dá resultado; ainda mais em mecânica moderna.
Mas o importante aqui é que nele estou dirigindo né gente? Nos outros não sei o que fiz; mostrei aonde queria ir? O incrível aqui é que o Virtus, no frigir dos ovos só um automóvel normal, comparado aos outros irmãos 2024, parece um festival de sensações e informações ao motorista. Cadê aquele emoji de cabeça explodindo? Por essa, não esperava.
Tinha que ter outro nome essas câmeras de privação sensorial móveis que estão vendendo para gente a preços altíssimos (o Taos é ao redor dos R$ 200k; o Tiguan, R$300 mil). Nem parecem mais carros por detrás dos volantes. É um fenômeno não só da VW, mas generalizado,; silencio e comandos remotos indiretos que podiam estar em teclados de computador; fariam nenhuma diferença. E um milhão de driver aids eletrônicos tentando impedir que a pessoa não enfie ele numa vala ou coisa pior. Carros para quem não sabe dirigir, e não quer ser importunado com isso.
O automóvel moderno está virando uma sala de espera para trânsito. A indústria está ativamente tentando vender carros para gente que não gosta de carro, não sabe dirigir, e tem raiva de quem sabe. Não é à toa que acidentes só aumentam: essa remoção dos motoristas do ato de dirigir não pode dar certo, gente. A gente tem que se engajar com ele. Prestar atenção. Ou andar de Uber!
O elétrico nem parece ser um problema olhando assim. E na verdade, os carros a gasolina estão ficando tão chatos quanto os elétricos, o que, claro, abre o espaço para eles ainda mais. Me parece, sinceramente, que a indústria cava sua própria cova. Sem diferenciação, e fazendo tudo remoto e isolado, está ficando cada vez mais uma questão de preço somente. O que é realmente triste.
Mas melhor não ouvirem o que disse aqui. Como eu mesmo fiz questão de dizer, sou apenas um mané que nem se ligou que podia ter economizado 5 horas de trabalho em um dia só. Mas mais idiota ainda eu sou, mesmo, por ter escrito tudo isso aqui. Quem quer ouvir esse tipo de verdade? Devia ficar quieto e só falar platitudes detalhadas sobre os carros. Mas como um bom idiota, não consigo.
Quão idiota é o MAO? Let me count the ways…
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