Ken Block é conhecido por ser um cara de 50 anos que ainda usa boné de aba reta mas, em compensação, é um dos pilotos mais famosos do planeta – nem tanto por vencer corridas, e mais por seus vídeos da série Gymkhana, que desde 2007 nos deixam embasbacados com manobras cada vez mais difíceis em carros cada vez mais potentes (no último deles, Climbkhana, Block subiu Pikes Peak ao volante de seu Mustang biturbo de 1.420 cv, caramba!). Ele também é um dos fundadores da DC Shoes, uma das mais bem sucedidas grifes de lifestyle da atualidade. Ou seja: o cara tem bala na agulha para bancar alguns brinquedos bem legais. E, por “brinquedos”, queremos dizer “carros”. Mas você provavelmente já tinha sacado isto…
Block competiu profissionalmente no WRC em 2007 e 2008, e depois novamente entre 2010 e 2015; e também participou do campeonato de Global RallyCross da Red Bull entre 2011 e 2015 – o que tem tudo a ver não apenas com o modo como ele pilota em seus vídeos, mas também o influenciou na hora de escolher o carro dos seus sonhos. Afinal, qual é o carro dos sonhos de Ken Block?
Não nos espantaremos se o fato de Block ser patrocinado pela Ford Performance tiver lhe ajudado a colocar as mãos em um RS200, mas a escolha faz todo o sentido. Desenvolvido especialmente para o Grupo B de rali, a categoria mais insana do automobilismo, o Ford RS200 jamais chegou a vencer um título, mas acabou se tornando uma lenda por tudo o que poderia ter sido. E também porque tinha um visual completamente diferente de qualquer outro carro da Ford que rodasse nas ruas, pistas ou estágios de rali. E também porque tinha carroceria de fibra de carbono e Kevlar, motor central-traseiro e quase 800 cv quando calibrado para treinos de classificação. Ele nunca venceu um título, pois só competiu em 1986 e em apenas quatro provas – em uma temporada cheia de tragédias, a Ford achou melhor tirar seu time de campo. Parte do culto ao RS200 vem justamente de imaginar o que ele poderia ter conseguido caso o Grupo B jamais tivesse sido cancelado.
O caso é que a Ford precisou fabricar 200 exemplares para homologação, e alguns deles acabaram se tornando carros de corrida e competindo em provas de rallycross na Europa até 1992. O carro de Ken Block é o nº 34 destes 200. Foi todo pintado de preto, recebeu rodas Fifteen52 Turbofan (que imitam o visual dos carros de rali da época) e teve o interior todo revestido em Alcantara. Parte da carroceria foi envelopada em preto fosco, como uma homenagem à pintura usada originalmente pelo RS200 no WRC em 1986.
Ele decidiu mostrar a todos seu “daily driver” em um dos vídeos mais recentes do canal Hoonigans, que sempre mostra o cotidiano na oficina de sua equipe de corrida. Aproveitou, também, para mostrar algumas particularidades do carro:
De acordo com Block, seu carro tem um motor de 2,4 litros e cerca de 700 cv. Isto soou um pouco estranho, visto que o RS200 só teve motores de 1,8 litro e 2,1 litros ao longo de sua curta existência (embora fosse plenamente capaz de chegar aos 700 cv e ir além). Então, decidi investigar.
Pesquisando um pouco, descobri alguns tópicos do fórum britânico Passion Ford – que, como o nome diz, é cheio de caras apaixonados pela Ford e que acompanham cada novidade –discutindo fervorosamente o assunto. O pessoal de lá diz que este RS200 foi comprado por Block recentemente, e que se trata do Ford RS200 #80, que até 2015 residiu na Noruega e era branco quando novo, mas a certa altura de sua vida recebeu uma pintura azul brilhante. As especificações batem: o carro recebeu um motor Cosworth BDT de 2,4 litros que, com a pressão máxima no turbo, entrega nada menos que 820 cv – Block pode ter recalibrado o motor para entregar um pouco menos de potência. Eis uma foto do carro pouco antes de ser vendido ao piloto:
As entradas de ar no teto são características do RS200 Evo, versão que a Ford planejava para 1987. Sob a entrada maior há um intercooler, que foi necessário para ajudar a resfriar o motor e não existia na versão “não-Evo”
Block diz que o RS200 é seu carro favorito, por mais que o mesmo seja extremamente apertado e difícil de dirigir. E deve ser verdade, porque Block já teve um RS200 antes – um carro relativamente famoso na comunidade entusiasta de Ford do Reino Unido, que competia em provas de rallycross com o britânico Trevor Hopkins ao volante. Block teria comprado o carro em 2013 e ficado dois anos com ele parado, pois não encontrou ninguém nos EUA para preparar o RS200.
Eventualmente, Block vendeu o RS200 que foi de Trevor Hopkins de volta para o Reino Unido. Quem comprou o carro foi Terry Maynard, conhecido piloto de ralis históricos que atualmente está restaurando o carro. Eis aqui algumas fotos, extraídas de um grupo no Facebook criado para mostrar o andamento do trabalho, que de acordo com o pessoal do Passion Ford já está bem encaminhado.
Agora há algumas razões para duvidarmos que o RS200 seja, de fato, o daily driver de Ken Block. Primeiro: de acordo com a Hoonigan, a primeira vez de Block ao volante de um RS200 de rali aconteceu no ano passado, na chuva, e o piloto ficou realmente assustado com a selvageria do carro.
Há um bom motivo para isto: além da ergonomia não muito boa (é um carro compacto, apertado e com pedais desalinhados com o volante) e da chuva, o RS200 tinha entre-eixos curto (2.53 m), pesava 1.180 kg e tinha um turbo lag monstruoso – o rendimento em baixo regime não era dos melhores, mas em altas rotações a força vinha toda de uma vez com um soco na nuca. Só para lembrar: na versão de rali, que tinha especificações parecidas com as do carro de Block, o RS200 não precisava de muito mais que 2,5 segundos para ir de zero 100 km/h.
É mais fácil acreditar que Block dirige outro Ford RS com motor quatro-cilindros turbo e tração integral: um Focus RS, que neste vídeo da Ford Performance é apresentado como a versão moderna, confiável e com garantia do RS 200, embora seu motor fique na dianteira.
A impressão que fica é que o esquema de pintura preto fosco com rodas brancas cai bem a qualquer carro… Além disso, é uma boa chance de ver Block em ação com seu RS200. Mesmo que seja em uma ação de marketing.